sexta-feira, 9 de novembro de 2012

O MILAGRE GREGO



Laurence Bittencourt,(1)
Por muito tempo fui um apaixonado por teatro, em especial o teatro grego. Li praticamente todas as peças escritas pelos autores gregos antigos: Ésquilo, Eurípides, Sófocles e Aristófanes. Li também muita critica sobre o teatro grego. Os gregos deram inicio ao que hoje chamamos de “mundo acadêmico” em suas várias vertentes, como também inauguraram a literatura e o teatro, que por sua vez também foram inseridos nesse mesmo “mundo acadêmico”.          É interessante ressaltar que para alguns autores e estudiosos dos gregos antigos, espantados com a fascinante aventura desse povo que resolveu privilegiar o conhecimento, a cultura, o entendimento do que somos, tudo aquilo que eles legaram ao mundo no sentido cultural pôde ser designado como o “milagre grego”. E sem dúvida foi mesmo um milagre.
Imaginar as condições em que viveram e por isso mesmo imaginar o que eles fizeram e deram ao mundo é algo impensável e inimaginável, ainda que real. Um milagre como dizem alguns.
Se tomarmos como experiência de conhecimento e reflexão a tragédia grega, por exemplo, o palco da aventura humana e toda sua larga experiência se iluminam com uma grandeza impar.
Isso porque a pergunta sobre do que se trata a tragédia, pode ser respondida com outra pergunta: qual o conceito de tragédia.
Obviamente que tal conceito não se restringe apenas a explicações puramente estéticas, a partir da escrita e encenação de uma peça de teatro, e sim, a um conceito muito mais amplo, que envolve não só a dimensão simbólica, real (no sentido de realidade) como também dos mitos, como da metafisica (dos deuses), e também do ser. Tudo se reporta em última análise a fala e a escrita, dentro de um universo maior que é a linguagem.
A tragédia encenada pelos gregos e analisadas por Aristóteles num livrinho intitulado por ele de “Poética”, Poesis, fala do ser individual e coletivo. Fala das leis, do repúdio as leis e da queda de um personagem envolvido em um conflito que lhe escapa enquanto conhecimento, ou mais precisamente, lhe escapa enquanto verdadeiro conhecimento.
A essa noção de um saber desconhecido foi tomado modernamente pela psicanálise como um “saber inconsciente”, uma divisão no íntimo do ser, logo desconhecido para o sujeito que vive o conflito, mas determinado por ele.
O destino trágico elaborado literariamente pelos gregos resultou e representou a possibilidade de tratamento e de conhecimento sobre uma das facetas da condição humana, e que ainda hoje, desperta interesse e curiosidade. Mas, mais do que isso, desperta interesse cientifico sobre aquilo que somos em verdade. Um milagre, sem dúvida, na aurora do pensamento humano.
(1) Jornalista. laurenceleite@bol.com.br
(2) Mascaras da tragédia e da comédia

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