CARLOS VIEIRA
Avenida Brasil
Há tempos uma novela não mobilizava tanto a sociedade brasileira! Avenida Brasil, escrita por João Emanuel Carneiro mostrou durante meses uma característica da alma humana – a maldade.
A Metapsicologia, ou seja, a psicologia freudiana, mostrou a partir de achados clínicos, que nós humanos somos movidos desde o inicio da vida por dois tipos de instintos: o instinto de vida e o instinto de morte. A saúde mental vai depender da preponderância das forças de vida sobre as pressões psíquicas de morte. O amor espera-se, deve predominar sobre a destrutividade, a maldade humana, o ódio, enfim todos os sentimentos e desejos homicidas e suicidas. A questão é que amor e ódio são parte intrínseca da realidade psíquica: o amor não é sinônimo de ausência de ódio; nem o ódio anula a presença do amor. O funcionamento mental de uma pessoa tem uma natureza dialética, pois oscila entre as forças de construção e destruição. Daí, o conflito psíquico ser inerente e, o que nos resta nessa vida é desenvolver uma capacidade para administrar o conflito, e não extingui-lo.
Avenida Brasil mostrou de uma maneira clara, objetiva, realística e às vezes cruel, esse lado perverso e mortífero da personalidade humana. Traição, ciúme patológico, ferimentos psíquicos, agressões violentas, crime, sequestro, roubo, intriga, uma série de comportamentos psicopatológicos nas várias classes da sociedade brasileira. A dramaturgia dos temas exigiu experiência e saúde mental dos atores, além de contaminar os expectadores que se identificavam, amando e odiando os personagens.
Uma bela experiência de um elenco que a cada capitulo crescia, desenvolvia e aprimorava a arte da dramatização.
Prezado leitor, o que quero enfatizar hoje é o que essa novela nos ensinou: ter consciência da capacidade destrutiva do homem e pensar quais as alternativas em direção ao crescimento psíquico.
Ferimento psíquico (ferida narcísica), dor mental, ódio, ressentimento e vingança compõem uma gradação perfeita na dinâmica psíquica na história que João Emanuel escreveu.
Alguém me falou que o compositor da novela teria se inspirado em textos de Fiódor Dostoievski (1821-1881), escritor russo, um dos ícones da literatura universal, conhecido mais publicamente por seus dois romances: Os Irmão Karamázov e Crime e Castigo.
Pesquisando fragmentos de textos de Dostoiévski, e do belo livro – “Dostoievski, Filosofia, Romance e Experiência Religiosa, do filósofo italiano Luigi Pareyson (1919-1991), vi sentido em pensar que João Emanuel tenha tido familiaridade com a obra do escritor russo.
Escreve Luigi Pareyson: “As páginas que Dostoievski dedica ao ‘Pesadelo de Ivan Fedorovic’ são de um poder extraordinariamente dramático e, ao mesmo tempo, de uma profundidade lucidamente filosófica e religiosa. Que o Diabo seja a personificação do sósia, isto é, da presença do mal no homem, resulta com dramática evidencia: Sou eu mesmo que falo e não tu... Tu és uma alucinação minha. És uma encarnação de mim mesmo, mas somente de uma parte de mim, de uma parte dos meus pensamentos e dos meus sentimentos, mas daqueles mais asquerosos e mais estúpidos... Insultando-te, insulto a mim mesmo! Tu és eu, eu mesmo, mas com um outro focinho. Tu dizes exatamente aquilo que eu penso e não estás em condições de me dizer nada de novo!... Mas tu escolhes os meus pensamentos mais feios... Não, tu não existes, tu és eu, eu mesmo e nada mais! És um zero, és uma fantasia minha”. Eu vejo em ti o canalha que saiu de mim; ele sou eu, eu mesmo: toda a parte baixa, vil e desprezível de mim.” (fragmentos do escrito de Dostoievski em – Os Irmãos Karamazov).
A ideia filosófica do autor russo nem é otimista nem pessimista. Penso que é um realismo forte e cruel, pois mostra as forças do mal e do bem, coexistindo dentro do ser humano. Somos, ainda que tenhamos dificuldade de admitir: Caim e Abel. A novela trouxe essa luta, mas assim como Dostoievski, a luta interna precisa passar pela consciência e experiência da maldade para chegar ao bem.
A alternativa, tanto na obra Fiódor Dostoievski como na novela de João Emanuel, é a capacidade de perdoar – só o perdão evita uma catástrofe maior: a loucura. Entretanto penso que para poder perdoar, antes é necessário se sentir responsável por essa parte diabólica da pessoa. Assumir a sua parte destrutiva é imprescindível para que se possa cuidar dela.
Nosso poeta Manuel Bandeira, em 1947, denunciou o “animal” que existe dentro do ser humano em seu poema – O Bicho – quem sabe, para poder cuidar dele.
A Metapsicologia, ou seja, a psicologia freudiana, mostrou a partir de achados clínicos, que nós humanos somos movidos desde o inicio da vida por dois tipos de instintos: o instinto de vida e o instinto de morte. A saúde mental vai depender da preponderância das forças de vida sobre as pressões psíquicas de morte. O amor espera-se, deve predominar sobre a destrutividade, a maldade humana, o ódio, enfim todos os sentimentos e desejos homicidas e suicidas. A questão é que amor e ódio são parte intrínseca da realidade psíquica: o amor não é sinônimo de ausência de ódio; nem o ódio anula a presença do amor. O funcionamento mental de uma pessoa tem uma natureza dialética, pois oscila entre as forças de construção e destruição. Daí, o conflito psíquico ser inerente e, o que nos resta nessa vida é desenvolver uma capacidade para administrar o conflito, e não extingui-lo.
Avenida Brasil mostrou de uma maneira clara, objetiva, realística e às vezes cruel, esse lado perverso e mortífero da personalidade humana. Traição, ciúme patológico, ferimentos psíquicos, agressões violentas, crime, sequestro, roubo, intriga, uma série de comportamentos psicopatológicos nas várias classes da sociedade brasileira. A dramaturgia dos temas exigiu experiência e saúde mental dos atores, além de contaminar os expectadores que se identificavam, amando e odiando os personagens.
Uma bela experiência de um elenco que a cada capitulo crescia, desenvolvia e aprimorava a arte da dramatização.
Prezado leitor, o que quero enfatizar hoje é o que essa novela nos ensinou: ter consciência da capacidade destrutiva do homem e pensar quais as alternativas em direção ao crescimento psíquico.
Ferimento psíquico (ferida narcísica), dor mental, ódio, ressentimento e vingança compõem uma gradação perfeita na dinâmica psíquica na história que João Emanuel escreveu.
Alguém me falou que o compositor da novela teria se inspirado em textos de Fiódor Dostoievski (1821-1881), escritor russo, um dos ícones da literatura universal, conhecido mais publicamente por seus dois romances: Os Irmão Karamázov e Crime e Castigo.
Pesquisando fragmentos de textos de Dostoiévski, e do belo livro – “Dostoievski, Filosofia, Romance e Experiência Religiosa, do filósofo italiano Luigi Pareyson (1919-1991), vi sentido em pensar que João Emanuel tenha tido familiaridade com a obra do escritor russo.
Escreve Luigi Pareyson: “As páginas que Dostoievski dedica ao ‘Pesadelo de Ivan Fedorovic’ são de um poder extraordinariamente dramático e, ao mesmo tempo, de uma profundidade lucidamente filosófica e religiosa. Que o Diabo seja a personificação do sósia, isto é, da presença do mal no homem, resulta com dramática evidencia: Sou eu mesmo que falo e não tu... Tu és uma alucinação minha. És uma encarnação de mim mesmo, mas somente de uma parte de mim, de uma parte dos meus pensamentos e dos meus sentimentos, mas daqueles mais asquerosos e mais estúpidos... Insultando-te, insulto a mim mesmo! Tu és eu, eu mesmo, mas com um outro focinho. Tu dizes exatamente aquilo que eu penso e não estás em condições de me dizer nada de novo!... Mas tu escolhes os meus pensamentos mais feios... Não, tu não existes, tu és eu, eu mesmo e nada mais! És um zero, és uma fantasia minha”. Eu vejo em ti o canalha que saiu de mim; ele sou eu, eu mesmo: toda a parte baixa, vil e desprezível de mim.” (fragmentos do escrito de Dostoievski em – Os Irmãos Karamazov).
A ideia filosófica do autor russo nem é otimista nem pessimista. Penso que é um realismo forte e cruel, pois mostra as forças do mal e do bem, coexistindo dentro do ser humano. Somos, ainda que tenhamos dificuldade de admitir: Caim e Abel. A novela trouxe essa luta, mas assim como Dostoievski, a luta interna precisa passar pela consciência e experiência da maldade para chegar ao bem.
A alternativa, tanto na obra Fiódor Dostoievski como na novela de João Emanuel, é a capacidade de perdoar – só o perdão evita uma catástrofe maior: a loucura. Entretanto penso que para poder perdoar, antes é necessário se sentir responsável por essa parte diabólica da pessoa. Assumir a sua parte destrutiva é imprescindível para que se possa cuidar dela.
Nosso poeta Manuel Bandeira, em 1947, denunciou o “animal” que existe dentro do ser humano em seu poema – O Bicho – quem sabe, para poder cuidar dele.
“Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.”
Carlos.A.Vieira, médico, psicanalista, Membro Efetivo da Sociedade de Psicanálise de Brasilia e de Recife. Membro da FEBRAPSI e da I.P.A - London.
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