domingo, 21 de setembro de 2014

Um retrato do Supremo Tribunal Federal Elio Gaspari, O Globo



Durante um ano, uma equipe de nove pessoas da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio, dirigida pelo professor Joaquim Falcão, estudou a tramitação de 1,5 milhão de processos e 14 milhões de procedimentos judiciais que tramitaram no Supremo Tribunal Federal entre 1988 e 2013.

Ela concluiu: “Os dados comprovam a urgência de que o Supremo repense sua relação com o tempo. (...) Boa parte dos indicadores mostra que o tempo não necessariamente é influenciado pela quantidade de processos que chegam aos ministros.” (O processo relacionado com o uso de cinto de segurança em coletivos completou 17 anos e oito meses.)

Diz o estudo: “É preciso repensar a gestão dos processos do Supremo. A total autonomia de cada ministro sobre como decidir é inalienável, mas não pode ser confundida com uma total autonomia da gestão processual.”

(O ministro Nelson Jobim retinha processos para os quais pedia vista por uma média de mil dias. Seu colega Sydney Sanches devolvia-os em um mês.)

O Brasil deve ser o único país onde um ministro pode travar o julgamento de um caso pedindo vista e levando o processo para seu gabinete. Em tese, a devolução deveria ocorrer em 30 dias. Em dezembro de 2013, na média, eles eram destravados depois de 346 dias. Um processo retido por vinte anos, passou por três ministros e quando foi julgado o assunto estava prejudicado.

O Supremo não divulga a lista de liminares à espera de decisão do mérito. Liminares decididas liminarmente por Joaquim Barbosa esperaram oito anos pelo julgamento do mérito. Com a lista, seria possível acompanhar o serviço do ministro-relator e a organização dos presidentes do Tribunal e de suas turmas.

Muitos tribunais divulgam suas pautas no início do ano. O STF não faz isso e fica todo mundo, inclusive os próprios ministros, pendurados na vontade do presidente da Casa. Pode-se acreditar que em muitos casos há método nessa desordem, mas de uma maneira geral, o que há mesmo é desordem por falta de método.

A pesquisa, coordenada também pelos professores Ivar Hartmann e Vitor Chaves, traz duas boas notícias. A primeira é a de que o STF tem um banco de dados onde se pode garimpar estudos como esse. Não é pouca coisa, porque a primeira reação do dragão corporativo será sempre a de encerrar o debate sumindo com as informações.

A segunda é a de que a desordem vem de longe e os indicadores melhoraram. A média do tempo consumido à espera de uma decisão sobre uma liminar caiu 42% entre 2004 e 2013. O tempo para a publicação de acórdãos caiu em 79%

Serviço: A íntegra da pesquisa “O Supremo e o tempo”, muito mais sofisticada e abrangente que este comentário, estará amanhã no site supremoemnumeros.fgv.br.



Elio Gaspari é jornalista

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