terça-feira, 4 de setembro de 2012

Um novo enredo, por Merval Pereira


Merval Pereira, O Globo
O ministro Ricardo Lewandowski abriu seu voto renegando a percepção de muitos de que não leva em conta os indícios e conexões dos fatos para construir sua convicção, atendo-se apenas à “verdade processual”.
Ao tratar da responsabilidade dos dirigentes do Banco Rural, ele fez questão de ressaltar que votaria seguindo o relator Joaquim Barbosa porque, além de provas dos autos como relatórios internos do próprio banco e do Banco Central, havia muitos indícios demonstrando que os empréstimos ao PT e à agência publicitária SPM&B foram feitos com normas mínimas de segurança, revelando serem “de pai para filho”, fora dos padrões normais dos bancos.
Aqui, abro um parêntesis para comentar a análise do advogado Márcio Thomaz Bastos, que defende o ex-diretor do Banco Rural José Roberto Salgado. Bastos lamentou com repórteres que os ministros estejam dando tanta importância aos relatórios internos do próprio banco; segundo ele, é “normal” que ao final a diretoria decida a conveniência ou não de empréstimos desse tipo. Assim, admite implicitamente o caráter “político” dos empréstimos.
Voltando ao voto do revisor, os indícios não levaram Lewandowski a se convencer de que, como acusa o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e endossa Joaquim Barbosa, os empréstimos foram fictícios, para encobrir o dinheiro desviado dos cofres públicos que foi distribuído por Marcos Valério a petistas e políticos aliados.
Para Lewandowski, houve gestão fraudulenta sim, mas para agradar o empresário que os diretores do Banco Rural consideravam que teria influência no governo petista, e poderia abrir as portas para bons negócios futuros. Pode estar aí a explicação do voto do revisor, que até agora não conseguiu ver nexo entre o desvio do dinheiro público e o mensalão. Ele está criando um novo enredo, não se sabe com que fim.
Ao condenar o diretor de marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, por desvio do fundo Visanet para a conta de Valério, o ministro Lewandowski tratou o assunto como se fosse um crime isolado, um mero trambique entre Pizzolato e Valério, sem nada a ver com o dinheiro que o então presidente da Câmara, João Paulo Cunha, recebeu do mesmo Valério, aceitando a tese da defesa de que o mandante do dinheiro fora o tesoureiro do PT Delúbio Soares.
Chegou a entusiasmar o advogado Márcio Thomaz Bastos, que considerou seu voto a vitória da tese do caixa 2 eleitoral. Uma maioria de 9 ministros não aceitou a tese do revisor, à qual apenas o ministro Dias Toffoli aderiu.
Já agora, ao condenar o Banco Rural por gestão fraudulenta para agradar a um empresário que teria bom trânsito com o PT, o ministro Lewandowski está entrando por outra senda, diferente da explorada pelo relator, mas que vai dar igualmente no conluio de um empresário corrupto com o partido do governo.
Se o dinheiro que Valério distribuiu para o PT e seus aliados era do “empréstimo” do Rural, pelo menos Delúbio Soares e José Genoino, que o assinaram, teriam cometido peculato, pois para isso não é necessário fazer nenhum ato ilegal, mas apenas sugerir a possibilidade. E não é necessário que o dinheiro seja público ou privado.
Mas eles não estão acusados desse crime. Vai ser difícil então inocentá-los da acusação de corrupção ativa.
Provavelmente, Lewandowski vai dizer que havia dinheiro legal e ilegal na distribuição feita por Valério. Mas se o empréstimo do PT foi real, por que o dinheiro distribuído aos políticos, por ordem de Delúbio, tinha que sair do bolso de Valério, através da SMP&B? E por que só foi pago muitos anos depois de tomado?
Entender que os empréstimos eram verdadeiros, mas dados através de métodos fraudulentos, torna a história mais complicada e menos verossímil que a do procurador-geral da República, assumida pelo relator Joaquim Barbosa. Resta ver para onde a maioria do plenário do Supremo seguirá desta vez.
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O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é o único político da oposição que consegue tirar o ex-presidente Lula do sério. A cada artigo mensal com críticas ao PT e a Lula, o ex-presidente sai de seus cuidados para atacar o inimigo íntimo. Desta vez, colocou a a presidente Dilma em situação delicada, exigindo dela um posicionamento oficial, quando deveria ter sido ele a se defender dos ataques de Fernando Henrique. Dilma voltou a comportar-se como subordinada de Lula. A hieraquia petista falou mais alto.

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