sábado, 5 de maio de 2012

A CPI, a moral e o grampo


Enviado por Ruy Fabiano - 
5.5.2012
 | 13h03m
POLÍTICA


Corrupção é de direita ou de esquerda? A pergunta parece – e é – idiota, mas decorre da tentativa absurda de conferir blindagem ideológica a políticos envolvidos com Carlos Cachoeira.
A CPI foi concebida para crucificar dois pesos-pesados da oposição: o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO) e o governador tucano de Goiás, Marcone Perillo, acusados, em graus diferenciados, de relações promíscuas com o contraventor.
Eis, porém, que, na sequência, descobriu-se que mais dois governadores, além de um punhado de parlamentares governistas, jogavam no mesmo time: Agnelo Queiroz (PT-DF) e Sérgio Cabral (PMDB-RJ). Agnelo, que já era alvo de denúncias do tempo em que ocupou uma secretaria no Ministério da Saúde e em que foi ministro dos Esportes, soma agora mais essa.
Bem mais do que Perillo, seus assessores mostraram-se integrados ao esquema Cachoeira.
Sérgio Cabral é amigo íntimo do dono da Delta, Fernando Cavendish, o que, em si, não constitui nenhum delito. Porém, trata-se de empresa que passou de nanica a gigante na Era Lula, com obras bilionárias no estado que Cabral governa, muitas sem licitação.
A Delta, de quebra, está sob suspeita de integrar ou mesmo de pertencer ao esquema Cachoeira, o que coloca o governador no alça de mira da CPI.
Diante do imprevisto – altamente previsível -, começa um movimento seletivo para poupar os governistas e centrar as investigações nos oposicionistas. Mais especificamente, em Demóstenes e Perillo.
Daí a pergunta inicial sobre corrupção e ideologia. O Código Penal não discrimina ninguém; a política, sim.
O que é óbvio em todo esse imbróglio é que, se há alguém que não exibe qualquer intolerância ideológica, esse alguém é o próprio Cachoeira. Relacionou-se com todos, à direita e à esquerda, mas, por razões óbvias, mais com quem está no poder – e, por conseguinte, dispõe de meios mais eficazes de atendê-lo.
Ninguém monta um esquema invasivo do Estado, nas proporções em que Cachoeira o fez, abrangendo os três Poderes, sem amplas e plurais conexões. Num país em que tudo depende do Estado, que a tudo invade, é inevitável que para lá se desloquem a esperteza e o crime.
Como disse um diretor da Delta, “basta dar uns milhões a um senador” e tudo se resolve. A um senador, a um deputado, a um governador, a um juiz, a um ministro, a um chefe de gabinete ou mesmo a uma secretária, dependendo do que se pretende e com a propina variando de acordo com a instância hierárquica.
Na Era PT, o Estado ampliou os seus domínios, seus tentáculos até a intimidade administrativa de empresas privadas. O episódio da nomeação do presidente da Companhia Vale do Rio Doce, privatizada no governo FHC, é emblemático.
O governo Lula, como se recorda, discordou do nome escolhido e fez a empresa nomear outro. Em tal ambiente, a busca de sucesso empresarial deixa de ser a eficiência e a conquista do mercado e passa ser o âmbito governativo.
Em vez de investir dinheiro no aprimoramento de sua atividade, o empresário é tentado a investi-lo comprando pessoas influentes, que não estão necessariamente apenas no governo, mas também na oposição, como foi o caso de Demóstenes.
O país, afinal, é pluralista e quem é oposição em Brasília pode ser situação em seu estado.
Suponhamos que a CPI, na melhor das hipóteses, atenda as expectativas do público e desmonte o esquema Cachoeira, revelando suas conexões políticas e promovendo uma razoável faxina nos três Poderes (sejamos otimistas). O problema estará resolvido? De modo algum.
Quantos Cachoeiras ou candidatos a circulam nas diversas esferas do Estado brasileiro?
Enquanto este for o responsável pelo sucesso ou fracasso das atividades econômicas, o mal continuará presente, a seduzir ambiciosos e oportunistas.
No caso Demóstenes, o que mais se ouve entre seus pares – governistas e oposicionistas -, antes (ou mesmo acima) de qualquer condenação moral, é uma censura técnica, do tipo “ele foi ingênuo de falar tanto ao telefone”. A lição que deixa, pois, é esta: seja mais discreto ao telefone.
As operadoras, daqui em diante, devem faturar menos no âmbito da Praça dos Três Poderes.

Ruy Fabiano é jornalista

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