Não direi que um fantasma ronda a Europa. Ele já chegou. Não assombra apenas a Zona do Euro, atinge também o Reino Unido. Os ingleses tiveram o terceiro trimestre de encolhimento do PIB e temem a perda da classificação de triplo A. A Espanha admite que o inevitável bate à porta: o país vai quebrar pela falência múltipla das regiões autônomas. Sem qualquer autonomia de voo, elas pedem socorro à União, que também pede socorro.
As partes da Espanha querem ser financiadas pelo Estado espanhol, que está sendo socorrido pelo comando da Zona do Euro. Até agora, o socorro não é direto. Tentou-se a ficção da ajuda aos bancos, que foi aprovada no final de junho, mas ainda não implementada. Agora, com as dificuldades das suas partes, é a própria Espanha que está totalmente encrencada.
O Reino Unido comemorava o fato de estar livre do peso da moeda comum e fazia admoestações à Alemanha por erros na condução da crise. Mas também tem alto endividamento, também tem gastos excessivos e, ontem, foi anunciado o terceiro trimestre de queda do PIB, confirmando a recessão. O número de -0,7% para o segundo trimestre do ano foi maior do que o previsto e provocou vários debates no país, além de elevar os temores de que a nota de risco possa ser rebaixada.
Mas existem diferenças. A Inglaterra sofre a crise em forma de recessão. O governo conservador vive a ironia de governar um país menor do que o que recebeu dos trabalhistas, aos quais tanto acusou de não saber administrar a crise. O que acontece na Espanha é uma crise de confiança, o risco da insolvência. Ontem, José Antonio Herce, sócio da consultoria AFI (Analistas Financeiros Internacionais) e professor de Economia da Universidade Complutense de Madri, admitiu em conversa com Valéria Maniero que a crise espanhola passou para uma nova fase. O momento atual foi consequência da demora das decisões, da piora da recessão econômica e do pedido de socorro das regiões autônomas.
— O risco mais grave é de uma estagnação da atividade e do emprego que dure anos. Isso é o que aconteceria se o Tesouro precisasse ser resgatado, e há probabilidade alta de que isso aconteça — disse Herce.
Ele acredita que com o colchão de liquidez que tem, o país aguenta até o outono — que começa no fim de setembro, mas não mais do que isso. A tentativa — aparentemente inútil — de evitar o resgate do país é para não submeter a Espanha a medidas de cortes ainda mais severas. As atuais já levaram o país a dois anos de recessão. O fantasma agora é de novos e mais profundos ajustes determinados pelos credores, através da chamada troica, que fiscalizariam as contas em caso de resgate. A Espanha tem pouquíssima chance — se é que tem alguma — de evitar o resgate pela Zona do Euro.
Ontem, a empresa espanhola Telefônica anunciou em Madri que vai suspender o pagamento de dividendos e cortar uma parcela dos salários dos altos executivos como parte do processo para se proteger da crise do país.
A Catalunha tem 7,5 milhões de habitantes, representa 16% da população espanhola, 18,7% do PIB, mas é a região mais rica. A renda per capita é 17% superior à do conjunto da Espanha. É a mais endividada, 21% do PIB, acima de Valência e Castilla-La Mancha, por exemplo. A importância econômica da Catalunha para a Espanha é enorme.
A Catalunha tem 7,5 milhões de habitantes, representa 16% da população espanhola, 18,7% do PIB, mas é a região mais rica. A renda per capita é 17% superior à do conjunto da Espanha. É a mais endividada, 21% do PIB, acima de Valência e Castilla-La Mancha, por exemplo. A importância econômica da Catalunha para a Espanha é enorme.
O que Patricia Gabaldón, do IE Business School, escola de Negócios de Madri, contou ilustra bem como são esses eventos. Há sempre um círculo vicioso. No caso: a crise fez com que a capacidade de arrecadação das regiões caísse e elas tiveram dificuldade de cumprir seus compromissos financeiros; como a falta de confiança dos mercados eleva o custo da dívida, essas regiões ficaram sem capacidade de se financiar.
— Ao pedir financiamento ao Fundo de Liquidez, as comunidades autônomas terão que enfrentar condições orçamentárias duras. Uma parte importante do ajuste espanhol é transferida para as regiões. Dado o nível de dívida que já tinham, não são capazes de fazer frente aos compromissos — diz Patricia Gabaldón.
Não há solução de curto prazo para nenhum desses países em dificuldade. A Grécia caminha para sair da Zona do Euro. Hoje, os economistas se dividem apenas sobre em quanto tempo isso ocorrerá. A maioria das apostas é para o ano que vem. Isso, que antes parecia ser um grande problema, já se dá hoje como favas contadas.
A complicação da Espanha é que o país é grande, o quarto maior, já vinha adotando medidas de austeridade que não funcionaram e está com um quadro social dramático pela dimensão do desemprego.
A complicação da Espanha é que o país é grande, o quarto maior, já vinha adotando medidas de austeridade que não funcionaram e está com um quadro social dramático pela dimensão do desemprego.
— A verdadeira tragédia para a Espanha e para a Europa seria deixar que as coisas chegassem ao ponto extremo em que estivesse comprometida a própria sobrevivência do euro. Isso é algo que as futuras gerações teriam o direito de censurar na atual geração de líderes europeus, que estão se mostrando dramaticamente incapazes de controlar os problemas — disse José Antonio Herce.
O fantasma da crise econômica profunda que, por contágio, atinge vários países já é uma realidade entre os europeus. O que ainda ronda a região é o do colapso da experiência de uma moeda comum.
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