quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

LEITURA ATERRORIZANTE - PAULO CASTELO BRANCO


Diário do Poder

As luzes da mesa de cabeceira da presidente Dilma devem estar acesas durante a madrugada. A presidente é leitora voraz e, segundo consta, lê tudo que lhe surge pela frente. Nesses dias de apreensão com as eleições para a Câmara e o Senado, além dos resultados que a deixaram irritada, Dilma deve ter deixado de lado os livros de temas amenos para se debruçar nos relatórios que, a cada dia, atormentam o seu viver.
A insuperável crise da Petrobrás a assusta com a possibilidade de, a qualquer hora, um delator a coloque na lista dos envolvidos diretamente com os malfeitos na empresa. A saída de Graça Foster e a dificuldade em encontrar um destemido executivo que se disponha a assumir a direção da combalida empresa e colocar a sua cabeça a prêmio, são dramas em moto contínuo que mantêm o governo sofrendo com o balanço das ondas de notícias como as ondas que atingem as plataformas em alto mar.
Desconfiada de tudo e de todos, a presidente agora está debruçada na leitura do parecer do mestre Ives Gandra que circula na imprensa e se tornou o mais lido nas redes sociais. Gandra, com a força do seu conhecimento e a credibilidade de um dos maiores nomes do Direito, elaborou parecer em que sustenta a possibilidade jurídica de proposta de “impeachment” da presidente.
O PMDB, que detém a vice-presidência da República nas mãos de Michel Temer, conceituado constitucionalista, político habilidoso e com reputação ilibada, aguarda a eventual substituição da presidente, agora com o reforço de Eduardo Cunha que, mesmo sendo da base do governo, poderá ser o algoz da aliada.
Nesta fase de crise hídrica, ainda falta muita água para passar debaixo da ponte que sustenta o governo. O desânimo das entidades representativas da sociedade civil em se manifestar duramente contra os desmandos é o ponto crucial do momento político. Na nossa traumática história de afastamento do presidente da República, no caso do ex-presidente Collor, hoje senador e aliado de Dilma, houve a união da OAB, ABI, CNBB e centenas de outras entidades que se posicionaram pelo “impeachment”, obrigando a abertura do processo político que mudou a nossa história de leniência e acobertamento de procedimentos de autoridades em detrimento do interesse público.
O senador Fernando Collor, mesmo que Dilma o mantenha afastado, poderia ser melhor conselheiro do que os seus auxiliares que, a cada opinião dada, afundam o governo e a presidente. Collor, com arrogância ou inabilidade, enfrentou a classe política, o Judiciário e desdenhou da eficiência das investigações do Ministério Público e da Polícia Federal; no final, estava só e caiu.
Dilma, além de não ter o apoio dos líderes do Partido dos Trabalhadores, decidiu ser independente de Lula e segue firme para o cadafalso, de cabeça erguida como se fosse mártir de uma causa justa. Os seus admiradores na verdade não são seus, são de Lula, que criou o maior curral eleitoral da nossa história. Nunca antes neste país se viu tanta gente dependente das benesses do poder. O ex-presidente, que se comporta como candidato ao posto da sucessora, vive nas sombras, manipulando suas marionetes para desgastar Dilma que, nos últimos dias, já perdeu treze quilos mas, segundo seus nutricionistas, ainda tem muita gordura a perder.
A degola de Graça Foster não bastará para conter a sanha por cargos de ex- companheiros que serão ocupados pela base temporária que sustenta o governo. Os excluídos sairão atirando e expondo as mazelas do poder, como o faz a conceituada petista Marta Suplicy.
Se a presidente Dilma quiser fazer algo de novo para ficar no cargo, não bastará encerrar a leitura do parecer de Gandra antes do final, como se fosse um livro de histórias de terror; deverá seguir o exemplo do candidato vitorioso senador Aécio Neves: deixar a barba crescer e deixá-la de molho até a crise passar.

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