CARLOS VIEIRA
O mundo é feito de pessoas normais e pessoas que têm uma sensibilidade, uma natureza incomum. Natureza essa que pode ser definida como uma capacidade interna e psíquica de apreender além do sensível-sensório. Apreender o que se esconde por detrás das palavras, o não dito, a apreensão da experiência humana sob uma forma metafórica, abstrata e intuitiva. Estou me referindo à sensibilidade estética artística do compositor, do pintor, do músico, do ator, do diretor de cinema, do escritor e principalmente dos poetas.
Carlos Drummond de Andrade, um dos maiores poetas brasileiro e quiçá do cânone da Literatura Universal, em seu poema – “Procura da Poesia” no livro A Rosa do Povo, escreve: “Penetra surdamente no reino das palavras./ Lá estão os poemas que esperam ser escritos,/ Estão paralisados,/mas não há desespero,/ há calma e frescura na superfície inata./ Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário,/ Convive com teus poemas, antes de escrevê-los,/ Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam./ Espera que cada um se realize e consume/ com seu poder de palavra/ e seu poder de silêncio./ Não forces o poema a desprender-se do limbo,/ Não colhas no chão o poema que se perdeu./ Não adules o poema. Aceita-o./ como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada no espaço./ Chega mais perto e contempla as palavras./ Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra/ e te pergunta, sem interesse pela resposta,/ pobre ou terrível, que lhe deres:/ Trouxestes a chave?...
Então, caro leitor, essa é uma declaração da atitude de um artista antes de compor sua arte, na busca do indizível e da capacidade de apreender a natureza e a natureza humana.
Penso que o Poeta assim como todos os artistas, os cientistas e os místicos têm essa capacidade de intuir fatos que se encontram no mundo, nunca pensados pelas pessoas comuns. A diferença é que eles são capazes de sofrer angústias primitivas que ainda não podem ser nomeadas. Isso faz das suas vidas, vidas turbulentas, vidas que estão além da nossa comum, e que os coloca em experiências de muita dor psíquica, muita variação de humor e profundos estados de tristeza e alegria. São pessoas aquém e além do tempo em que vivem; são mentes que mergulham em “estados de loucura sana” e afloram com a percepção de experiências psíquicas nunca pensadas. Lembro de Platão quando se refere a essa capacidade de alguns homens apreenderem na natureza fatos não percebidos nem sentidos pelo homem comum. Esses homens são os gênios e os loucos, só que uma loucura de um louco “internado num manicômio sem manicômio”, como escreveu Fernando Pessoa em seu poema – Esta velha angústia -.
Na experiência psicanalítica hodierna fala-se em “aspectos neuróticos” e “aspectos psicóticos” das pessoas ditas normais. Isso equivale a dizer que somos normais e loucos em alguns momentos da vida. O que faz bela a experiência analítica é que ela oferece subsídios para que nós possamos tirar proveito das nossas “loucuras sanas” e, desse modo, aprendermos e nos identificarmos com o que os poetas escreveram. Um poema só alcança seu objetivo (se é que tem objetivo) quando o leitor sente que o escritor está tocando em experiências profundas que ele viveu e não sabia nomeá-las.
O autor do livro que deu nome ao atual filme – Na Estrada – Jack Kerouac escreve: “Aqui estão os loucos. Os desajustados. Os rebeldes. Os encrenqueiros. Os que fogem ao padrão. Aqueles que não se adaptam às regras, nem respeitam o status quo. Você pode citá-los ou achá-los desagradáveis, glorificá-los ou desprezá-los. Mas a única coisa que você não pode é ignorá-los. Porque eles mudam as coisas, eles empurram adiante a raça humana. E enquanto alguns os veem como loucos, nós os vemos como gênios. Porque as pessoas que são loucas o bastante para pensarem que podem mudar o mundo são as únicas que realmente podem fazê-lo.”
Hoje eu quero homenagear essas pessoas, e principalmente os poetas, na letra de Fernando Pessoa, em seu poema “Esta velha angústia”:
Carlos Drummond de Andrade, um dos maiores poetas brasileiro e quiçá do cânone da Literatura Universal, em seu poema – “Procura da Poesia” no livro A Rosa do Povo, escreve: “Penetra surdamente no reino das palavras./ Lá estão os poemas que esperam ser escritos,/ Estão paralisados,/mas não há desespero,/ há calma e frescura na superfície inata./ Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário,/ Convive com teus poemas, antes de escrevê-los,/ Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam./ Espera que cada um se realize e consume/ com seu poder de palavra/ e seu poder de silêncio./ Não forces o poema a desprender-se do limbo,/ Não colhas no chão o poema que se perdeu./ Não adules o poema. Aceita-o./ como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada no espaço./ Chega mais perto e contempla as palavras./ Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra/ e te pergunta, sem interesse pela resposta,/ pobre ou terrível, que lhe deres:/ Trouxestes a chave?...
Então, caro leitor, essa é uma declaração da atitude de um artista antes de compor sua arte, na busca do indizível e da capacidade de apreender a natureza e a natureza humana.
Penso que o Poeta assim como todos os artistas, os cientistas e os místicos têm essa capacidade de intuir fatos que se encontram no mundo, nunca pensados pelas pessoas comuns. A diferença é que eles são capazes de sofrer angústias primitivas que ainda não podem ser nomeadas. Isso faz das suas vidas, vidas turbulentas, vidas que estão além da nossa comum, e que os coloca em experiências de muita dor psíquica, muita variação de humor e profundos estados de tristeza e alegria. São pessoas aquém e além do tempo em que vivem; são mentes que mergulham em “estados de loucura sana” e afloram com a percepção de experiências psíquicas nunca pensadas. Lembro de Platão quando se refere a essa capacidade de alguns homens apreenderem na natureza fatos não percebidos nem sentidos pelo homem comum. Esses homens são os gênios e os loucos, só que uma loucura de um louco “internado num manicômio sem manicômio”, como escreveu Fernando Pessoa em seu poema – Esta velha angústia -.
Na experiência psicanalítica hodierna fala-se em “aspectos neuróticos” e “aspectos psicóticos” das pessoas ditas normais. Isso equivale a dizer que somos normais e loucos em alguns momentos da vida. O que faz bela a experiência analítica é que ela oferece subsídios para que nós possamos tirar proveito das nossas “loucuras sanas” e, desse modo, aprendermos e nos identificarmos com o que os poetas escreveram. Um poema só alcança seu objetivo (se é que tem objetivo) quando o leitor sente que o escritor está tocando em experiências profundas que ele viveu e não sabia nomeá-las.
O autor do livro que deu nome ao atual filme – Na Estrada – Jack Kerouac escreve: “Aqui estão os loucos. Os desajustados. Os rebeldes. Os encrenqueiros. Os que fogem ao padrão. Aqueles que não se adaptam às regras, nem respeitam o status quo. Você pode citá-los ou achá-los desagradáveis, glorificá-los ou desprezá-los. Mas a única coisa que você não pode é ignorá-los. Porque eles mudam as coisas, eles empurram adiante a raça humana. E enquanto alguns os veem como loucos, nós os vemos como gênios. Porque as pessoas que são loucas o bastante para pensarem que podem mudar o mundo são as únicas que realmente podem fazê-lo.”
Hoje eu quero homenagear essas pessoas, e principalmente os poetas, na letra de Fernando Pessoa, em seu poema “Esta velha angústia”:
“Esta velha angústia
Esta angústia que trago há séculos em mim,
Transbordou da vasilha,
Em lágrimas, em grandes imaginações,
Em sonhos em estilo de pesadelo sem terror,
Em grandes emoções súbitas sem sentido algum.
Esta angústia que trago há séculos em mim,
Transbordou da vasilha,
Em lágrimas, em grandes imaginações,
Em sonhos em estilo de pesadelo sem terror,
Em grandes emoções súbitas sem sentido algum.
Transbordou
Mal sei como conduzir-me na vida
Com este mal-estar a fazer-me pregas na alma!
Se ao menos endoidecesse deveras!
Mas não: é este estar entre,
Este poder ser que...
Isto.
Mal sei como conduzir-me na vida
Com este mal-estar a fazer-me pregas na alma!
Se ao menos endoidecesse deveras!
Mas não: é este estar entre,
Este poder ser que...
Isto.
Um internado num manicômio é, ao menos, alguém,
Eu sou um internado num manicômio sem manicômio.
Estou doido a frio,
Estou lúcido e louco,
Estou alheio a tudo e igual a todos:
Estou dormindo desperto com sonhos que são loucura
Porque não são sonhos,
Estou assim...
Eu sou um internado num manicômio sem manicômio.
Estou doido a frio,
Estou lúcido e louco,
Estou alheio a tudo e igual a todos:
Estou dormindo desperto com sonhos que são loucura
Porque não são sonhos,
Estou assim...
Pobre velha casa da minha infância perdida!
Quem te diria que eu me desacolhesse tanto!
Que é do teu menino? Está maluco.
Que é de quem dormia sossegado sob o teu teto provinciano?
Está maluco.
Quem de que fui? Está maluco. Hoje é quem eu sou.
Quem te diria que eu me desacolhesse tanto!
Que é do teu menino? Está maluco.
Que é de quem dormia sossegado sob o teu teto provinciano?
Está maluco.
Quem de que fui? Está maluco. Hoje é quem eu sou.
Se ao menos eu tivesse uma religião qualquer!
Por exemplo, por aquele manipanso
Que havia em casa, lá nessa, trazido da África.
Era feiíssimo, era grotesco.
Mas havia nele a divindade de tudo que se crê.
Se eu pudesse crer num manipanso qualquer –
Júpiter, Jeová, a Humanidade –
Qualquer serviria,
Pois o que é tudo senão o que pensamos de tudo?
Por exemplo, por aquele manipanso
Que havia em casa, lá nessa, trazido da África.
Era feiíssimo, era grotesco.
Mas havia nele a divindade de tudo que se crê.
Se eu pudesse crer num manipanso qualquer –
Júpiter, Jeová, a Humanidade –
Qualquer serviria,
Pois o que é tudo senão o que pensamos de tudo?
Estala, coração de vidro pintado.”
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