Nesta semana eu atendi um empresário que estava vivendo um grande problema. Raul é o seu nome. Ele tem um camping no interior de São Paulo. Não é um camping normal. Pelo que vi, é uma verdadeira cidade, 5 hectares com cachoeiras, rios, lagos, vários espaços para barracas, trailers e casas para alugar, três restaurantes e cinco lanchonetes, espaços para esportes e entretenimento. Um grande empreendimento que fatura R$ 3,5 milhões por ano, fruto dos esforços de Raul ao longo de 25 anos. Agora ele está se aposentando e pretende deixar o negócio para os filhos. Correção: pretendia.
Seus três filhos não estão preparados para assumir o negócio. Hoje ele vê isso e se arrepende de não ter planejado melhor a carreira deles. Não é só uma questão de formação. Segundo ele, o mais velho, Adolfo, já construiu uma carreira como médico e não quer assumir o negócio. A filha do meio é a arquiteta Renata e foi a que mais se envolveu. Começou a trabalhar com o pai há 3 anos e adora o negócio. O caçula Júnior não se formou ainda, e ninguém na família acredita que ele vai servir para qualquer coisa nesta vida. Para Raul, Júnior acha que não precisa estudar nem trabalhar, pode viver só do que o camping vai lhe proporcionar.
Como se não bastasse, Raul disse que o gerente-geral, Pinheiro, seu braço direito, fiel escudeiro com mais de 20 anos de dedicação ao camping, está confiante de que a saída de Raul representa a oportunidade para ele se tornar o CEO finalmente. Para piorar as coisas, Raul tem um sócio no camping, Lima, um amigo de infância, com 30% das ações, mas que não se envolve no dia a dia. Aparece de vez em quando e mesmo assim para passar o fim de semana de graça com um monte de amigos.
A saída mais adequada, ele imagina, seria dar a Renata uma formação em negócios e deixar o camping com ela. Embora possa parecer injusto para com os demais envolvidos, o negócio não é suficientemente grande para que todos trabalhem nele. Ele sabe que a filha vai se dar bem com Pinheiro, mas não tem certeza se a recíproca será verdadeira. Também sabe que ela não vai se dar bem com Lima. Um dilema típico em negócios familiares. Expliquei a ele os três universos dos negócios familiares – a gestão, a propriedade e a família:
Esses três universos podem ser independentes entre si ou intercalados. Para entender como essas relações funcionam, vamos primeiro entender cada um deles individualmente:
Quem está na gestão do negócio (A) são funcionários, contratados exclusivamente para se dedicar às funções do trabalho em troca de um salário. É o caso de Pinheiro. O universo da família (B) é o de parentes do empreendedor, mas não tem nada a ver com o negócio. O universo da propriedade (C) é o dos sócios do negócio, como Lima, que não trabalham nele e nem são da família. São três universos bastante distintos. Vamos agora ver como eles se mesclam:
Quem está na gestão do negócio (A) são funcionários, contratados exclusivamente para se dedicar às funções do trabalho em troca de um salário. É o caso de Pinheiro. O universo da família (B) é o de parentes do empreendedor, mas não tem nada a ver com o negócio. O universo da propriedade (C) é o dos sócios do negócio, como Lima, que não trabalham nele e nem são da família. São três universos bastante distintos. Vamos agora ver como eles se mesclam:
Algumas pessoas da família trabalham na empresa (grupo identificado no gráfico como AB). Não são sócios no negócio, não têm participação e sim um salário. Raul citou como exemplo um primo dele que cuida do estoque dos restaurantes.
Alguns sócios do negócio também atuam na empresa (grupo identificado no gráfico como AC). Não necessariamente são da família. É o caso de funcionários com participação acionária ou sócios que possuem um cargo, funções e responsabilidades nos negócios e vão todos os dias trabalhar.
Alguns parentes são sócios no camping (grupo identificado no gráfico como BC). São membros da família que acabam herdando a participação acionária, porém não atuam no negócio. É o caso aparente de Adolfo e Júnior.
Por fim, algumas pessoas da família podem ser sócias no negócio e ter um cargo na empresa (no gráfico está como ABC), como Renata e o próprio Raul.
Esse modelo ajuda a entender que os papéis dentro da empresa e na família podem ser diferentes sem gerar conflito. Dessa forma é mais fácil vislumbrar soluções para a situação. Assim, não tem problema nenhum Lima não atuar no negócio, desde que ele não receba salário, apenas os dividendos.
Adolfo também pode ser um sócio no negócio, retirar dividendos, mas não precisa atuar nele. Júnior pode até querer atuar no negócio, mas precisa demonstrar competência para isso, e assim passar de BC para ABC. Da mesma forma, Renata pode passar de ABC para BC se demonstrar dificuldade na gestão do negócio. Mas se isso acontecer – Raul me pergunta – ABC ficaria vazio? Respondi que ABC não ficará vazio, pois Renata continua trabalhando na empresa, mas ela não precisa assumir responsabilidades acima da sua competência.
Raul confia em Adolfo, que aparentemente tem condições de assumir o negócio. Para que não haja conflitos entre Renata, a dona, e Adolfo, o CEO, Raul pode oferecer sociedade a Adolfo, assim, ele passaria de A para AC. Em empresas familiares, os parentes podem atuar na gestão sem participação (AB), ser acionista sem trabalhar no negócio (BC), ou até ficar só como família, mas não precisa ser ABC.
Essa explicação deixou Raul mais tranquilo. Embora facilite a compreensão de que cada universo precisa ser avaliado de forma isolada e eles são independentes entre si, outros tipos de conflitos podem surgir e outras soluções podem ser necessárias.
*Marcos Hashimoto é professor de empreendedorismo da ESPM, consultor e palestrante (www.marcoshashimoto.com)
fonte: http://revistapegn.globo.com/Revista/Common/0,,EMI324680-17141,00.html
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