sábado, 18 de julho de 2015

FRANCISCO DORNELLES:: "LULA PERDEU AS RUAS"


Os erros deste governo nos levaram a uma das maiores crises que já presenciei na história brasileira.
Data: 04/07/2015 
Horário: 18:30:00 
Veículo: VEJA - SP 
Editoria: BRASIL 
Autor: Não informado. 
Tags: Lava-Jato 
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FRANCISCO DORNELLES::
FRANCISCO DORNELLES::

Aos 80 anos, o mineiro Francisco Dornelles (PP-RJ) é um dos homens públicos há mais tempo em atividade no país e um dos mais ouvidos pela classe política. Apesar da experiência de cinco décadas, período em que ocupou ministérios em três governos, poucas vezes ele assistiu a crise tão profunda. Os últimos meses têm sido especialmente difíceis. Dornelles vê seu partido, o PP, desmoronar sob os holofotes, com 32 integrantes enredados no escândalo do petrolão. "Partido político é como um buquê: tem rosa, cravo e flor de cemitério", compara o ex-senador, atual vice-governador do Rio de Janeiro. Nesta entrevista a VEJA, ele condena as práticas dos colegas de sigla, aponta equívocos no governo petista, de quem o PP é aliado, e pensa o Brasil. Faz ainda uma revelação surpreendente para quem é sobrinho de Tancredo Neves: se a eleição presidencial fosse hoje, seu candidato seria o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e não o primo Aécio Neves. "Mas deixa 2018 chegar", diz.

OS EQUÍVOCOS DE DILMA — Acho a presidente séria e compreendo a complexidade de governar um país como o Brasil, mas ela precisa entender que errou muito e é também responsável pelo que está acontecendo. Olhe as pedaladas fiscais que fez para acobertar o déficit público. Não se pode entregar um resultado negativo e dizer que é positivo. E no setor do petróleo? Abandonar o sistema de concessão e adotar o regime de partilha é quase reestatizar a exploração, um retrocesso enorme. Na minha opinião, o caminho deveria ser justamente o oposto: privatizar setores como refinarias e até a BR Distribuidora em prol da eficiência. Dilma centraliza demais as decisões. Esses são equívocos que nos levaram a uma das maiores crises financeiras que já presenciei na história brasileira.

LEGADO NULO — Este governo não tem uma marca, coisa que todos os grandes estadistas, entre erros e acertos, deixaram. Getúlio Vargas atrelou-se às políticas sociais. Juscelino Kubitschek sacudiu o Brasil na área de infraestrutura. Tancredo Neves pretendia unir o país na transição para o Estado democrático de direito. FHC chamou a sociedade para a luta contra a inflação. E Dilma? O grande encanto dos governos do PT era a geração de empregos, que só desacelera. Sinto a presidente acuada. A única saída seria selar um grande entendimento nacional, convocando bons quadros para pensar e apontar os rumos.

LULA EM BAIXA — Se a eleição presidencial fosse hoje, Lula não disputaria. O PT ficou muito enfraquecido. A fortaleza de Lula sempre esteve nas ruas, e elas, neste momento, não estão com ele. Acho perigoso o discurso que propaga, dividindo o país entre pobres e ricos, Norte e Sul, patriotas e vendidos. Temos de aprender a fazer política séria, que é a arte de divergir e conciliar a toda hora. Mas não é fácil alguém morrer na política brasileira, não. Ela tem um alto grau de imprevisibilidade. Aqui, um ano é um século. E ainda faltam três para 2018.

O FATOR CUNHA — Na política não existe vazio que não seja logo ocupado. Quando o Executivo deu sinais de fraqueza, o PMDB sentiu o vácuo e se posicionou na mesma hora. O Eduardo Cunha (presidente da Câmara dos Deputados) é extremamente inteligente, homem de dormir duas horas por noite, obstinado. Ele está indo muito bem, mostrando que não vai aceitar apenas chancelar ordens do Planalto. Onde houver espaço, vai entrar e ditar a sua agenda.

ESTADO GIGANTE — O governo já fica com a maior parte dos lucros das empresas e quer mais. O PT vira e mexe sinaliza algum interesse em taxar as maiores fortunas, por exemplo. Acho uma burrice completa. Já há o imposto de renda cobrado pela União e outro sobre o patrimônio, arrecadado pelos municípios. É a marcha para a insensatez, o tipo de especulação que só aumenta a instabilidade.

PP NO PETROLÃO — Nossa posição é delicada, e o PP está abalado. Mas costumo dizer que partido político é como um buquê: tem rosa, cravo e flor de cemitério. Há pessoas no PP pelas quais eu ponho a mão no fogo; por outras talvez não. Quando Severino Cavalcanti ganhou a eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, em 2005, o PP reivindicou uma diretoria na Petrobras. Aí, gente do próprio governo federal sugeriu que o partido apadrinhasse Paulo Roberto Costa (ex-diretor de Abastecimento e delator do esquema na estatal). O José Janene (então líder do partido na Câmara, morto em 2010) topou. Aliás, quando eu era ministro do Trabalho de FHC, o Janene me indicou três conhecidos, que tive de afastar, um depois do outro, porque estavam vendendo facilidades. O quarto acabou preso pela polícia. Este nasceu assim, irresponsável. No caso da Petrobras, os desdobramentos foram inacreditáveis. Só espero que não haja clemência com ninguém na Operação Lava-Jato. Quem tem culpa precisa pagar.

PT NO PETROLÃO — O PT foi o responsável pelos desmandos e desvios revelados pela Lava-Jato. No poder público, a política indica quadros, mas a administração pode demitir em nome da eficiência. Se tiver de pôr alguém no olho da rua, que faça isso sem dar satisfação. Claramente faltou comando na Petrobras. Será possível que as pessoas ali não viam nada do que se passava? Afinal, não roubaram um cacho de bananas da empresa, mas milhões e milhões de dólares.

RIO EM CRISE — A situação do Rio de Janeiro é extremamente difícil. O estado registra um déficit de 13 bilhões de reais por ano. A grande fonte de arrecadação de ICMS vinha do petróleo, mas a indústria parou. Prevíamos royalties com o barril a 100 dólares. Esse preço caiu à metade. A conjuntura internacional também contribuiu para o desaquecimento da economia. Em paralelo, há um recrudescimento da violência. As quadrilhas estão testando o fôlego do governo. Elas querem saber até onde o poder público vai endurecer no combate ao crime. De um lado, os marginais radicalizam, atingindo mulheres e crianças em ações de visibilidade; de outro, a polícia comete erros, alvejando inocentes com balas perdidas no meio dessa guerra. O fato é que o caminho das Unidades de Polícia Pacificadora não tem volta.

CABRAL, O DESCUIDADO — O ex-governador Sérgio Cabral é extrovertido, gosta de vida social, tinha prestígio e fez o melhor governo que o Rio já teve, mas não se preocupou com a forma de conduzir as coisas. Não quero usar aqui a expressão deslumbramento com o poder. Diria que ele se descuidou em algum grau dos atos litúrgicos da administração. Mas, se quiser, será o candidato do PMDB a prefeito do Rio em 2016. Uniria a todos e não teria adversários. Nunca falou abertamente disso, mas, na minha opinião, ele quer, sim.

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