terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Nova manobra criativa - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo  - 07/01

Na undécima hora, quando faltavam menos de duas semanas para o fim do ano, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) resolveu adiar para 2015 a aplicação de bandeiras tarifárias nas contas de luz, medida que deveria entrar em vigor em 1.º de janeiro de 2014. Pelo sistema previsto, as contas passariam a exibir uma bandeira impressa em cor verde se os custos das distribuidoras de eletricidade fossem os normais (abaixo de R$ 200 por MWh), sem recurso à energia gerada por termoelétricas. A bandeira passaria a ser amarela toda vez que o custo de operação ficasse entre R$ 200 por MWh e R$ 350 por MWh e seria vermelha se superasse essa última marca. A explicação da agência reguladora é de que os consumidores não foram suficientemente informados e algumas distribuidoras não se prepararam no prazo previsto para implantação do sinal de alerta de aumento da conta de luz. O mercado não se deixou enganar por essa balela e interpretou a decisão como mais uma daquelas manobras que o governo tem utilizado para represar a inflação.

Na realidade, o governo teme que, se o sistema de bandeiras tarifárias fosse implantado já em janeiro, poderia contribuir para um repique inflacionário no início do ano, o que transmitiria uma imagem negativa para ele, com repercussões nos meses seguintes - quando as eleições estarão ainda próximas. Com os reservatórios de hidrelétricas em baixa neste verão em algumas regiões, notadamente no Nordeste, dá-se como certo que haverá um custo adicional para as distribuidoras. Se o sistema entrasse em vigor, levaria à impressão de bandeiras amarela ou vermelha nas contas, uma vez que um número maior de termoelétricas teria de ser ligado para suplementar a geração hidrelétrica, e as contas subiriam.

Há mesmo quem calcule que o governo fará tudo o que puder - e a suspensão das bandeiras é parte desse esforço - para evitar que a taxa de inflação medida pelo IPCA em janeiro de 2014 não supere 0,86%, taxa registrada no mesmo mês de 2013. O adiamento do uso de bandeiras possibilitaria um "alívio" calculado em 0,13%, o que seria de grande utilidade para evitar que a inflação de janeiro atinja 1%, o que seria considerado um desastre.

Como em toda medida relativa a preços administrados, há quem ganhe e quem perca. A Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) considerou a medida positiva. Em nota, afirmou que "o prazo estava muito apertado para as indústrias se adaptarem ao novo mecanismo de cobrança". A entidade lembrou que, em setembro, já havia alertado de que o sistema elevaria o custo de energia a "patamares preocupantes".

De outra parte, perdem as distribuidoras de eletricidade, que só conseguem repassar sua elevação de custos nas datas anuais de reajuste de tarifas. O sistema de bandeiras permitiria que repassassem imediatamente o eventual ônus com o uso maior de termoeletricidade. Com o novo mecanismo preconizado pela Aneel, e agora adiado, poderiam equilibrar mensalmente suas receitas com os custos mais pesados que teriam de arcar, como assinala a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee).

Isso, naturalmente, geraria uma nova disputa no campo energético, que caberia ao governo arbitrar, em meio a tantas desavenças que têm caracterizado a relação entre o setor elétrico e o Planalto. Não se pode deixar de lembrar, porém, que, sendo 2014 um ano eleitoral, não convêm aos interesses do PT e de partidos aliados que as contas de luz pagas pelos consumidores - não só os industriais e comerciais, mas principalmente os residenciais - subam demais, especialmente em regiões em que o recurso à energia termoelétrica é mais frequente, como o Nordeste - justamente onde o PT é mais forte.

A solução pode ser a concessão de subsídios às distribuidoras, à custa do Tesouro Nacional. Isso significa mais um elemento de pressão sobre a política fiscal. Ou seja, os custos adicionais das distribuidoras nesta época do ano acabarão sendo pagos por todos os contribuintes e não deixarão de influir a médio prazo sobre a inflação, que tem no desequilíbrio fiscal uma de suas causas básicas.

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