segunda-feira, 2 de julho de 2012

Futebol e paixão clubística


JORNALISMO ESPORTIVO


Por Silvia Chiabai em 26/06/2012 na edição 700
A discussão sobre objetividade/neutralidade no jornalismo é uma das mais fecundas da profissão, tendo originado teses e livros ao longo de sua história. No âmbito do esporte, sítio de paixões mais exacerbadas, a questão é tão mais instigante que coloca o profissional do jornalismo diante de uma questão mais delicada: assumir ou não publicamente o time pelo qual torce? Na mídia esportiva existem três posicionamentos quanto a esta questão: os que acham que revelar sua preferência é professar transparência (e objetividade); os que a assumem com discrição; e os que não revelam para quem torcem por temer acusações de parcialidade. A revista VIP divulgou, há cerca de dois meses, os supostos “times do coração” de alguns dos jornalistas mais populares do meio esportivo. Com muitos erros, é verdade. Paulo Calçade e Alberto Helena Jr, por exemplo, foram classificados como torcedores respectivamente de Corinthians e São Paulo, quando são assumidamente palmeirenses (o primeiro do tipo discreto, o segundo do tipo transparente).
Nos momentos críticos, de ânimos exaltados, é que se pode constatar que a objetividade, tão rara no jornalismo político, é completamente impraticável no jornalismo esportivo. Tomemos, por exemplo, as fases finais da Libertadores, que teve o Corinthians, (clube que é o maior rival de São Paulo, Santos e Palmeiras, e o clube de maior rejeição das demais torcidas do Brasil, segundo pesquisa do Lance) como protagonista. Foi uma fase em que o anti-conrinthianismo alastrou-se feito praga na lavoura.
Torcedores disfarçados em comentaristas
Claro, sempre existiram os anti-corinthianos de carteirinha, como o Mauro César Pereira, da ESPN (que já disse no ar que comeu churrasco quando o Corinthians caiu para a segunda divisão), e intitulou seu blog quando o time conseguiu a façanha de passar para a fase final: “Corinthians chega onde chegou o São Caetano”. Como se sabe, o São Caetano foi eliminado pelo Olímpia na final. Pereira também bombardeou o tira-teima da Globo que provou o impedimento do gol do Vasco na primeira quarta de final. Ele, segundo a VIP, é flamenguista. Mas, antes de tudo, é anti-corinthiano, como um tal de Paulinho, que tem um blog devotado a detonar o Coringão. Ele postou certa vez que Mário Gobbi tinha bancado o bobão numa reunião da FPF. Internautas lhe enviaram uma nota publicada no mesmo dia na coluna em off do caderno de esportes da Jornal da Tarde, dando conta que Gobbi, ao contrário, havia sido até bajulado pelos demais presidentes de clubes na tal reunião. Ele não só mentiu, como censurou as mensagens dos internautas. E ainda reivindica “jornalismo com credibilidade”. É um site mentiroso e hipócrita. Não está incrustado na UOL (que, tal como a Folha, até os balconistas de farmácia comentam que é visceralmente anticorintiano), mas é recomendado pelo José Cruz e pelo Birner, blogueiros do UOL).
O são-paulino Birner banca o imparcial, mas preconizou que o Corínthians ia amarelar contra o Santos. O palmeirense Perrone também anti-corinthianizou ao bater na tecla do “time medíocre” (fez uns três ou quatro posts sobre o furo do Rosemberg ,durantes as quartas ) e no dia da semi-final intitulou um post-torcida: “Santos confiante e Corinthians com medo que Neymar engane juiz”. Renato Maurício Prado sempre foi um anti-corinthiano disfarçado, a ponto de um dos leitores de sua coluna reclamar que ele é mais crítico com o Corínthians que com os rivais de seu Flamengo, no Rio. Aliás, bastou seu time do coração ser eliminado daquela maneira judiada para ele começar a elogiar o Santos de modo desmesurado. Razão pela qual compreende-se porque agora ele chamou as semi-finais de “peladas”, já que não gostou do desempenho de Neymar e Ganso. “Nada contra o Corinthians” – ele escreveu em seu blog. Como não? Então o time que chega à semi-final invicto com um golaço de Sheik não merece uma linha? O fato de RMP ter faltado ao “Bem Amigos” com Tite sem uma explicação convincente foi muito sintomático.
Paulo Vinícius Coelho foi outro que se deixou levar pela paixão clubística. O sucesso do Palmeiras na Copa do Brasil acirrou ainda mais a rivalidade, já manifesta nos comentários durante o ano passado ao longo do Campeonato Brasileiro, quando em nenhum momento ele colocou o Corinthians como favorito. Era sempre o Fluminense ou o Vasco. Ao final do jogo contra o Santos, sem saber ainda se o vencedor enfrentaria Boca ou La U, ele postou que o Corinthians precisava melhorar. Como assim? Não teve a melhor campanha? Não foi melhor que todos? A impressão que se tem é que um leitor que busque uma análise lúcida das reais possibilidades e limitações de seu time vai encontrar torcedores disfarçados em comentaristas especializados.
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[Silvia Chiabai é jornalista]

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