Rodrigo Constantino - VEJA
Não é suficiente que homens honestos sejam apontados para juízes; todos conhecem a influência do interesse na mente do homem, e como inconscientemente seu julgamento é distorcido por essa influência. – Thomas Jefferson
O voto do ministro Celso de Mello, que acolheu os embargos infringentes, foi medíocre, burocrático. O ministro não se deu conta da gravidade do momento em que vivemos, não teve a grandeza de compreender o que estava realmente em jogo.
A longa primeira parte de seu discurso focou na importância do STF de não ceder ao clamor popular. Sem dúvida devemos lutar por um governo de leis claras e objetivas, protegidas da arbitrariedade de alguns homens. Mas não era isso que estava em pauta.
O julgamento do mensalão não foi um linchamento público, um caso de populismo que avançou os limites das leis. Ao contrário: foi o resgate tardio das leis após tentativa de golpe “bolivariano” na democracia.
Os tais embargos infringentes, de regimento interno exclusivo do STF, são polêmicos, sem dúvida. Mas recusá-los jamais poderia ser confundido com a troca do império das leis pela voz das ruas. Justo o oposto: usar essa brecha para postergar a justiça, talvez deixando prescrever crimes importantes, é matar o espírito da lei.
A sensação de impunidade é total, o que alimenta exatamente o desejo de cada um fazer justiça com as próprias mãos, por não confiar mais no sistema jurídico. É o império das leis que está em xeque!
Celso de Mello citou, ainda, a importância de um julgamento isento, imparcial, independente. Lewandowski e Toffoli agradecem a deferência! O que não tivemos foi justamente um “devido processo legal” isento de interesses e suspeitas. A despeito disso, os réus foram condenados.
A pizza foi servida pelo STF. Perdem todos aqueles que defendem a Grande Sociedade Aberta, como dizia Karl Popper. Vencem os mensaleiros, os marginais, os corruptos. É a pá de cal na nossa jovem e frágil democracia? É cedo para dizer, e espero que não. Mas foi um passo nessa direção, sem dúvida. Passo relevante.
Que o Brasil se mostre maior do que isso, do que os mensaleiros, do que o aparelhamento partidário preocupante no próprio STF. A Justiça não pode seguir o clamor cego das multidões, isso está claro.
Tampouco deve ignorar completamente o que a imensa maioria do povo entende como justo, após o “devido processo legal”, que deu todas as oportunidades de defesa aos acusados, incluindo ministros do STF agindo mais como advogados de defesa do que como ministros independentes.
O STF sai menor disso tudo. O ministro Celso de Mello sai bem menor. E o gigante, acordou mesmo? Pouco provável. Uma ala mais esclarecida da população está revoltada, claro. Mas tudo indica que o pacato cidadão seguirá com sua vida, reclamando dos vinte centavos do ônibus, mas ignorando a impunidade da maior tentativa de golpe já vista em nossa democracia.
Em tempo: vale notar que nossos vizinhos latino-americanos caíram nas garras “bolivarianas” mesmo quando a Corte Suprema se dobrou ao controle político-partidário. Que Deus tenha piedade de nós!
PS: Marco Aurélio Mello tem batido na tecla de que “o sistema não fecha” com tais embargos infringentes. De fato: se quatro votos contrários são “significativos” e suficientes para um novo julgamento, então cabe um novo julgamento sobre os próprios embargos infringentes, uma vez que foram cinco votos contrários a eles
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