O Globo
O que a presidente Dilma classifica de “vingança”, a ex-senadora Marina Silva chama de “legítima defesa”. Seja lá o que for, esse sentimento deve ter se aprofundado ontem, quando o Senado, dominado pelas forças governistas, aprovou rapidamente a legislação que tira dos novos partidos o direito a tempo de televisão e fundo partidário, projeto esse que Marina atribui diretamente ao Palácio do Planalto.
Quem acredita que a intenção não foi dar o troco à manobra política de Marina e Eduardo Campos pode fazer tudo, menos política. Mais uma vez, a Rede Sustentabilidade, o partido que Marina tenta criar, está bloqueada por um projeto da maioria congressual, o que caracteriza uma ação política truculenta própria de regimes autoritários como o “chavismo”, identificado por Marina como a origem desse comportamento que faz “o diabo” para manter o controle político do país.
Mais uma vez será preciso recorrer ao Supremo Tribunal Federal para evitar esse prejuízo aos novos partidos, entre eles, a Rede, abrigada provisoriamente no PSB para um trabalho de guerrilha política de combate à polarização entre PT e PSDB.
Essa mágoa, que não é apenas de Marina, mas também de Eduardo Campos, que acusa o governo de bater abaixo da linha da cintura para tirá-lo da corrida presidencial, pode levar a uma ação mais direta contra a presidente Dilma na campanha eleitoral, o que reforçaria a área da oposição.
Teremos que ver como Campos e Marina resolverão a questão das coligações regionais. O PSDB havia feito vários acordos com o PSB pelo país todo, como mantê-los agora? Veremos até que ponto eles são oposição ao PT ou se quererão ficar em posição equidistante dos dois, para não ficarem marcados como meros antagonistas do PT. Eles têm muita preocupação com isso, pois vieram da base governista.
Desde 2010, Marina evita ser contra o PT, não usou na campanha nem mesmo as críticas que teria sobre a atuação da presidente Dilma na Casa Civil, que foi a razão de sua saída do governo depois de, durante quase todo ele, permanecer à frente do Ministério do Meio Ambiente.
O desabafo sobre o “chavismo” do PT, feito de madrugada na sexta-feira para um pequeno grupo de seguidores, não foi reafirmado na entrevista coletiva para que não ela fosse, como está sendo, acusada de radicalização à direita.
A diferença é que hoje os dois, especialmente Marina, estão magoados com o governo, a quem atribuem as manobras para tentar impedi-los de participar da corrida presidencial.
O nível de tensão desencadeado pela ação política de Marina e Campos pode reforçá-los, mas pode também trazer uma disputa interna que, mesmo não desejada por qualquer dos dois, pode ser incentivada por fatores externos que afetarão todos os demais competidores de modos variados.
Afinal, a disputa está aberta. O que parece ser hoje o grid de largada para a corrida presidencial de 2014 pode não ser o mesmo em julho, quando os partidos farão suas convenções.
Marina pode continuar aparecendo à frente de Eduardo Campos nas pesquisas que vierem a ser feitas, a tal ponto que crie uma situação de constrangimento para o governador de Pernambuco, que, nessa hipótese, não teria outra escolha a não ser abrir mão da disputa em favor de sua nova correligionária.
O ex-governador José Serra certamente ficou inquieto com a decisão de Marina, que abriu uma brecha na disputa presidencial que ele se considera capaz de preencher. Se tivesse tempo, teria mudado de partido para estar em condições de participar da disputa, mas não esperou o último dia para se definir.
Se o senador Aécio Neves não der mostras de que tem condições de reagir nas pesquisas, ocupando o lugar que o PSDB sempre teve entre as duas principais forças políticas do país, é possível que Serra tente reviver seu sonho de disputar a Presidência da República.
E, sobretudo, a presidente Dilma verá de volta Lula a seus calcanhares se a jogada de Eduardo Campos e Marina der certo. O movimento “Volta, Lula” ganhará corpo diante da nova configuração da campanha eleitoral, agora legitimado justamente pela mudança de cenário.
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