quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Aquisição de imóveis vs. Aplicações financeiras


As discussões envolvendo as vantagens e desvantagens de se adquirir imóveis ou aplicar recursos no mercado financeiro sempre ocuparam um lugar de destaque nas diferentes fases da economia brasileira.  No início dos anos sessenta, os imóveis eram uma alternativa à quase ausência de produtos financeiros, num quadro de inflação elevada e ausência de indexação;  nos anos oitenta, a situação praticamente se repetiu, dado que a aceleração da inflação impunha perdas reais às aplicações financeiras, mesmo na presença de indexadores, mas que eram defasados no tempo; mais recentemente, o tema voltou ao debate em função do forte aquecimento do mercado imobiliário, com conseqüente aumento do preço real dos imóveis.

Inicialmente, é preciso destacar que qualquer análise envolvendo alocação de recursos deve ser precedida de uma questão: o que quer o investidor?  A discussão aqui proposta não é diferente.  O interesse do proprietário dos recursos vai estar sempre associado ao “peso” que ele atribui a cada uma das variáveis do tripé risco, retorno e liquidez.  Esse “peso” depende de fatores culturais, da idade, da atividade do investidor e até mesmo das transformações que a economia vem sofrendo ao longo dos anos.  E mais, as características dos investidores são mutáveis ao longo do tempo.

O objetivo deste artigo é oferecer ao investidor um conjunto de observações que lhe permita efetuar uma reflexão mais consciente a respeito da melhor decisão a ser tomada.  Na realidade, a interface entre aplicações financeiras e aquisições de imóveis pode ser analisada, pelo menos, sob quatro aspectos distintos: a) as diferentes características dos dois ativos em termos de risco, retorno e liquidez;  b) a complementação entre ambos na medida em que as aplicações financeiras podem ser o caminho para se acumular recursos para uma futura aquisição imobiliária;  c) o retorno gerado pelas aplicações financeiras, vis-à-vis o aluguel (retorno propiciado pelo imóvel); e d) a possibilidade de se “lucrar” com a compra e venda de imóveis.

No que se refere ao primeiro aspecto, pode-se destacar os seguintes pontos:

a) É evidente que as aplicações financeiras tem liquidez muito maior que os imóveis.

b) Ainda em relação ao item liquidez, vale observar que as transformações que vem ocorrendo no país certamente alteraram o “peso” dessa variável nas decisões de alocação de recursos; de um lado, a competição crescente na economia brasileira faz com que o tempo de permanência na mesma empresa seja cada vez menor, principalmente para os executivos; ao mesmo tempo, com o “inchamento” das grandes cidades, os custos de locomoção vão ficando cada vez mais altos, aumentando a importância de se “morar perto do emprego”; ocorre, porém, que é muito mais fácil encontrar um imóvel perto do emprego do que um emprego perto do imóvel.

c) Embora muitos investidores esqueçam de considerar alguns aspectos de risco associados ao imóvel (mudanças nas leis de zoneamento, alterações no entorno do imóvel adquirido, e assim por diante); como regra geral, muitos aplicadores vêem nos imóveis uma forma de proteção de seu patrimônio contra situação adversas, como aceleração da inflação, prática de juros reais negativos, risco de falência de instituições financeiras, etc.; realmente como forma de se proteger dessas adversidades,  o  imóvel  é visto como uma “aplicação mais segura”.

d) Em relação ao retorno desses ativos, a questão é controversa e será objeto de avaliação adiante.

Quanto à complementariedade entre as duas aplicações, é fato conhecido que a sociedade brasileira, em sua grande parte, ainda enfatiza a importância “de se ter um imóvel próprio”. Assim as aplicações financeiras podem viabilizar a formação da poupança necessária para a aquisição ou mesmo a entrada para a compra de um imóvel.  Nesse caso, é fundamental um adequado planejamento em relação a algumas variáveis: o valor do imóvel a ser adquirido futuramente; o período em que a aquisição vai ser efetuada; o valor dos recursos mensais (poupança) que vão “alimentar” o fundo; a escolha do melhor tipo de aplicação financeira que atenda às necessidades do planejamento.

Outro aspecto relacionado ao tema refere-se ao retorno gerado pelos dois ativos, isto quando se pretende adquirir um imóvel para fins de rendimento (aluguel).  Embora uma análise mais completa das duas alternativas devesse envolver considerações acerca da evolução do preço dos imóveis (dado que os aluguéis tendem a representar um percentual do mesmo), nesse momento admitir-se-á que o imóvel mantenha seu valor real ([1]).  Isto posto, pode-se destacar:

a) A comparação relevante ocorre entre o rendimento líquido real de cada tipo de ativo; no caso das aplicações é o juro real líquido, livre de comissões e imposto de renda, que é recolhido exclusivamente na fonte;  já no caso do aluguel, para se chegar ao rendimento líquido real é preciso deduzir as despesas de administração (caso haja) e o imposto de renda.

b) Particularmente em relação ao imposto de renda incidente sobre o aluguel, muitos investidores esquecem de deduzi-lo para se chegar ao valor líquido, porque o mesmo nem sempre é exclusivo na fonte; normalmente, recolhe-se o “carnê-leão”, e depois o ajuste final é feito na declaração anual;  nesse caso, o imposto de renda pode atingir “na margem” 27,5% dependendo das demais fontes de renda do investidor.

c) Não se pode deixar de considerar também que nem sempre o imóvel fica alugado doze meses por ano; pode haver períodos de desocupação por ocasião da troca de inquilinos; e nesse período de transição, além de não haver receita (aluguel), surgirão despesas como IPTU, condomínio, manutenção e muitas vezes até gastos com reformas.

d) Não se pode deixar de avaliar também o risco de inadimplência, embora a atual lei do inquilinato tornou-se mais favorável ao proprietário e à retomada do imóvel por falta de pagamento.

A discussão pode envolver também a questão da perspectiva de “lucro” na compra e venda de imóveis.  No que se refere a este aspecto, cabe destacar:

a) O “lucro” obtido efetivamente com as transações imobiliárias não é simplesmente a comparação entre o preço de venda e o preço de aquisição do imóvel, como frequentemente se ouve.

b) O valor do dinheiro sofre alterações no tempo em função da inflação que corrói sua capacidade de compra; além disso, o dinheiro tem um custo de oportunidade, na medida em que ao imobilizar seus recursos na aquisição de um imóvel, o investidor está deixando de ganhar os rendimentos que esse capital poderia gerar caso estivesse numa aplicação financeira; esses fatores precisam ser levados em conta para o cálculo adequado do “lucro”.

c) O Brasil é um país caracterizado pelo elevado custo das transações imobiliárias; no momento da aquisição, há despesas de escritura, e a venda normalmente é feita através de uma corretora de imóveis, que cobra um percentual do valor da transação; e, dependendo das condições do investidor, este pode arcar com um imposto sobre lucro imobiliário de 15% sobre o ganho nominal;  esses fatores frequentemente são ignorados no cálculo do “lucro”.

d) Muitas pessoas acham que todos os imóveis acompanham o preço do metro quadrado dos novos lançamentos; isto não necessariamente ocorre porque os imóveis também sofrem depreciação, derivada não somente de seu uso, como também pelo surgimento de “inovações” nos imóveis mais recentes, que vão incorporando novos hábitos da sociedade; com isso, os mais antigos vão ficando  “desatualizados”.

Por fim, cabe destacar que não se está afirmando aqui que não seja possível obter lucros financeiros na compra e venda  de  imóveis. Em períodos de crescimento mais acelerado dos preços isto pode ocorrer.  Mas para se ter certeza de que o lucro esteja realmente ocorrendo, é preciso fazer a conta de forma correta.

Por Antônio Lanzana

Fonte: Apogeo Investimentos

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