sábado, 5 de maio de 2012

Na raiz dos juros por Miriam Leitão


Enviado por Míriam Leitão - 
5.5.2012
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9h00m
Querer ter taxa de juros a níveis internacionais é um bom objetivo. Isso remove mais um pouco da herança do período hiperinflacionário. É preciso, no entanto, ter a mesma ousadia na meta de inflação. Há anos o Brasil tem como meta 4,5%, altíssima para os padrões da Europa, Estados Unidos ou Japão, que têm metas — explícitas ou não — em torno de 2%. O Banco Central comemorou quando fechou em 6,5% no ano passado.
A fórmula de remuneração da poupança era um obstáculo para a queda das taxas de juros abaixo de 8,5%. Mas não é o único. O mais importante obstáculo é a inflação. Juros de 5% seriam considerados altos no mundo. No Brasil, é taxa de juros negativa porque a inflação está acima disso.
A presidente Dilma acertou quando mirou os enormes spreads bancários, mas errou quando passou a tratar disso como um discurso político. Na racionalidade, o assunto fica mais bem tratado. Racionalmente é preciso reconhecer que o governo tem razão quando diz que os bancos cobram spreads abusivos. Parte do spread é engordado pelo próprio governo, que cobra imposto alto sobre a intermediação financeira.
Além disso, o mercado de crédito brasileiro tem uma distorção que reduz a potência da política monetária. As grandes empresas têm acesso a juros abaixo da taxa Selic, que, em alguns momentos, chegam até a ser negativos. Quando a inflação sobe, o Banco Central tem que subir as taxas para conter o acesso ao crédito e assim reduzir o ritmo da economia e controlar a alta dos preços. Só que o crédito do BNDES não é afetado por essa ação do BC e, para compensar, os juros tem que subir ainda mais para que se atinja o efeito de aperto monetário.
Ao politizar a questão dos juros, a presidente deixa o Banco Central no córner. E se a inflação subir? O BC poderá contrariar a presidente? Se o BC puder fazer seu trabalho, haverá menos apostas na alta de preços. Se houver a percepção de que ele deixou de ter metas de inflação para ter metas de juros, a previsão dos agentes econômicos será de mais elevação de preços.
No ano passado, o governo anunciou como uma vitória o fato de que a inflação terminou o ano em 6,5%. Era como se essa fosse a meta, e não os 4,5%. Assim também se comporta o Banco Central. É como se a meta tivesse se movido para o teto. Se for leniente com a inflação, o Banco Central terá mais dificuldade de atingir o objetivo de juros baixos por longo tempo no Brasil.
Nos próximos meses a tendência é de queda da inflação em 12 meses, mas no final do ano haverá pressões inflacionárias. Naturalmente, a economia passará por períodos de maior ou menor estresse nos preços, provocados por choques externos ou por fatores internos. Se o Banco Central está impedido de elevar os juros ele não poderá fazer o seu trabalho.
O lado bom desse movimento da presidente é que o mercado bancário foi sacudido. O spread é construído por uma superposição de fatores. Alguns são provocados por políticas governamentais, como os tributos ou o recolhimento compulsório. Mas os bancos colocam no spread seus custos administrativos, uma cobertura para a inadimplência, e uma parte para o retorno do capital. O que significa que eles podem ser ineficientes porque o custo operacional é distribuído aos tomadores dos seus recursos. Isso sem falar nas tarifas. Tem margem gorda para cobrir o risco, mesmo quando a inadimplência é alta. E coroando tudo tem a fatia do seu lucro reservada. Em qualquer setor, o lucro é consequência da eficiência e competência da empresa e não garantia a priori.
A pressão sobre os bancos pode levar a mais competição, mais eficiência, e menor risco de inadimplência porque torna a dívida mais fácil de ser paga. Portanto, é um movimento que aperfeiçoa a economia. O erro está no tom acima que a presidente deu a partir do Primeiro de Maio. Não pode ser uma cruzada santa contra os bancos. Tem que ser um movimento para aumentar a eficiência, a competição e a segurança no mercado de crédito brasileiro.
O governo está ficando aflito com a falta de reação da economia aos estímulos. O economista José Júlio Senna, da MCM consultores, avalia que a economia tem vários sinais antecedentes de que não está retomando o crescimento.
— Os sinais não estão bons, o número da produção industrial de março, que saiu esta semana, fará com que o PIB do primeiro trimestre seja revisto para baixo. Estávamos com 0,6%, na margem. Será o terceiro trimestre seguido de PIB fraco. Os dados antecedentes de abril também estão fracos, houve a quarta queda seguida do indicador PMI, dos gerentes de compras, as vendas de veículos caíram, os estoques estão elevados — disse o economista.
Todos os sinais mostram uma economia fraca. Na avaliação de Senna, grande parte do esfriamento veio de fora. Ontem, o ministro Guido Mantega disse que o crédito não está crescendo a contento. Os bancos estão mais cautelosos porque aumentou a inadimplência e eles estão tendo que fazer provisões contra o risco. A oferta de crédito tem que respeitar a capacidade do tomador de pagar a dívida. Do contrário, alimenta-se a bolha, como o mundo acabou de nos ensinar.

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