quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Universidades virtuais


Thomaz Wood Jr.


Thomaz Wood Jr. escreve sobre gestão e o mundo da administração. thomaz.wood@fgv.br
13.08.2012 10:11


George Bernard Shaw fuzilou: “Desde pequeno tive de interromper minha educação para ir à escola”. Albert Einstein não ficou atrás: “É um milagre que a curiosidade sobreviva à educação formal”.
Nossa sociedade celebra a educação, mas não perde oportunidade para criticar as escolas. E não faltam motivos. O Brasil tem um sistema peculiar. Nossa antiga classe média frequenta colégios privados e universidades públicas, nas quais entra sem objetivos, frequenta sem inibições e sai sem aspirações. Durante quatro ou cinco anos, convive com mestres de imponentes insígnias e pouco apreço à educação.
Nossa nova classe média frequenta colégios públicos e universidades privadas, nas quais entra com algumas ambições, frequenta como pode e sai por sorte. Durante quatro ou cinco anos, convive com mestres que são verdadeiros operários do ensino, com muitas contas a pagar e pouco tempo para se dedicar.
Agora, dizem os sabidos e novidadeiros, a grande novidade é a universidade virtual. Mais uma vez, profetizam, as novas tecnologias vão operar o milagre de transformar água em vinho, pedra em pão. Será?
O Coursera é um start-up norte-americano criado pelos professores de Ciência da Computação Daphne Koller e Andrew Ng, da Universidade de Stanford, matriz maior de empresas do Vale do Silício. A empresa foi criada com a missão de oferecer, gratuitamente, por meio da internet, a qualquer indivíduo, a melhor educação do mundo, leia-se, aquela oferecida pelas melhores universidades. Por enquanto, a empresa sobrevive graças a investidores.
O fato relevante foi o anúncio recente de que mais uma seleta lista de universidades concordou em fornecer conteúdo para o Coursera disponibilizar na rede. As parceiras da empresa agora incluem as universidades de Princeton, Duke, Stanford, Pensilvânia, Michigan, Toronto e Edimburgo, entre outras. Uma delas já declarou que reconhecerá créditos realizados no Coursera, outras duas informaram que colocarão mais 3,7 milhões de dólares na empresa, elevando os investimentos a 22 milhões de dólares. No próximo período letivo, o Coursera pretende oferecer mais de cem cursos online, visando atingir 100 mil alunos. Não é pouco!
A educação superior tornou-se uma grande questão e, ao mesmo tempo, um grande negócio, atraindo empreendedores e investidores. O Coursera não está sozinho. Seus concorrentes incluem o projeto edX, da Universidade Harvard e do MIT, a Udacity e a Minerva. No Brasil, há iniciativas similares, tais como o Veduca, da iniciativa privada, e a Univesp, do governo do Estado de São Paulo.
Pensada como negócio, a educação superior é extremamente ineficiente: é cara, atende apenas uma pequena parcela da população e desperdiça recursos, à medida que cada professor (um recurso escasso e caro) cria o próprio conteúdo e o repete semestre a semestre para pequenas plateias, nem sempre muito interessadas. Segundo Koller, do Coursera, as aulas tradicionais surgiram há centenas de anos quando havia apenas uma cópia do livro, a do professor. Portanto, a única maneira de transmitir o conteúdo era o professor sentar na frente da classe e ler o livro. Hoje, com o uso das tecnologias de informação e comunicação, há maneiras mais eficientes de transmitir conteúdo, sugeriu a empreendedora em entrevista para a revista The Atlantic.
Naturalmente, as investidas da lógica de mercado sobre a educação superior causam arrepios. Entretanto, iniciativas como as do Coursera não devem ser temidas. Aulas ao vivo, para grandes plateias, como ocorre com frequência nos ciclos básicos dos cursos superiores, estão se tornando anacrônicas. Alguns professores tentam agir como animadores de auditório, usam anedotas e recursos performáticos para manter a atenção das hordas de apedeutas. A vítima é o aprendizado.
Um sistema de estudo dirigido, com apoio de recursos online e que respeite o ritmo do aprendiz pode, eventualmente, ajudar. Afinal, o valor de frequentar uma instituição de ensino superior não está nas aulas básicas, mas no contato com professores e colegas, na criação de redes de relacionamento e, principalmente, no trabalho conjunto e na realização de projetos de interesse comum.
Iniciativas como as do Coursera e de seus pares estão ainda em sua infância. Os conteúdos são fragmentados e muitos registros foram feitos simplesmente colocando-se uma câmera no fundo de uma sala de aula. A estética é pobre, e o material divulgado não é atraente. A grande promessa pode se transformar em grande decepção. Não terá sido a primeira vez. Não será a última. Talvez, o que precisamos é mais Jean Piaget e menos Bill Gates; mais Paulo Freire, menos Steve Jobs

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