Enquanto os deputados se recusam a votar a lei que pune o trabalho escravo, novos casos de abuso se repetem no País. O último envolve a rede Gregory de moda feminina
Natália MartinoFLAGRA
Fiscais fecham uma das oficinas terceirizadas da
Gregory: situação de trabalho degradante
Na semana passada, a Câmara dos Deputados mostrou que sua sintonia com a sociedade não está bem afinada. Pela segunda vez em menos de 15 dias, parlamentares de todas as matizes políticas adiaram a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 438, já aprovada pelo Senado. Trata-se da lei que prevê a expropriação de imóveis rurais e urbanos, cujos donos sejam flagrados usando trabalho escravo. Para procurar justificar os seguidos adiamentos, líderes de vários partidos dizem que a dificuldade está em definir o que é trabalho escravo. Um discurso que não encontra respaldo na realidade. O Ministério do Trabalho e Emprego tem regras muito claras que determinam como deve ser a relação entre empregadores e empregados. Ao fugirem do tema, os deputados parecem ignorar que, em pleno século XXI, ainda existe no Brasil situação de escravidão. E não são apenas casos isolados nos rincões do País. As fiscalizações do Ministério têm encontrado esse tipo de prática em grandes centros urbanos e a serviço de fortes grupos econômicos. Este mês, os fiscais encontraram 12 trabalhadores submetidos a condições semelhantes às da escravidão em São Paulo e em Itaquaquecetuba, no interior paulista. São bolivianos que produziam peças para a marca de roupas femininas Gregory, presente nos principais shopping centers do País.
GRIFE
Roupas da rede feminina espalhadas pelo barracão: R$ 3 por peça
De acordo com o relatório da fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em São Paulo (SRTE-SP), os 12 trabalhadores bolivianos eram mantidos em condições precárias de segurança e saúde, com ausência de pagamento justo e cerceamento de liberdade. Sem a aprovação da PEC, os responsáveis por casos como esse estão sujeitos ao pagamento de verbas trabalhistas e indenizações. Na esfera criminal, a pena é de dois a oito anos de prisão, o que em geral é substituído por doação de cesta básica ou prestação de serviço comunitário. A fiscalização que flagrou a Gregory se deparou, em barracões precários, com situações como a de uma imigrante amamentando seu filho de um mês e meio enquanto trabalhava. Em uma das oficinas, o armário de alimentos ficava trancado. Em outra, os trabalhadores precisavam de autorização para sair, que nem sempre era concedida. Em todos os casos, iluminação precária, cadeiras improvisadas e jornadas de trabalho de 12 horas.
De acordo com Andrea Duca, diretora de marketing da rede fundada em 1981, que possui 80 lojas em 21 Estados brasileiros, a empresa não tinha conhecimento prévio sobre a situação e não possui o controle sobre o que acontece dentro das oficinas dos seus fornecedores, que são terceirizadas. “A fiscalização fez uma associação indevida do nosso nome ao problema”, afirma. O relatório, porém, é incisivo ao afirmar que a empresa “é inteiramente responsável pela situação encontrada”. De acordo com o documento, as notas fiscais das oficinas eram emitidas em nome de um CNPJ artificial como estratégia para eximir a Gregory de responsabilidades pela forma como a produção era conduzida. Essa não é a primeira vez que a grife se vê envolvida em denúncias. Em 2011, durante investigação que flagrou trabalho escravo a serviço da Zara, também foram encontradas etiquetas da Gregory nas oficinas fechadas pela fiscalização.
De acordo com Andrea Duca, diretora de marketing da rede fundada em 1981, que possui 80 lojas em 21 Estados brasileiros, a empresa não tinha conhecimento prévio sobre a situação e não possui o controle sobre o que acontece dentro das oficinas dos seus fornecedores, que são terceirizadas. “A fiscalização fez uma associação indevida do nosso nome ao problema”, afirma. O relatório, porém, é incisivo ao afirmar que a empresa “é inteiramente responsável pela situação encontrada”. De acordo com o documento, as notas fiscais das oficinas eram emitidas em nome de um CNPJ artificial como estratégia para eximir a Gregory de responsabilidades pela forma como a produção era conduzida. Essa não é a primeira vez que a grife se vê envolvida em denúncias. Em 2011, durante investigação que flagrou trabalho escravo a serviço da Zara, também foram encontradas etiquetas da Gregory nas oficinas fechadas pela fiscalização.
AÇÃO
Artistas e líderes de movimentos sociais entregam manifesto
em Brasília a favor da PEC do trabalho escravo
“A empresa define o que vai ser produzido e o preço que vai pagar: apenas R$ 3 por peça, a ser dividido entre os donos das oficinas e os trabalhadores. É ela que efetivamente lucra com a exploração, não os intermediários”, diz Luis Alexandre de Faria, auditor da SRTE-SP. Os fiscais agora aguardam que a Gregory assine um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para regularizar o trabalho dos seus fornecedores. A rede assegura que resolverá o problema com o fim das compras de material de fornecedores que terceirizam o trabalho.
Os trabalhadores resgatados já receberam as verbas trabalhistas devidas, quase R$ 55 mil, mas ainda resta a incerteza sobre o futuro. “O Brasil tem que avançar muito no pós-resgate. Se a situação de vulnerabilidade não acaba, o trabalhador é aliciado de novo”, diz Luiz Machado, coordenador do projeto de combate ao trabalho forçado no Brasil da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Temos que lembrar que o fato de a vida dessas pessoas ser precária não é argumento para que o trabalho seja uma continuidade dessa condição”, afirma Leonardo Sakamoto, coordenador-geral da Repórter Brasil, ONG que atua no combate ao trabalho escravo.
Das áreas rurais, onde as denúncias costumam envolver tortura física e falta de acesso a água potável, vem as maiores críticas em relação à PEC. O adiamento da votação é encabeçado pela bancada ruralista no Legislativo. De acordo com o deputado Moreira Mendes (PSD- RO), um dos integrantes dessa bancada, falta uma definição do que é escravidão. “As denúncias costumam ser um exagero absoluto”, afirma o deputado. Atualmente, os fiscais seguem as normas do Ministério do Trabalho e Emprego e o artigo 149 do Código Penal, que criminaliza o cerceamento de liberdade, trabalho degradante e as jornadas exaustivas. “Trabalho escravo é aquele que coisifica a pessoa e tira dela a dignidade. Não é irregularidade trabalhista, é afronta aos direitos humanos”, diz Luiz Camargo, procurador-geral do trabalho. Foram esses argumentos que tomaram conta da Câmara dos Deputados no dia 8 de maio, quando a PEC deveria ser votada. A data havia sido escolhida por se tratar da semana de 13 de maio, data em que a Lei Áurea foi assinada há mais de um século. A PEC seria uma nova abolição da escravatura no Brasil. Mas não foi desta vez. Agora os deputados afirmam que voltarão a falar sobre o assunto na terça-feira 22.
Os trabalhadores resgatados já receberam as verbas trabalhistas devidas, quase R$ 55 mil, mas ainda resta a incerteza sobre o futuro. “O Brasil tem que avançar muito no pós-resgate. Se a situação de vulnerabilidade não acaba, o trabalhador é aliciado de novo”, diz Luiz Machado, coordenador do projeto de combate ao trabalho forçado no Brasil da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Temos que lembrar que o fato de a vida dessas pessoas ser precária não é argumento para que o trabalho seja uma continuidade dessa condição”, afirma Leonardo Sakamoto, coordenador-geral da Repórter Brasil, ONG que atua no combate ao trabalho escravo.
Das áreas rurais, onde as denúncias costumam envolver tortura física e falta de acesso a água potável, vem as maiores críticas em relação à PEC. O adiamento da votação é encabeçado pela bancada ruralista no Legislativo. De acordo com o deputado Moreira Mendes (PSD- RO), um dos integrantes dessa bancada, falta uma definição do que é escravidão. “As denúncias costumam ser um exagero absoluto”, afirma o deputado. Atualmente, os fiscais seguem as normas do Ministério do Trabalho e Emprego e o artigo 149 do Código Penal, que criminaliza o cerceamento de liberdade, trabalho degradante e as jornadas exaustivas. “Trabalho escravo é aquele que coisifica a pessoa e tira dela a dignidade. Não é irregularidade trabalhista, é afronta aos direitos humanos”, diz Luiz Camargo, procurador-geral do trabalho. Foram esses argumentos que tomaram conta da Câmara dos Deputados no dia 8 de maio, quando a PEC deveria ser votada. A data havia sido escolhida por se tratar da semana de 13 de maio, data em que a Lei Áurea foi assinada há mais de um século. A PEC seria uma nova abolição da escravatura no Brasil. Mas não foi desta vez. Agora os deputados afirmam que voltarão a falar sobre o assunto na terça-feira 22.
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