terça-feira, 26 de agosto de 2014

O fim da mentira por omissão?

vespeiro.com/2014/08/25/a-forca-da-mentira-por-omissao/

by fernaslm
a4O Secretario Nacional de Finanças do PT, João Vaccari Neto, “esteve várias vezes na sede da CSA Project Finance Consultoria e Intermediação de Negócios, do doleiro Alberto Youssef, para tratar de operações com fundos de pensões” e de outras falcatruas, contou o advogado Carlos Alberto Pereira da Costa, apontado pela Policia Federal como laranja de Youssef e do deputado federal Carlos Janene, morto em 2010, depois de fazer acordo de delação premiada. Ele está preso desde março pela Operção Lava Jato, acusado de remessas ilegais do Laboratório Labogen, aquele atraves do qual o deputado Andre Vargas, do PT do Parana, em conluio com o Ministério da Saude do atual candidato ao governo de São Paulo pelo PT, Alexandre Padilha, tungava dinheiro de remédio de pobre.
A denuncia da Policia Federal publicada no Estadão de 6a passada não para aí. Tem mais um monte de gente e de falcatruas mencionadas, desde irmãos de ministros (o do Negromonte, das Cidades, aquela celebridade das nossas páginas policiais) carregando “malas de dinheiro” com Youssef para o exterior, até o próprio doleiro se fazendo “herdeiro” não testamentado do falecido Janene e embolsando o que ele tinha escondido para si em contas estrangeiras.
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João Vaccari Neto, recorde-se, não era um “ficha limpa” antes dessa denuncia. O Secretário Nacional de Finanças do partido da presidente da Republica candidata à reeleição é réu de ação criminal por "formação de quadrilha, estelionato e lavagem de dinheiro" relacionadas ao desvio de R$ 70 milhões da Cooperativa Habitacional dos Bancários que foi de onde ele saltou para onde está hoje. E a empresa citada de Youssef é a mesma que, de novo segundo a Polícia Federal, foi usada para lavar R$ 1,6 milhão do mensalão.
Nos filmes da mafia que a gente assistia antigamente a trama frequentemente acabava quando a policia pegava os livros dos tesoureiros do crime organizado mostrando quem dava dinheiro pra quem e, em cima dessa prova, a corja toda ia em cana.
Aqui nem assim...
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Ta aí em cima um pouquinho do que a PF já sabe sobe o Secretário Nacional de Finanças do PT. Já a “caderneta” de falcatruas de Paulo Roberto Costa, o  rapelador da Petrobras, onde constam, entre outros, todos os grandes doadores da campanha da ministra Gleisi Hoffman, da Casa Civil, também esta publicada ha meses na internet (examine-a, página por página, neste link) com todos os nomes, endreços e valores que ele andou distribuindo e lavando de e para deus e todo mundo, e não rola nada.
Agora, Graça Foster é flagrada passando seus bens pros filhos com registro em cartorio assim que se viu ameaçada de te-los bloqueados pela Justiça e a presidente da Republica, em plena campanha eleitoral, vem em seu socorro gritando indignada -- "Factoide!" -- e vai pra televisão pra dizer, em peças publicitárias pagas pelas próprias vítimas da mentiraiada, que está salvando a pátria e que a presidente da Petrobras, com seu marido de 42 contratos, 20 sem licitação, é uma das que mais a tem ajudado nisso.
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Como é que tudo isso se tornou possível? Porque a mentira se impõe ao Brasil tão implacavel e inexoravelmente?
Isso vem de longe como já se explicou em vários outros artigos aqui no Vespeiro. A Contrareforma, a Inquisição, o monopólio da educação jesuíta especializada em enquadrar qualquer fato à "explicação" pré-fabricada da única fé admitida por 400 anos, o absolutismo monárquico e a escravidão, tudo isso justificando a mentira como um imperativo de sobrevivência de quem podia ir pra fogueira acusado de ter pensado errado (não precisava agir) ou pro poste mesmo sem ser acusado de nada, fizeram-nos “sentir confortaveis demais dentro da mentira”, como dizia Octavio Paz.
Tudo isso preparou bem o caminho. Mas agora a coisa degringolou de vez. Se antes, pelo menos, todo mundo sabia que a mentira era mentira, agora nem isso mais.
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O que foi que mudou nessa última quadra da nossa via crucis, especialmente nesses últimos 12 anos?
Mudou especialmente a imprensa. Ela permitiu que à mentira por ação dos políticos, viesse se somar a mentira por omissão que tem sido a sua. E o vaso, que já andava repleto, transbordou.
Com a ocupação gramsciana das escolas pelo pensamento único dos inimigos da dúvida, da tolerância e da verdade, especialmente as de jornalismo (e não é por acaso que uma das cláusulas pétreas da “patrulha” é obrigar todo jornalista a passar por "escolas de jornalismo" controladas por eles pra ter a cebecinha feita do jeito que melhor lhes convém), uma nova “ética jornalística” que é a exata negação não só da ética jornalística sem aspas mas do próprio jornalismo foi martelada pra dentro das cabeças que hoje povoam as redações, especialmente as de certas chefias.
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Segundo essa norma, a imprensa se obriga apenas a reagir. Não se proibe apenas de pensar com a própria cabeça fora das páginas segregadas de opinião: proíbe-se até de reagir à mentira na hora que se depara com ela, não porque seja uma “questão de opinião” reagir a uma mentira separada da verdade frequentemente apenas por um par de minutos ou menos, mas porque a imprensa passou a não se colocar mais como uma interlocutora das suas “fontes”; obriga-se a ser apenas a amplificadora ou a divulgadora “neutra” de uma discussão de que ela não está autorizada a participar nem nos níveis mais elementares do exercício do raciocínio.
Essa imprensa esqueceu-se do porque dela estar formalmente mandatada, em toda democracia digna do nome, como o Quarto Poder, encarregado justamente de agir e reagir, em nome da cidadania, como ela própria ou qualquer outro ser humano normal reagiria ao tomar uma desaforada mentira em plena cara.
Não a imprensa brasileira! Exige-se hoje do reporter que haja como um mero gravador com pernas e do produto jornalístico como um todo que nunca afirme ou permita que alguém afirme uma verdade, por mais consagrada que ela seja, em seu canal, sem por ao seu lado um mentiroso para nega-la, ainda que se trate das mentiras mais antigas e solidamente identificadas pela História como tal. Os nossos jornais e televisões continuam proibindo-se de apontar mesmo as mentiras de mil anos franca e plenamente como mentiras.
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Assim, quando alguém mente na cara de um repórter brasileiro tudo que lhe resta fazer, ainda que seja honesto, é ficar esperando que o adversário do mentiroso, do outro partido ou o que seja, reaja ao vivo ou ligue pra redação e peça outro reporter pra acusar o cara de estar mentindo. Ou então chamar um “especialista” para por na boca dele o que ele gostaria de retrucar ao mentiroso, o que abre um enorme território para a falsificação e para a multiplicação da mentira pelo expediente de convocar o “especialista” que o jornalista desonesto (que os ha tantos quanto em qualquer outra profissão ao lado dos apenas desorientados e dos reprimidos) já sabe que irá corroborar a mentira para torná-la mais crível.
Ele mesmo, reporter, esta proibido de desmascarar a mentira na hora com uma pergunta, com a lembrança de um fato de ontem ou confrontando o mentiroso com suas próprias ações e declarações anteriores.
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Por exemplo, quando Dilma diz que a roubalheira na Petrobras é um “factóide” (eufemismo para “invenção desonesta da imprensa”) e que estão fritando a Graça Foster por pura perseguição ao PT, nem o reporter da própria televisão que descobriu os fatos retruca na hora para lembrar sua excelência, primeiro de que todas as denuncias contra a Petrobras vieram da polícia ou da própria Petrobras e não de alguem de fora, jornalista ou partido de oposição e, segundo, que o fato de Graça Foster ter distribuido seus bens para filhos e outros quando se viu ameaçada de te-los embargados pela Justiça está registrado no cartório "tal" com a data "tal" e não é invenção de ninguém.
Fica no ar, sozinha, a declaração da presidente e um pepino pro ouvinte. Restabelecer a verdade vira, para o distinto público, um daqueles joguinhos de milhares de pares de figurinhas embaralhadas num imenso painel de tempo, cabendo ao leitor e ao telespectador lembrar-se de onde está o par daquela carta falsa que prova que o que a presidente está dizendo está a milhares de quilometros da verdade.
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E ha mais. A imprensa não checa mais o que publica. Como as denuncias chegam na forma de filmes ou gravações que lhes são jogadas no colo, ela sente-se dispensada de outras formas de apuração. Pois não está todo mundo vendo ou ouvindo o ladrão em pleno ato? Contenta-se só com o pedaço de informação que recebe e não vai atrás da circunstância que pode esconder muito mais que o que queriam que ela mostrasse.
Ninguém vai atras do óbvio "Porque é que estão querendo que eu mostre isso"?, mesmo o repórter conhecendo pelo avesso e pelo direito as ligações partidárias e/ou as relações e intenções de quem o municiou.
A imprensa está virando um revólver que atira as balas com que lhe recheiam de fora o tambor, sem nenhum controle sobre o que publica e, principalmente, sobre o que deixa de publicar. Deixa-se docemente manipular.
Graças a isso tudo vira sempre a palavra de um contra a palavra de outro, sem ninguém que ajude o leitor ou o telespectador a desempatar isso confrontando fatos ou, partindo deles para desvendar as intenções por trás da divulgação de pedaços de fatos que é onde estão as verdades que mais interssa à cidadania conhecer.
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Repita-se isso à exaustão ao longo do tempo e você terá o que temos: não ha mais verdade nem mentira. O país está tão acostumado ao disse-que-disse que já nem mesmo candidatos em disputa ousam recorrer ao Youtube para desmentir as mentiras dos adversários com as declarações deles próprios que estão lá, colecionadas, pra quem quiser ver.
Isso explica por que a nossa democracia deixou de apenas balançar no nosso vício ancestral na mentira e passou a caminhar perigosamente em linha reta em direção à mesma lata de lixo onde estão as da Venezuela et caterva enquanto os mentirosos, na maior cara de pau, aparecem na TV posando como o contrário do que são em belas peças publicitárias pagas com o dinheiro dos próprios otários que elas pretendem enganar.
Agora que o PT já fala de peito aberto que se ganhar extingue de vez o jornalismo no Brasil, noto que está havendo um esforço para romper a censura que se esconde por trás dessa pseudo "ética" imposta às redações e alguns jornalistas honestos antes encurralados por ela, começam a poder reagir e fazer as perguntas que todo ouvinte ou leitor faria ao ter sua inteligência agredida por mentiras tão grosseiramente patentes que ouví-las calado transforma-se, ou numa confissão, ou numa ofensa.
a1Resta saber se já não é tarde demais.
Joseph Pulitzer, célebre jornalista americano do começo do século 20 que empresta seu nome ao maior prêmio de jornalismo que se concede naquele país, dizia que “Nossa Republica e sua imprensa vão se consolidar ou desaparecer juntas. O poder de moldar o futuro da democracia estará nas mãos dos jornalistas das próximas gerações”.
É isso mesmo.
O que aconteceu com o jornalismo brasileiro, da resistência à censura que matou uma ditadura até este que se auto impõe uma forma insidiosa dela velha demais para enganar quem quer que seja "do ramo", permite reciclar essa mesma ideia numa nova formulação. “É impossível matar mesmo uma democracia muito imperfeita se sua imprensa estiver minimamente sudavel. Assim, se uma democracia estiver dando sinais irreversíveis de que está caminhando para a morte é porque sua imprensa já tinha morrido antes dela”.
Esta eleição vai definir exatamente qual é o caso.

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