terça-feira, 13 de janeiro de 2015

SOBRE A TÃO DISTANTE “LIBERDADE DE EXPRESSÃO”

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“Liberdade de expressão” ultimamente se tornou uma expressão bem presente nos noticiários, logicamente devido aos atentados contra a sede da revista Charlie Hebdo, em Paris.
Desde então, após uma comoção geral por causa da violência das imagens registradas do atentado, surgiu a campanha “Eu sou Charlie” com manifestações em várias partes do mundo, inclusive aqui no Brasil.
Veja bem, um país que acabou de passar por um processo eleitoral bastante desgastante por causa das agressões gratuitas entre militâncias partidárias que não respeitavam opiniões contrárias, agora se simpatiza com a dor do jornal anarquista.
Seria irônico se não fosse deprimente.
O fato é que parte da população brasileira mais se assemelha com o fundamentalismo cego dos terroristas do que com o sarcasmo dos jornalistas mortos. Não custa nada lembrar que há poucos meses tivemos uma onda de linchamentos, em praças públicas, motivados por um comentário irresponsável de uma apresentadora de uma emissora que não está nem entre as duas principais do país.
Se fizeram tudo isso por alguém de tão pouca relevância, imagina só o que esse povo faria se padres e pastores começassem a pregar a morte de quem não for cristão. Será que essas pessoas teriam capacidade cognitiva para questionar tais mandamentos divinos?
Sinceramente, acredito que não.
Afinal, não percebo discernimento nas atitudes que observo em meu dia-a-dia. Vejo que as pessoas aderem às campanhas da mesma forma que gastam dinheiro para comprar o tal “pau de selfie”. Fazem de tudo, unicamente, para acompanharem a moda.
Vale lembrar que a mesma pessoa que hoje é Charlie para brigar contra o terrorismo, há pouco tempo também foi Macaco para protestar contra o racismo. E ninguém sabe o que será amanhã.
Porém, esse modismo cega e confunde. Diante de tantas campanhas e tendências, as pessoas não enxergam mais o que são. Assim, não percebem que estão longe de alcançar a idealização do anarquismo pregado pela revista francesa, e se aproximando perigosamente do ódio fanático que causa, entre outros males, o racismo que leva alguém a atirar uma banana em um campo de futebol só para humilhar o outro.
Sem dúvida nenhuma, a liberdade de expressão é algo que devemos almejar. Porém, é hipocrisia achar que é exclusividade do islamismo lutar contra ela.
Basta conhecer um pouco de História para compreender que as palavras “liberdade” e “religião” não se relacionam muito bem em uma mesma frase, independente do deus que se prega.
É só lembrar que durante o caminho que nos trouxe até aqui, inúmeras mulheres – que se recusaram a imposição de assumir o papel de “donas do lar” – foram consumidas pelas chamas das fogueiras da santa inquisição, sob a acusação de bruxaria. Também envenenaram cientistas e filósofos que contestaram a teoria do teocentrismo. Fora aqueles que foram massacrados durante as cruzadas.
Ou seja, um histórico nada libertário até aí.
A religião diz oferecer liberdade de escolha, porém, a outra opção sempre leva ao inferno. Como acreditar que se é livre, quando já se nasce pecador?
Por outro lado, tem os oportunistas que querem usar a tal liberdade de expressão para alimentar o seu sadismo, ao provocarem mais sofrimento em quem já enfrenta todas as dificuldades possíveis por não se enquadrar na idealização do senso comum.
Fazer piadas com gordos, gays, negros, ou qualquer pessoa fora de seus padrões não pode ser considerado liberdade de expressão, mas sim, uma forma covarde de opressão.
Não reconhecer a diferença entre opressor e oprimido é de uma comodidade intelectual vergonhosa, digna de quem empunha uma arma de fogo para revidar quem atacou suas crenças com desenhos.

Um comentário:

  1. Corajoso artigo. Parabéns. Já se disse que podemos confundir liberdade de expressão com assédio moral e discursos de ódio.

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