As organizações que crescem em torno de um propósito profundo, abordando e integrando estrategicamente os imperativos de negócio e as temáticas sociais, unem e motivam osstakeholders principais, sejam eles consumidores cépticos ou colaboradores reticentes. Para além de originar melhores e mais duradouros resultados financeiros
POR HELENA OLIVEIRA De acordo com o estudo que o Edelman Group publica, já há cinco anos, sobre o poder deste propósito, foi o mundo da conectividade 24/7, a “hiper-transparência” e a redução das barreiras da competitividade que obrigaram as empresas a procurar uma nova narrativa, algo que estimulasse e inspirasse os stakeholders a envolverem-se de uma forma mais apaixonada com a organização e com os valores que esta professa. E, de acordo com esta nova narrativa, as organização e as marcas líderes de mercado estão, realmente, a transformar a forma como operam, a construir um novo tipo de envolvimento e compromisso com os seus clientes, a fazer renascer um legítimo sentimento de cidadania e a construir novas políticas públicas no ambiente complexo e globalizado que as envolve. Ou em suma, estamos perante uma nova premissa que, nestas empresas “transformadoras”, é composta por uma excelência operacional e por uma performance societal. Ainda de acordo com o estudo da Edelman, estas organizações estão imbuídas de um propósito profundo, através do qual abordam os imperativos de negócio e as temáticas sociais através de uma estratégia integrada e, por isso mesmo, poderosa. Quando executado com honestidade e com visão de longo prazo, o propósito une e motiva os stakeholders principais, sejam eles consumidores cépticos ou colaboradores reticentes. Numa entrevista publicada na revista Forbes a passada semana (a qual o VER resume na sua edição do Revistas em Revista), o presidente do Conselho de Administração da consultora Deloitte, Punit Renjen – que tem vindo a levar a sério a cultura do propósito – afirmava que, no rescaldo da crise financeira de 2008 e com a ascensão do Occupy Wall Street – o famoso movimento de protesto, nascido em Nova Iorque em 2011, contra a corrupção e avareza do sistema financeiro e que afirmava representar 99% da população (contra o 1% desta de “ricos”) – o obrigou, muitas vezes, a justificar, em entrevistas ou em seminários para os quais era convidado, o papel diabolizado das empresas, no geral, e, no particular, da própria consultora que dirige. É que e em plena crise, a Deloitte concedeu aumentos salariais aos seus empregados excepcionais. Confessando que esta visão diabolizada das grandes organizações o incomodava sobremaneira e defendendo que as organizações da actualidade têm de procurar um “bem maior” que vá bem mais além do que os desafios padronizados de lucros e perdas, foi a partir do degelo financeiro de 2008 e dos protestos sociais que se lhe seguiram, que o presidente da consultora se começou a devotar seriamente à compreensão da cultura organizacional com propósito, não só como uma força motriz para instilar paixão pelo trabalho por parte dos milhares de trabalhadores que a Deloitte emprega, mas também porque a mesma origina melhores resultados financeiros.
Shawn Parr, CEO da Bulldog Drummond, uma reconhecida consultora de inovação e design, afirmou, num artigo recentemente publicado pela revista Fast Company, encontrar muitas pessoas que pedem orientação e ajuda para explorar e definir o seu propósito no mundo. Afinal, esta é uma cruzada a que, invariavelmente, nenhum ser humano resiste. E o mesmo se está a passar com as organizações. “As empresas que procuram conferir um novo vigor ao seu negócio têm de dar um passo atrás e responder à questão central do motivo que as leva a existir no mundo. Muitas vezes, as equipas de executivos tentam responder a esta questão delineando uma declaração de visão sobre como vêem o seu futuro”, diz Drummond. Mas acrescenta que “uma declaração de visão é, para muitos, aspiracional: ou seja, é a descrição do que a empresa deseja atingir, não se pretendendo que esta seja literal. Contudo, na maioria das vezes o resultado nem é credível nem completamente atingível”. Ao invés, uma declaração de propósito articula claramente a razão devido à qual a empresa existe no mundo, o papel que desempenha (e a diferença que imprime) na vida das pessoas, oferecendo uma descrição clara e precisa do seucore business. Se toda esta conversa pode parecer como mais uma das inúmeras modas que, de tempos a tempos, acometem a gestão, a verdade é que começam a existir estudos que realmente comprovam que uma organização com um propósito bem definido no que respeita às preferências e lealdade dos seus clientes, colaboradores, fornecedores e demais stakeholders– e principalmente num mundo em que a confiança nas instituições está nos níveis mais baixos de que há memória -, aumenta não só os níveis de envolvimento de todos os que com ela trabalham, como também os seus resultados financeiros. Mas estes resultados não se podem ficar apenas pelos ganhos financeiros, sendo necessário abrir caminho igualmente para a performance futura da organização em causa no que respeita às suas acções societais. Se, de acordo com o estudo Edelman, 87% dos consumidores globais acreditam que um negócio deverá atribuir um peso equitativo tanto aos interesses da sociedade como aos interesses da empresa, menos de um terço acredita que as organizações têm uma performance verdadeiramente significativa no que respeita à abordagem dos temas sociais. Ora, e assim, sendo, qual a melhor forma de se estabelecer um propósito autêntico que faça parte do ADN da empresa? A pesquisa realizada pela Edelman demonstra claramente que são os CEO que devem estimular as suas organizações para que se reúnam em torno de um propósito comum. 56% dos entrevistados (o universo dos inquiridos corresponde a oito mil consumidores em 16 mercados diferentes) acreditam que os CEO devem abordar as questões sociais através da criação de produtos inovadores que sejam socialmente responsáveis, 55% afirmam que estes devem fazer um compromisso de longo prazo com estas mesmas questões e, para 55% dos respondentes, os CEO deverão apoiar, publicamente, temáticas sociais. Pela primeira vez em cinco anos, o estudo da Edelman incluiu uma análise aprofundada sobre os atributos sociais que mais influenciam a confiança do consumidor e as intenções de compra relacionadas com o propósito de uma organização. E o estudo concluiu que os factores responsáveis pelo moldar das intenções de compra correntes estão largamente relacionados com os componentes básicos dos programas de cidadania: protecção e melhoria do ambiente, a criação de programas com impacto positivo nas comunidades locais ou as práticas éticas de negócio. Por outro lado, os atributos que os consumidores consideram como prioritários para as empresas que agem com “propósito” são orientados em torno do bem-estar dos colaboradores e da auscultação das necessidades dos clientes. No que respeita aos colaboradores, e em linha com outros estudos sobre esta nova cultura, estes deverão ser os primeiros a interiorizar o propósito da organização em que trabalham. Como refere o já citado Shawn Parr, “as pessoas que simplesmente se limitam a aparecer para trabalhar todos os dias e não estão a utilizar activamente os seus talentos para irem ao encontro ou se relacionarem com o seu propósito não estão, definitivamente, a operar com todo o potencial que seria desejável”. Ou seja, as pessoas que descobrem a sua razão de ser, que desvendam o seu propósito e se ligam a ele com paixão, tornam-se muito mais comprometidas e significativamente mais eficazes no trabalho e na vida privada simplesmente porque respiram um sentimento de realização. “Ajudar os seus colaboradores a descobrir e a definir o seu propósito representa uma oportunidade significativa de melhorar ‘o envolvimento da força laboral’ e, consequentemente, a performance corporativa na sua totalidade”, acrescenta o CEO da Bulldog Drummond E, de regresso a Punit Renjen, da Deloitte, é possível perceber como é que se pode instilar esta paixão nos colaboradores. Numa altura em que todas as empresas, em pleno coração da crise, despediam funcionários ou cortavam nos salários e/ou benefícios, a Deloitte investia 300 milhões de dólares em formação e educação para os seus empregados com a apresentação da Deloitte University. E os profissionais com elevada performance, no mesmo período, não deixaram de ser aumentados. Por outro lado, estas mesmas ações, como afirma Punit à Forbes, atingiram o coração dos millenials, “que são particularmente motivados por este conceito de propósito e muito cépticos relativamente ao ‘negócio puro e duro’”. Sem esquecer que a atracção e a retenção de talentos são cruciais num negócio do conhecimento como é o da Deloitte. E foi também por isso que a consultora resolveu fazer um inquérito online, a executivos e colaboradores, para aferir a cultura do propósito e o seu real impacto.
“O que as empresas fazem pelos seus clientes, pessoas, comunidades e sociedade está intimamente relacionado. Uma cultura de propósito assegura que a gestão e os colaboradores vêem-na como uma boa razão para irem trabalhar todos os dias” É assim que Punit Renjen dá início ao sumário executivo que acompanha o estudo “Culture of Purpose: a business imperative” desenvolvido pela Deloitte. Todavia e apesar das boas intenções, 68% dos colaboradores e 66% dos executivos entrevistados acreditam que as empresas não estão a fazer o suficiente para instilar na sua cultura o sentido de propósito com vista a gerar um impacto positivo em todos os stakeholders. E é possível misturar propósito e lucros, numa equação bem-sucedida? Sem dúvida. A boa notícia é a de que as organizações que se concentram para além dos lucros e criam a “cultura do propósito” têm mais probabilidades de atingir um sucesso duradouro e de longo prazo. Uma esmagadora maioria dos respondentes que afirmou que a sua empresa possuía um sentido forte de propósito, assegurou igualmente que a mesma tinha um historial de performance financeira substancial (91%). Por outro lado, o estudo lança igualmente uma nova luz sobre o impacto que as empresas podem ter no governo e nas organizações sem fins lucrativos. Tanto os colaboradores como os executivos, 46% e 60%, respectivamente, concordam que nenhum governo poderá aspirar a um potencial total sem a ajuda da comunidade empresarial. Adicionalmente, os respondentes têm exactamente a mesma noção no que refere às organizações sem fins lucrativos e à sua “dependência” saudável face às empresas. Que a cultura de propósito leva a uma verdadeira vantagem competitiva foi outra das conclusões do estudo. Os que consideram que a empresa cumpre a cultura de propósito não só confirmaram a sua boa performance no último ano (90%), como historicamente (91%), mas também asseguraram que as suas organizações ostentavam uma marca diferenciadora que se distinguia positivamente entre as demais concorrentes (91%), uma forte satisfação por parte dos consumidores (94%) e um verdadeiro contentamento dos colaboradores (79%). Comparativamente, dos que afirmaram trabalhar em organizações que não perseguem uma cultura de propósito, apenas 65% confirmaram a boa performance financeira da empresa ao longo do último ano ou historicamente (66%), com 61% a demonstrar orgulho face à sua marca e ao bom serviço que prestam ao cliente (63%). Contudo, é de sublinhar um dado de particular relevância: apenas 19% dos entrevistados se sentiam “bem tratados” enquanto colaboradores. Adicionalmente, uma significativa maioria dos executivos inquiridos (85%) concordou que a cultura de propósito da empresa pode constitui parte da razão pela qual escolheram nela trabalhar, comparativamente a 61% que asseguraram que essa mesma cultura constituiu um dos mais fortes motivos na altura de seleccionarem o seu empregador. “Enquanto líderes, há que mudar a narrativa – ter como enfoque o impacto que a nossa organização cria e não os lucros que gera”, afirma Renjen. “Actualmente, as avaliações com base nas receitas e nos lucros já não conferem uma ‘total picture’”, acrescenta o presidente de Deloitte. | |||||||||||||
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sexta-feira, 5 de julho de 2013
GESTÃOA cultura do propósito
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