Sua “mirada” e um dos rostos mais expressivos e reconhecidos do país fazem do ator, diretor e roteirista Ricardo Darín um mito da dramaturgia argentina, o queridinho de uma nação. Para fazer uma analogia (e apenas para efeito de comparação quanto à seriedade e popularidade), Ricardo Darín seria como uma Fernanda Montenegro no Brasil.
Discreto, sério e dono de inabalável credibilidade, Darín viveu por muito tempo à margem de polêmicas. Com uma filmografia impressionante, força nas bilheterias e grande poder de convicção, o ator é uma das grandes engrenagens do cinema argentino. É Darín o protagonista do filme que rendeu à Argentina seu segundo Oscar (“El segredo de tus ojos”).
Mas, essa semana, o discreto Darín comprou uma briga histórica com nada menos do que a Presidenta Cristina Kirchner. Durante uma entrevista à revista Brando (do grupo Clarín), Darín recriminou o “fanatismo” político, a falta de tolerância do Governo e aproveitou para questionar a ascensão patrimonial do casal.
As palavras de Darín causaram reboliço na mídia e a reação imediata da Presidenta que respondeu por intermédio do facebook, com uma carta cheia de ironia e fel. Com quase 2 mil palavras (20 parágrafos!!!), a Presidenta refutou as acusações do ator afirmando que “nenhum outro funcionário público” foi tão investigado em matéria de enriquecimento quanto ela.
Vale lembrar que, em 2003, o falecido marido da Presidenta estimou a fortuna do casal em pouco mais do que 2 milhões de pesos. Oito anos depois (coincidentes com os mandatos), a fortuna estaria avaliada em pouco menos de 80 milhões de pesos.
Na carta endereçada a Darín, Kirchner teve a “delicadeza” ainda de “relembrar” o ator do incidente que teve com a justiça em 1991, depois de adquirir uma caminhonete importada, que ingressou no país subvencionada por uma franquia especial para deficientes.
"Menos mal que não estávamos nós os Kirchner no Governo, ou seria considerada uma perseguição política”, escreveu Cristina. Ressalte-se que Darín foi absolvido das acusações posteriormente.
Mas, com a briga pública dos dois, armou-se o circo. Na televisão, canais governistas e de oposição se revezaram em dar sua visão da desavença. A TV pública convocou filósofos, antropólogos e cientistas políticos para declarar a insanidade mental do ator ou para afirmar que o grupo Clarín o havia comprado, com diversas teorias de conspiração.
Mais uma vez, argentinos participam da lavação de roupa em praça pública. Chega a ser divertido. Como disse a intelectual argentina Beatriz Sarlo “esta briga já se transformou em uma briga de comadres de bairro”.
Gabriela G. Antunes é jornalista e nômade. Cresceu no Brasil, mas morou nos Estados Unidos e Espanha, antes de se apaixonar por Buenos Aires. Na cidade, trabalhou no jornal Buenos Aires Herald, mantém o blog Conexão Buenos Aires e não consegue imaginar seu ultimo dia na capital argentina. Estará aqui todos os sábados.
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