Filho do homem mais rico do Brasil tentou comandar, pelo Twitter, um inquérito policial sobre a morte do ciclista pobre, o apresentador Luciano Huck inocentou o bilionário antes de ter elementos para julgar; Eike Batista, por sua vez, lamentou a perda do brinquedinho; e agora?
Raras vezes se viu no Brasil uma tentativa tão explícita de calar, pela força do dinheiro, uma investigação policial.
O caso era uma autêntica fábula brasileira, que expunha nossas mazelas e fraturas sociais.
No dia 18 de março deste ano, Thor Batista, filho do homem mais rico do Brasil, Eike Batista, atropelou em sua Mclaren um rapaz negro, Wanderson Silva, que conduzia uma bicicleta, num país onde crimes de trânsito raramente são punidos. Rapidamente, Eike e Thor passaram a bombardear internautas com mensagens no Twitter.
Em 63 mensagens sequenciais, Thor deu sua versão para o acidente. Numa delas, disse que "vinha na faixa da esquerda, com muito cuidado, sem ao menos dialogar com meu carona quando repentinamente um ciclista atravessou...".
Em outra, assegurou que "a frenagem trouxe o carro de 100km/h até 90 km/h".
Eike, por sua vez, deu força ao filhão dizendo que era a quinta vez apenas que ele dirigia a Mclaren, xodó da família. E contratou o advogado mais caro do País, Marcio Thomaz Bastos, para defender o pupilo. "Só contrato o melhor", disse Eike à época.
Em diversos veículos de comunicação, também se exerceu uma pressão imensa para que o caso não fosse analisado pela ótica da luta de classes – afinal, ricos não podem ser punidos simplesmente porque são ricos.
A cereja do bolo foi o tweet publicado pelo "bom-moço" Luciano Huck, que enriquece às custas de "Wandersons" e, assim, frequenta as rodas de "Thors" e "Eikes". "Fatalidade. Prestou socorro e não tinha bebido", tuitou Huck no dia do acidente, antes de ter qualquer elemento para julgar.
Pois bem: todos acabam de ser desmoralizados pela perícia oficial realizada pela polícia do Rio de Janeiro. Uma polícia que, diga-se de passagem, conseguiu realizar um trabalho independente apesar de todas as suspeitas que recaiam sobre seu trabalho, em razão da propalada influência de Eike Batista no governo do Rio de Janeiro.
Sabe-se agora que Thor dirigia a pelo menos 135 km/h, acima do limite de 110 km/h, e vinha realizando ultrapassagens em ziguezague segundo o depoimento de testemunhas.
Em sua defesa, o filho do bilionário pretende apresentar uma perícia privada – mas, em países sérios, o que vale é a investigação oficial, não aquela paga por quem tem interesse em se livrar de suas responsabilidades.
Thor mentiu. Luciano Huck foi falastrão. E Eike se comportou como um pai que não sabe impor limites aos filhos.
Aliás, recomenda-se que Thor feche urgentemente seu Twitter. Num post, revelou um encontro com o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Hereda, que estuda realizar um aporte bilionário numa empresa de Eike Batista em má situação financeira, a LLX.
Em outro, Thor fez uma brincadeira pueril. Disse que o cruzamento de um quero-quero com um pica-pau resulta em que quero-pica-quero-pau.
Thor, que acaba de ser desmascarado pela perícia realizada pela polícia do Rio, foi indiciado por homicídio culposo.
Dias atrás, ele teve outro brinquedinho apreendido: a Ferrari que conduzia sem placa nas ruas do Rio de Janeiro.
Quantos "Wandersons" serão necessários até o Brasil aprenda a efetivamente tratar crimes de trânsito, que matam milhares de pessoas no País, como crimes, e não como fatalidades inocentadas por Luciano Huck?
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