domingo, 12 de fevereiro de 2012

O empatador de filas


Fonte: Eloi Zanetti - Revista Amanhã



Os empatadores parecem se multiplicar às centenas e têm o dom da onipresença. Ora travam os balcões de check-in, ora as caixas em mercados, bilheterias de cinemas e teatro e, pasmem, atravancam até as escadas rolantes


Irritante, mesmo, é o empatador de filas. Aquele cara que, para nosso desgosto, encontra sempre uma maneira de se postar três ou quatro pessoas a nossa frente. Ele é tão chato que jamais se posta depois de nós. Sempre dá um jeito de chegar antes – só para nos irritar.

fila-350Há dias, numa fila de padaria, lá estava ele: um jovem senhor com duas crianças. Pelo comportamento, tratava-se de um recém-divorciado que procurava fazer boa figura com os filhos nos momentos da guarda compartilhada. Tal qual o pai, as crianças eram chatérrimas. O garoto vestia uma capinha de super-herói e se deslocava com má educação por entre as pessoas. Olhava os balcões e, na ansiedade de guri mimado, não se decidia sobre o que comprar. O pai se apoderou do balcão e hesitava sobre suas escolhas. A fila parou. Como as atendentes ficaram esperando as pessoas se manifestarem e o empatador ocupava o lugar dos pedidos, solicitei às duas mulheres que estavam à minha frente que se deslocassem e passassem à frente do chato, o que elas fizeram com receio. A fila andou um pouco. Tempos depois, ele voltou à posição inicial e ocupou, por direito de preferência, o seu lugar na fila. Oh, céus! Oh, dia! A fila, que já andava vagarosa, parou de novo. Tremi:  vai dar algum “pau” no sistema, o cartão dele não vai funcionar ou faltará troco. Que nada. Bem na hora do pagamento, ele se lembrou que tinha se esquecido de pedir leite de saquinho. E lá foi a moça buscar leite de saquinho para a figura. E o nosso tempo precioso se esvaindo por causa de um mal-educado egoísta.

Os empatadores parecem se multiplicar às centenas e têm o dom da onipresença. Ora travam os balcões de check-in, ora as caixas em mercados, bilheterias de cinemas e teatro e, pasmem, atravancam até as escadas rolantes.

A primeira escada rolante que vi foi na década de 1950. Até hoje, o brasileiro não aprendeu a usá-la. Nessas escadas, os empatadores se organizam em duplas ou em grupos. Em vez de se postarem à direita e deixar a esquerda livre para quem tem pressa, ficam aglomerados como galinhas acuadas. Não sei por que os namorados gostam de ficar se abraçando nas escadas rolantes. Quem quer ir mais depressa tem de empurrar. Na França, passam por cima e te jogam no chão. Eles sabem como tratar os empatadores: na base do empurrão.

Existem os que adoram conversar no momento de se servirem nos restaurantes a quilo. Em vez de bater papo na mesa, conversam na fila, pegam uma coisa, conversam, pegam outra, reiniciam a conversa e o mundo que se lixe em volta deles. E há aqueles que param na bomba de gasolina, abandonam o carro e acham que o local é estacionamento privativo 24 horas. Quem quiser abastecer que espere ou vá procurar outro posto. Eu vou para outro posto.

Aliás, faça-se justiça: existem também os caixas empatadores. São os funcionários mal preparados que demoram séculos para atender. Muitos são induzidos ao mau atendimento pela falta de apoio da gerência ou dos sistemas da empresa que, em vez de ajudar, atrapalham. São tantas as manobras de digitação que o que era para facilitar e induzir à rapidez só faz demorar. Já reparou quando um funcionário de check-in de aeroporto digita?

Há o especialista em travar filas de pedágio. É aquele que para o carro, destrava o cinto de segurança para pegar a carteira e a abre com toda a calma do mundo. Normalmente, tira uma nota de alto valor e, depois de receber o troco, arruma as notas dobrando-as demoradamente. Para completar, pensa alguns minutos antes de engatar a marcha. Ah, claro, e há também o empatador de fila de cinema, que chega com a família e só discute qual será o filme escolhido na hora de comprar os bilhetes. Ora, esse assunto já deveria ser resolvido antes e, para comprar bilhetes, que vá uma só pessoa, não um grupo inteiro.

É de se perguntar: de que adiantam os caros e complexos sistemas informatizados para transações eletrônicas? Para que serve todo esse avanço se os “sistemas mentais” dos empatadores de fila são tão primários?

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