Por 50 anos, as forças conservadoras têm dito que é preciso crescer o bolo para depois distribuir; e as forças progressistas afirmam que é preciso distribuir para fazer o bolo crescer. O bolo cresceu, mas ficou amargo. É hora de pensar qual o sabor que desejamos para o bolo produzido pela economia brasileira.
Nesse período, a produção cresceu e nos fez a sexta economia do mundo, com R$ 4,1 trilhões por ano, sendo R$ 21 mil para cada brasileiro; as ruas estão cheias de carros e as casas de eletrodomésticos.
Mas ao redor desta abundância, o país continua entre os mais desiguais do mundo, com 10% de sua população analfabeta; 3,8 milhões de crianças fora da escola, das quais muitas nas ruas; as notas do IDEB envergonham e amarram o progresso; as florestas queimam; os campos estão vazios e as cidades inviáveis.
Além disso, a violência no trânsito e no crime deixam cerca de 100 mil mortos por ano, além de dezenas de milhares de deficientes que fazem o Brasil parecer um país recém-saído de uma guerra.
O crescimento econômico baseado no aumento do consumo no mercado interno e na produção de commodities está se esgotando pela falta de poupança e investimentos, pelo endividamento das famílias, por razões ecológicas ou pelo risco de redução na demanda externa.
O estado de bem-estar, incluindo as transferências de renda, não está criando portas de saída para a pobreza e se esgota financeiramente.
O futuro, mesmo se o bolo crescer, não parece promissor. No lugar de crescer para distribuir ou distribuir para crescer, é preciso mudar a receita do bolo, reorientar o propósito do padrão do avanço econômico, social, ecológico e cultural.
O crescimento econômico deve ser visto como um meio para alcançarmos uma sociedade, na qual as pessoas possam andar sem medo; sem a vergonha da posição no campeonato mundial de concentração de renda.
Tenha competitividade decorrente de uma população educada e culta; com um sistema de saúde que atenda nossa população; com todas as crianças bem cuidadas, em boas escolas; com um Estado eficiente, capaz de reduzir a carga fiscal e usar os recursos obtidos para oferecer serviços com qualidade ao público de hoje e do futuro; com processo produtivo capaz de concorrer no mercado internacional, não apenas por custo baixo, mas, sobretudo, pela capacidade de inovar e oferecer novos produtos baseados em alta tecnologia.
Tudo isso deve ser parte da receita para o bolo que, ao crescer, carregará o bem-estar social e a distribuição dos benefícios no presente e no futuro.
Para construir esse novo bolo, é preciso mudar o perfil do PIB, não apenas fazê-lo crescer. Ele deve ser produzido a partir do respeito ao meio ambiente e equilíbrio social e priorizar investimentos que levem o país a ter um novo retrato, especialmente na educação de qualidade para todos.
Porque a educação é o principal condimento do sabor desejado para o bolo que queremos.
Cristovam Buarque é professor da UnB e senador pelo PDT-DF.
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