As trapalhadas do governo federal no setor elétrico parecem não ter fim. Já virou praxe: pelo menos uma vez por mês os cardeais da área energética se reúnem para anunciar como pretendem consertar os danos surgidos das decisões anteriores. A última foi na semana passada.
Ao perceber que o uso permanente das usinas térmicas despejaria cinco bilhões de reais na conta de luz do consumidor, o governo abriu a caixa de costura e providenciou outro remendo. Sem ele, o desconto prometido na fatura vira fumaça, as distribuidoras ficam desestabilizadas e a inflação sobe.
De agora em diante, o custo das térmicas será rateado entre indústrias e agentes do mercado livre, além de geradoras, distribuidoras e consumidores. A parte dos consumidores será quitada pelo governo com recursos -- pasmem -- desviados da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo administrado pela Eletrobrás para custear o programa Luz para Todos.
A bondade com a luz alheia vem justo no instante em que a Aneel admite que um milhão de residências continuam nas trevas e que a promessa de iluminar a vida de todas as famílias brasileiras até 2014 foi para boi dormir. Mais uma vez o governo dá com uma mão e retira com a outra.
Trocando em miúdos, o planejamento falha, os empreendimentos atrasam, a energia emergencial das térmicas vira permanente e o governo tenta ocultar as consequências das besteiras que fez à custa de quem ainda vive no escuro. Ou isso, ou inflação e conta mais cara para os que têm luz.
Foto: Damien Meyer / AFP
Desde o início do debate sobre a MP 579 insistimos que utilizar o setor elétrico para estimular a competitividade do parque produtivo sem oferecer contrapartidas tributárias era temerário. Eis o resultado: as empresas perderam valor de mercado, capacidade de investimento e agora estimulam demissões voluntárias.
Alertamos que a incompetência no planejamento e na gestão das obras, somados à baixa dos reservatórios, deixava o governo entre o risco de apagão e o aumento de tarifas pelo uso de térmicas, o que jogaria por terra a redução das contas de luz anunciada na TV -- aliás, redução saudada por todos nós, mas feita com evidente propósito eleitoral.
Agora o improviso se volta ao mercado livre, desfalca receitas do Luz para Todos, pega uma fatia dos dividendos de Itaipu e, se não for o bastante, por que não atacar de madrugada a geladeira do Tesouro Nacional?
Se estendermos a análise para o setor energético como um todo, a coisa fica pior: Petrobras no vermelho, enormes prejuízos com a importação de gasolina, retração e desnacionalização da indústria do Etanol, paralisia do setor minerário etc.
Mesmo desnorteados e perdidos, nada altera a falta de rumo. As trapalhadas vão se acumulando, os investidores ficam cada vez mais desconfiados e a atividade econômica segue a patinar. Mas não se enganem: em breve outro anúncio genial vem aí para tentar consertar o que acabaram de fazer.
José Aníbal é economista, deputado federal licenciado (PSDB-SP) e secretário de Energia de São Paulo.
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