sábado, 10 de janeiro de 2015
A Controladoria-Geral da União tentou fazer um acordo com a força-tarefa do Ministério Público Federal encarregada da Operação Lava-Jato para limitar punições às empreiteiras envolvidas em fraudes na Petrobras, evitando que elas fossem declaradas inidôneas e, consequentemente, ficassem impedidas de fechar novos contratos com o governo federal. A proposta, revelada ao GLOBO por uma das autoridades que acompanha as investigações, foi rejeitada pela força-tarefa. O acordo foi encarado pelos investigadores como uma tentativa do governo de salvar empresas que estão à frente de grandes obras públicas no País. A proposta foi apresentada a um grupo de procuradores da República pelo secretário executivo da Controladoria-Geral, Carlos Higino, no fim do mês passado. Higino sugeriu a fixação de multas às empreiteiras como punição máxima em âmbito administrativo. Com isso, as empresas teriam que devolver aos cofres públicos uma quantia em dinheiro, mas se livrariam da punição mais drástica: a declaração de inidoneidade. Mas o Ministério Público Federal entendeu que não seria possível limitar as punições a multas às empresas que até o momento não aceitaram colaborar com as investigações. Por enquanto, a maioria das construtoras apenas aceita reconhecer parte das acusações e pagar uma indenização. Um possível acordo com a CGU sem um entendimento prévio com o Ministério Público não garantiria, no entanto, que as empreiteiras se livrariam de ações penais, nem mesmo de uma eventual tentativa do Ministério Público Federal de, pela via judicial, pedir que as empresas envolvidas ficassem impedidas de fazer qualquer contrato com o governo. Ao GLOBO, Higino confirmou a tentativa de entendimento. "O processo punitivo leva à declaração de inidoneidade. E a experiência que tivemos com a Delta e a Gautama (construtoras punidas em escândalos anteriores) é que a declaração de inidoneidade provoca uma grande possibilidade de fechar a empresa", disse. Durante a negociação, Higino e seus auxiliares argumentaram que seria melhor aplicar multas às empreiteiras agora e receber o dinheiro o mais brevemente possível. Uma punição mais drástica, no curso normal dos processos penais e administrativos, poderia chegar tarde demais, segundo esse raciocínio. Na conversa, os representantes da CGU alegaram que algumas empreiteiras poderiam entrar em crise financeira e não teriam dinheiro nem mesmo para ressarcir parcialmente os prejuízos. A insolvência poderia até contaminar o sistema financeiro, especialmente bancos que abrigam negócios das empresas. Higino disse que não buscava um acordo coletivo. A idéia, segundo ele, seria negociar acordos individuais conforme as peculiaridades de cada caso. Ele argumenta que a idéia não é proteger a empresa do risco financeiro. Mas evitar que uma punição severa resulte em perda total para os cofres públicos. "A idéia é evitar uma vitória de Pirro, quebra-se a empresa e não se recupera um tostão para o serviço público", afirmou Higino.
Os procuradores Orlando Martello, Deltan Dallagnol e Eduardo Pelella, do MPF |
As duas partes não chegaram a um consenso, mas as tratativas prosseguem. Se quiser, a Controladoria-Geral pode fazer acordos de leniência com as empreiteiras independentemente da opinião dos procuradores. A chancela prévia do Ministério Público evitaria futuras contestações jurídicas das decisões sobre as empreiteiras, e ainda facilitaria a adesão das empresas. Em outra frente, procuradores da força-tarefa dependem também da Controladoria-Geral e do Tribunal de Contas da União para calibrar as punições às empresas que decidirem colaborar com as investigações nos processos penais. Sem algum tipo de compensação em âmbito administrativo, algumas empresas poderiam se sentir pouco estimuladas a colaborar na esfera penal. Desde que foram alvo da sétima fase da Operação Lava-Jato, as empreiteiras vêm tentando em várias frentes negociar um acordo para atenuar suas punições. Representantes das empresas procuraram o Ministério Público Federal para negociar o pagamento conjunto de R$ 1 bilhão de multa. Em troca queriam um abrandamento das penas. Os procuradores recusaram. Para eles, só seria possível fazer acordo se os executivos decidissem contar o que sabem sobre os desvios de dinheiro na Petrobras. Em uma conversa com parlamentares, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, chegou a declarar que não havia hipótese de aceitar acordo coletivo com as empreiteiras. O procurador até ironizou a iniciativa. Para ele, a iniciativa seria uma espécie de “cartel da leniência”. Em dezembro, Janot afirmou que o Ministério Público está atuando para não deixar ninguém impune: "Ninguém se beneficiará de ajustes espúrios. Isso todos temos de ter certeza. A resposta para aqueles que assaltaram a Petrobras será firme. A decisão é ir fundo nas responsabilizações civil e criminal". Mesmo diante das condições estabelecidas pelo Ministério Público Federal, as empreiteiras continuaram numa busca incessante por uma alternativa a punições máximas. Entre os papéis apreendidos na Engevix, em novembro passado, a Polícia Federal encontrou uma anotação em que o autor faz referência à urgência de um acordo. Para o autor do documento, Janot e o ministro Teori Zavascki, do Supremo, dificilmente adotariam medidas extremas. “Janot e Teori sabem que não podem tomar a decisão. Pode parar o País”, diz a anotação, de 6 de novembro. Nas últimas semanas surgiram rumores de que pelo menos duas das grandes empresas estão com dificuldades para pagar dívidas e contrair novos empréstimos. As dificuldades aumentaram depois que a Petrobras anunciou, em 30 de dezembro, que as 23 investigadas na Lava-Jato estão proibidas de participar de novas licitações e serão alvos de processos individuais.
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