quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Presidente do CADE, que investiga suspeita de cartel de trens e roubalheira em SP, omite ter sido chefe de gabinete do deputado do PT que denunciou o caso


Vinicius Carvalho, presidente do CADE, que investiga o caso dos trens e do metrô: escondendo que trabalhou para o deputado do PT que fez a denúncia (Foto: André Dusek / Agência Estado)
CHEFE DO CADE OMITE LIGAÇÃO COM DENUNCIANTE DE CARTEL DE TRENS
Presidente de órgão que investiga suspeitas envolvendo setor metroferroviário trabalhou para deputado que denunciou irregularidades – mas não incluiu informação em currículo
Por Andreza Matais e Fábio Fabrini, do jornal O Estado de S.Paulo
O presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Vinícius Marques de Carvalho, omitiu em ao menos quatro currículos oficiais ter trabalhado para o deputado estadual Simão Pedro (PT), responsável por representações que apontavam suspeitas de formação de cartel, superfaturamento e pagamento de propina envolvendo contratos do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
Documento da Assembleia Legislativa paulista registra a passagem de Carvalho pela chefia de gabinete de Simão Pedro entre 19 de março de 2003 e 29 de janeiro de 2004.
O vínculo não consta de nenhum currículo oficial apresentado por ele desde 2008, quando passou a ocupar cargos no CADE. A omissão ocorreu, inclusive, quando ele viabilizou sua indicação à presidência do CADE pelo Senado em 2012. “Foi provavelmente um lapso”, disse aoEstado o presidente do CADE.
O CADE, órgão que regula a concorrência empresarial no país, fechou em maio deste ano um acordo de leniência com a Siemens, empresa alemã detentora de uma série de contratos com o governo paulista nas últimas décadas. Nesse acordo de leniência – em que a empresa assume irregularidades para amenizar sanções futuras -, a Siemens confessou a existência do cartel e disse que ele atuou nas gestões tucanas no Estado entre os anos de 1998 e 2008.
Assim que o conteúdo do acordo veio à tona, em julho deste ano, integrantes do governo Geraldo Alckmin (PSDB) acusaram o órgão federal de vazar informações de forma seletiva motivado por questões políticas.
Simão Pedro, que hoje ocupa o cargo de secretário de Serviços da gestão Fernando Haddad (PT) na capital paulista, afirmou que se trata de uma “coincidência” o fato de o caso Siemens, denunciado inicialmente por seu gabinete, emergir no CADE após seu antigo assessor ter assumido a presidência do órgão.
Em um documento enviado ao Senado pela então ministra da Casa Civil Erenice Guerra, em 2010, por exemplo, Carvalho lista suas “atividades profissionais” de fevereiro de 2002 a janeiro de 2003 e, na sequência, as de fevereiro de 2005 a fevereiro de 2006.
Há um hiato justamente no período em que atuou para o deputado petista. Na ocasião, Carvalho já era conselheiro do CADE e estava sendo reconduzido ao cargo. O currículo é detalhado, com nove páginas, elenca oito “atividades profissionais”, mas silencia sobre a passagem pelo gabinete do deputado Simão Pedro.
Em 2012, a ministra Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, também encaminhou o currículo de Carvalho ao Senado. Ela apresentava seu nome para a presidência do CADE por quatro anos. A relação de “atividades profissionais” não mencionou, igualmente, sua passagem pela Assembleia Legislativa [e seu trabalho para o deputado petista].
Os senadores aprovam as indicações para cargos públicos com base em sabatina e no currículo que recebem da Casa Civil. A única menção ao trabalho na Assembleia consta de documento enviado ao Senado em 2008, na primeira indicação de Carvalho para o Conselho. Na ocasião, ele informou que foi chefe de gabinete na Assembleia, mas sem citar o deputado estadual petista.
Os dois históricos profissionais do site do CADE também omitem que Carvalho trabalhou para Simão Pedro.
O deputado apresentou verbalmente suspeitas de irregularidades nos contratos de trens ao Ministério Público paulista em 2010. A representação pedindo investigação foi protocolada meses depois, em fevereiro de 2011. Nela, o deputado mencionava carta de um ex-executivo da multinacional enviada à ombudsman da companhia, detalhando as irregularidades.
Em junho e dezembro de 2012 Simão Pedro fez mais denúncias ao Ministério Público apontando suspeitas na reforma de 96 trens das linhas 1 e 3 do Metrô, nas quais a Siemens atuou. Naquele mesmo ano, Carvalho assumia a presidência do CADE. “Esse negócio da Siemens entrou no radar do Cade em 2012. Até chegar ao acordo de leniência, levou um tempo”, disse o presidente do órgão.
‘Alento’
A autodelação foi oficializada, enfim, em maio deste ano, o que detonou o escândalo. Nas palavras de Simão Pedro, foi “alento”, já que as investigações não andavam no Ministério Público paulista. “Para minha sorte, (o caso) foi ao Cade. O Ministério Público sempre me disse que as provas que eu apresentei não eram suficientes para apresentar uma denúncia”, disse o deputado.
Após o acordo de leniência vir à tona, o Ministério Público reativou 45 ações civis e abriu uma ação criminal para apurar as licitações dos governos tucanos e as suspeitas de pagamento de propina a agentes públicos.
O deputado estadual nega ter mantido contato com Carvalho durante seu período no CADE. Já Carvalho diz não aceitar “acusação de politização da investigação do cartel”.
“Se a empresa vem ao CADE, como o órgão pode ser acusado de estar politizando?”, disse em 17 de agosto, numa reação às acusações dos integrantes do governo tucano segundo as quais o órgão estaria vazando informações de forma seletiva para atingir o PSDB.

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