sexta-feira, 8 de novembro de 2013

A conta da gastança - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR


GAZETA DO POVO - PR - 07/11

Não é de todo impossível que a meta de superávit primário acabe mesmo cumprida, mas isso só serviria para mascarar o flerte com a irresponsabilidade fiscal


O secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, está se revelando um aplicado discípulo de Lula, Dilma Rousseff e Guido Mantega, que se especializaram, nesses mais de dez anos de petismo no poder, em sempre colocar nos outros (como Fernando Henrique Cardoso, os “brancos de olhos azuis” de Wall Street ou o semifalido Eike Batista) a responsabilidade pelas trapalhadas na condução da política econômica. Augustin diz que a política fiscal do país está sob “ataque especulativo”, e a culpa, logicamente, é da imprensa – que já “avacalhava a política”, como disse Lula recentemente, e agora, pelo jeito, também avacalha a economia, segundo Augustin.

No centro de toda a discussão está o superávit primário, a economia que o governo faz para pagar juros da dívida pública. A meta deste ano corresponde a 2,3% do PIB, ou quase R$ 121 bilhões (no início do ano, a meta era de 3,1% do PIB, mas acabou reduzida). Desse montante, R$ 73 bilhões são responsabilidade do governo central (Tesouro, INSS e Banco Central) e outros R$ 47,8 bilhões, de estados e municípios. Tanto Augustin quanto Mantega juram de pés juntos que o governo central fará sua parte; o ministro da Fazenda disse ontem que o problema está com os estados e municípios.

Vejamos: segundo informações do próprio Mantega, estados e municípios atingiram, até setembro, superávit primário de R$ 18 bilhões, ou 37,6% da meta. O governo central, no entanto, não conseguiu fazer muito melhor: nos primeiros nove meses do ano, garantiu R$ 28 bilhões, ou 38,3% da meta. Para comparar, o superávit primário de janeiro a setembro de 2013 é 49% menor que o valor registrado no mesmo período do ano passado. Como se não bastasse, as contas do governo central em setembro registraram déficit primário de R$ 10,5 bilhões – o pior resultado para o mês desde 1997, quando esse dado começou a ser medido. Em agosto, o mesmo indicador também já tinha sido o pior dos últimos 17 anos. A Secretaria do Tesouro Nacional alegou que o resultado fraco era culpa do adiantamento da primeira parcela do 13.º salário dos aposentados, mas a prática não começou neste ano: ela existe desde 2006.

O ministro Mantega e o secretário Augustin também são enfáticos ao dizer que não existe descontrole nos gastos públicos. Mas, como o editor de Economia da Gazeta do Povo, Franco Iacomini, mostrou na edição de ontem, a equipe econômica vem, sim, rasgando dinheiro, especialmente por meio dos aportes ao BNDES, que por sua vez despejou bilhões de reais em verdadeiras roubadas, sob o pretexto de criar “campeões nacionais”. São resultados que, em um país sério, já teriam custado a cabeça do presidente do banco, Luciano Coutinho. Mas, como se trata do Brasil sob o petismo, Coutinho já completou seis anos no cargo sem nem mesmo ser colocado contra a parede. Além disso, para guardar mais alguns trocados em seu esforço fiscal, Mantega já falou até mesmo em restringir os gastos com o seguro-desemprego, como se o problema da economia nacional fossem os desempregados.

Como o governo ainda deve receber um bom dinheiro pelo leilão do Campo de Libra, não é de todo impossível que a meta de superávit primário acabe mesmo cumprida, para alívio da equipe econômica. Tal resultado, no entanto, só serviria para mascarar o flerte com a irresponsabilidade fiscal, caminho certo para o desastre econômico e o descrédito internacional. Governos nesta encruzilhada têm quatro opções, três delas fatais: aumentar a carga tributária, emitir moeda e provocar inflação, ou endividar-se ainda mais. A população está cansada de impostos e de aumentos de preços, e o país está chegando ao limite de um endividamento saudável. Sobra a última opção, que é adotar uma política responsável de gastos públicos. Infelizmente, o retrospecto dos governos Lula e Dilma indica que justamente a melhor escolha é a menos provável.

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