Pensei ter ouvido o som da campainha. Ou foi uma batidinha de leve na porta?
- Quem é?
No lugar da resposta, veio de lá um som de alfaia*. Tímido ainda.
Girei a chave, lentamente, para encontrar, ali de pé, o Carnaval.
Esse ano ele chegou cedo. Bateu na porta, sem cerimônia, assim como quem já é de casa, e foi entrando vida adentro. Eu recebi o visitante como convidado de honra; peguei cadeira, servi suco de cajá e puxei conversa. No que descobri, para abalo moral do meu ego carnavalesco, que não sou a única amante, pelo menos não a maior, da folia de momo.
O Carnaval, um cronista nato, desenrolou ali, bem na minha frente, o fio das histórias e amores da folia. Começou por Fabiano e Adriana que, não se contentando em começar o namoro num dia de Carnaval, decidiram casar, com padre, madrinhas, padrinhos e pajem, num sábado de Zé Pereira, bem na concentração do bloco Eu Acho É Pouco.
Teve marcha nupcial tocada ao som dos clarins da orquestra de frevo, enquanto a noiva subia triunfante com seu vestido vermelho e amarelo (as cores do bloco), a ladeira do Mosteiro de São Bento.
Já Lígia e Walmir quase se separaram durante a folia. E a culpa, avisou o Carnaval, foi do jornal.
Não é que Lígia tinha feito uma promessa de não brincar o Carnaval? Walmir, seu namorado na época, fingiu ser solidário e avisou que iria para a casa dos pais, na praia, descansar. Final feliz, não fosse a foto de Walmir, no dia seguinte, na primeira página do jornal, estampando a matéria do Galo da Madrugada!
Lá estava ele, fantasiado e sorridente, bem na manchete principal. Lígia é que não ficou tão feliz, mas quem manda fazer promessa logo nos dias de momo? Hoje, 20 anos e três filhos depois, eles só brincam juntos!
E juntos também, brincaram Déo e Bete, durante 40 anos de casados. E brincaram tanto que a festa das Bodas de Esmeralda foi no domingo de folia, como manda a tradição do casal folião, em plena Rua do Bom Jesus, entre blocos líricos e frevo canção. E, para oficializar a festa, o estandarte com os dizeres: eu topava mais quarenta.
O Carnaval, assim como sentou, levantou. Sacudiu a poeira da saudade e saiu, levando consigo suas histórias e amores.
E você, o que ainda está fazendo na frente desse computador? Vai atender a campainha, meu senhor, que o Carnaval já está batendo na porta.
*Alfaia – Instrumento musical de percussão usado no Maracatu pernambucano.
Téta Barbosa é jornalista, publicitária, mora no Recife e vive antenada com tudo o que se passa ali e fora dali. Escreve aqui sempre às segundas-feiras sobre modismos, modernidades e curiosidades. Ela também tem um blog - Batida Salve Todos
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