sexta-feira, 5 de julho de 2013

Dilma Rousseff e a perigosa arte de pôr bodes na sala


Sandra Starling
Muitos, em algum dia, já ouviram esta história. Era uma vez uma família que vivia apertada em uma casa minúscula. Seguiram, então, a recomendação de um sábio: “Coloquem um bode na sala”. A vida ficou de tal forma insuportável que retornaram ao sábio para se queixar e esse prontamente recomendou a retirada do bode. Livres do transtorno, pararam de reclamar do desconforto da casa e até festejaram.
Pior que demorar a resolver crise é a tentativa de enganar, colocando bodes na sala. E a presidente anda conseguindo fazer isso. Esse é o caso da rapidez com que foi anunciada e descartada a proposta de constituinte exclusiva, que no dia seguinte já era substituída por um plebiscito para a reforma política. E isso sem sequer saber do TSE se haveria viabilidade para realizá-lo, a tempo de as novas regras valerem para 2014. Ou como realizar a discussão popular de temas complexos como voto proporcional ou majoritário. Se o povo optar pelo voto distrital, quem decidirá sobre o perímetro dos distritos?
Vale lembrar que Obama não tem hoje maioria na Câmara dos Deputados porque Assembleias estaduais dominadas pelos republicanos mudaram, em cima da hora, as fronteiras dos distritos em vários Estados. O que deve constar no plebiscito vira um tormento e assim a culpa vai sendo repartida com vários atores e levando à disputa entre plebiscito e referendo, quando a reforma política poderia ter se realizado antes se tivesse havido empenho sincero da presidente em relação a esse seriíssimo tema.
CAOS NA SAÚDE
E a falta de médicos? Quase à unanimidade, os estudiosos de gestão da saúde pública mostram que o problema está nas péssimas condições de atendimento ao público. Aceitemos que faltam profissionais. Qual dessas questões tem de ser resolvida primeiramente? Se o Congresso Nacional derrubasse o veto aposto pela presidente à vinculação de recursos da União para a saúde, poderia de imediato haver dinheiro! Disso, porém, ninguém fala. Mais um bode que o governo põe na sala: fica todo mundo discutindo se busca ou não médicos em Portugal, na Bolívia ou em Cuba.
E o uso de royalties do pré-sal para resolver os problemas da educação? Como crer nessa outra balela? Na semana passada, o TCU concluiu auditoria prevendo riscos de toda ordem para a própria exploração do pré-sal. E o Renan ainda quer fazer disso a fonte também para o passe livre para estudantes… Enquanto o óleo não jorra, seria bom que a presidente sugerisse a prefeitos e governadores abrirem a caixa preta dos lucros dos cartéis dos ônibus e os custos dos novos estádios de futebol. Dilma Rousseff consegue fazer todo mundo (desorientado como ela) discutir fumaça.
Mas o que está me deixando mais preocupada é que nessa perigosa prestidigitação volta a haver espaço para o confronto entre partidários da “cura gay” e os que lutam pelo direito individual de ser diferente. Quando religião se mistura à política, aí, sim, tudo pode ficar sem saída para ninguém.

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