CARLOS VIEIRA
Lúcio, um grande amigo meu, resolveu passar um longo de fim de semana na capital federal. Fui buscá-lo no aeroporto, qual surpresa minha sua mala fora desviada para Goiânia. Fomos reclamar na companhia e disseram-nos que seria entregue no hotel em menos de 24horas. Logo em seguida, um engarrafamento surgia diante de nós, com um detalhe: um acidente automobilístico. Cadê os guardas de transito para organizar o caos na pista. Aliás, guarda de transito nessa cidade não existe, é impressionante. Qualquer outra cidade do país e do mundo, quando ocorre um problema no transito, os guardas tomam a dianteira, organizam as passagens dos carros, orientam os motoristas. Na cidade de 54 anos, cidade do futuro(?) não existe policiamento de transito; existem viaturas que passeiam pela cidade como se nada tivesse acontecido. Ato contínuo, passa o expresso moderno pelo eixão, sem pista própria, como se fora uma cobra gigantesca fazendo o que quer e bem entende. Perto do setor de hotéis, obras e mais obras para a bendita Copa do Mundo. Policiamento, nada, salve-se quem puder.
Á noite saímos para jantar no Pontão à beira do Lago Paranoá. Outro engarrafamento na ponte, as pessoas, ou seja, os motoristas organizando a confusão quando começa a chover torrencialmente. Chove demais, as pistas começam a se encherem de água, os bueiros entupidos, os carros, alguns passam a não funcionar. Aí, desistimos e pegamos a L4 em direção ao Iate Clube. Buracos mil em pistas recentemente refeitas, ou seja, tamponadas em seus buracos antigos e não substituídas. É curioso: algumas pistas são feitas de novo; outras qual o motivo de tamponá-las? Após o jantar fomos dar uma volta na área do poder. Pistas interditadas, sem aviso antecipado, pois no outro dia, teria a comemoração do aniversário da cidade. Desvios vários sem aviso antecipado (prática comum nessa cidade!), conseguimos chegar no hotel, perto do então chamado Estádio Nacional, obra incrivelmente cara, mais de um bilhão, para que os estrangeiros vejam a opulência do país do futuro, da magnitude brasileira, pura “cura cosmética”. Essa verba toda, caso investida em educação e saúde seria digna do seu gasto.
Pela manhã peguei meu amigo e fomos dar uma caminhada no Parque. Logo na entrada, somos surpreendidos com um assalto a uma idosa por um adolescente. Gritos, gritos, polícia, polícia, polícia! Bendita polícia, onde está que não lhe vejo? Ah! Os policiais passeiam nas viaturas, indiferentes à situação solitária e abandonada da população. Bom, é preciso que se diga que talvez seja a única cidade no mundo onde não existem guardas nas ruas. Mas tem sentido, em Brasília não existem ruas e nem esquinas! Não existem duplas Cosme e Damião nas quadras; não acontece de você ver um ou dois policiais andando, protegendo os transeuntes. Eles andam de carro, ou estão servindo aos altos funcionários do governo, em seus gabinetes. E olhe leitor, são os maiores salários de polícia no Brasil!
No parque os habitantes altivos, sarados, andando, correndo, tomando caldo de cana, água e se exercitando para manter a saúde em dia necessitam de segurança, principalmente à noite. E olhe que temos belos parques em todo o DF!
Resolvemos, eu e meu amigo, dar uma volta nas cidades satélites e em alguns “bairros” recentes. Prédios enormes, dezenas de andares, estacionamentos não existem, policiamento idem, e o transito, ah! o transito, parece cidade grande. Mas é uma cidade grande sim, só que uma cidade que não pensou como seria crescer. Grande, sem política administrativa para organizar e dar uma qualidade de vida razoável. Bem, andando por algumas Satélites, pelo amor de Deus! Buracos, asfaltos remendados, novamente sem policiamento, mais obras, obras e mais obras, é claro, aceleradas com finalidade eleitoreira e não com projetos de melhoria do hoje e do futuro. Postos de Saúde, curiosamente difundidos pela publicidade nas tevês, sem condições de funcionamento e sem enfermagem e pessoal médico.
À noite saímos novamente. Enquanto esperávamos o jantar, meu amigo se surpreende com o noticiário do jornal: crimes e mais crimes, assaltos, incêndio aos postos policiais, claro, sem policiais, acidentes de transito sem ajuda da polícia, corpos encontrados mortos nas Satélites e no Plano Piloto, um cenário não tão distante das favelas das grandes cidades.
Cinquenta e quatro anos! Claro que houve crescimento, desenvolvimento, que hoje já existe uma população filha da cidade e não só de candangos. Já existe uma certa vida própria do ponto de vista cultural e artístico. Escolas, hospitais, centros comunitários, universidades outrora construídos, isso não se discute. O que se discute é que as administrações públicas e governamentais não têm projetos para manter o crescimento inevitável. A mentalidade política, aqui na capital da República é a mesma: governar para benefícios próprios sem respeito à condição de humanidade, sem segurança pública, sem assistência à saúde e à educação. Ou será que a intenção é deixar a população sempre ameaçada, abandonada e desprotegida?
Vivemos num mundo tido como uma “economia globalizada”, quando o que não se tem coragem de dizer é, vivemos num mundo onde predomina o Capitalismo Selvagem em prol de uma minoria rica, por trabalho e por falcatruas. Fiódor Dostoiévski, se vivo, escreveria numa versão pós-moderna seu brilhante, profundo e doloroso – ‘HUMILHADOS E OPRIMIDOS – Ou, pensando em Friedrich Nietzsche no ensaio “Sobre o Pathos da Verdade”, onde escreve:” Enquanto o homem comum leva a sério, tão melancolicamente, essa tensão de ser, aqueles que souberam dar uma risada olímpica de tal coisa, ou pelo menos tratá-la com um desdém sublime; e, com frequência, foi com ironia que desceram dos seus túmulos – pois o que haveria neles para enterrar?”
Bom, meu amigo já viajou e deixou saudades. Saiu perplexo e um tanto depressivo com o que viu, dizendo a seguinte afirmação: “acho que o “tombamento de Brasília” está acontecendo. Não o famoso tombamento como patrimônio da humanidade, mas o tombamento consequente do descaso pela coisa pública, e da falta de sensibilidade pela segurança e melhor qualidade de vida aos habitantes.”
Á noite saímos para jantar no Pontão à beira do Lago Paranoá. Outro engarrafamento na ponte, as pessoas, ou seja, os motoristas organizando a confusão quando começa a chover torrencialmente. Chove demais, as pistas começam a se encherem de água, os bueiros entupidos, os carros, alguns passam a não funcionar. Aí, desistimos e pegamos a L4 em direção ao Iate Clube. Buracos mil em pistas recentemente refeitas, ou seja, tamponadas em seus buracos antigos e não substituídas. É curioso: algumas pistas são feitas de novo; outras qual o motivo de tamponá-las? Após o jantar fomos dar uma volta na área do poder. Pistas interditadas, sem aviso antecipado, pois no outro dia, teria a comemoração do aniversário da cidade. Desvios vários sem aviso antecipado (prática comum nessa cidade!), conseguimos chegar no hotel, perto do então chamado Estádio Nacional, obra incrivelmente cara, mais de um bilhão, para que os estrangeiros vejam a opulência do país do futuro, da magnitude brasileira, pura “cura cosmética”. Essa verba toda, caso investida em educação e saúde seria digna do seu gasto.
Pela manhã peguei meu amigo e fomos dar uma caminhada no Parque. Logo na entrada, somos surpreendidos com um assalto a uma idosa por um adolescente. Gritos, gritos, polícia, polícia, polícia! Bendita polícia, onde está que não lhe vejo? Ah! Os policiais passeiam nas viaturas, indiferentes à situação solitária e abandonada da população. Bom, é preciso que se diga que talvez seja a única cidade no mundo onde não existem guardas nas ruas. Mas tem sentido, em Brasília não existem ruas e nem esquinas! Não existem duplas Cosme e Damião nas quadras; não acontece de você ver um ou dois policiais andando, protegendo os transeuntes. Eles andam de carro, ou estão servindo aos altos funcionários do governo, em seus gabinetes. E olhe leitor, são os maiores salários de polícia no Brasil!
No parque os habitantes altivos, sarados, andando, correndo, tomando caldo de cana, água e se exercitando para manter a saúde em dia necessitam de segurança, principalmente à noite. E olhe que temos belos parques em todo o DF!
Resolvemos, eu e meu amigo, dar uma volta nas cidades satélites e em alguns “bairros” recentes. Prédios enormes, dezenas de andares, estacionamentos não existem, policiamento idem, e o transito, ah! o transito, parece cidade grande. Mas é uma cidade grande sim, só que uma cidade que não pensou como seria crescer. Grande, sem política administrativa para organizar e dar uma qualidade de vida razoável. Bem, andando por algumas Satélites, pelo amor de Deus! Buracos, asfaltos remendados, novamente sem policiamento, mais obras, obras e mais obras, é claro, aceleradas com finalidade eleitoreira e não com projetos de melhoria do hoje e do futuro. Postos de Saúde, curiosamente difundidos pela publicidade nas tevês, sem condições de funcionamento e sem enfermagem e pessoal médico.
À noite saímos novamente. Enquanto esperávamos o jantar, meu amigo se surpreende com o noticiário do jornal: crimes e mais crimes, assaltos, incêndio aos postos policiais, claro, sem policiais, acidentes de transito sem ajuda da polícia, corpos encontrados mortos nas Satélites e no Plano Piloto, um cenário não tão distante das favelas das grandes cidades.
Cinquenta e quatro anos! Claro que houve crescimento, desenvolvimento, que hoje já existe uma população filha da cidade e não só de candangos. Já existe uma certa vida própria do ponto de vista cultural e artístico. Escolas, hospitais, centros comunitários, universidades outrora construídos, isso não se discute. O que se discute é que as administrações públicas e governamentais não têm projetos para manter o crescimento inevitável. A mentalidade política, aqui na capital da República é a mesma: governar para benefícios próprios sem respeito à condição de humanidade, sem segurança pública, sem assistência à saúde e à educação. Ou será que a intenção é deixar a população sempre ameaçada, abandonada e desprotegida?
Vivemos num mundo tido como uma “economia globalizada”, quando o que não se tem coragem de dizer é, vivemos num mundo onde predomina o Capitalismo Selvagem em prol de uma minoria rica, por trabalho e por falcatruas. Fiódor Dostoiévski, se vivo, escreveria numa versão pós-moderna seu brilhante, profundo e doloroso – ‘HUMILHADOS E OPRIMIDOS – Ou, pensando em Friedrich Nietzsche no ensaio “Sobre o Pathos da Verdade”, onde escreve:” Enquanto o homem comum leva a sério, tão melancolicamente, essa tensão de ser, aqueles que souberam dar uma risada olímpica de tal coisa, ou pelo menos tratá-la com um desdém sublime; e, com frequência, foi com ironia que desceram dos seus túmulos – pois o que haveria neles para enterrar?”
Bom, meu amigo já viajou e deixou saudades. Saiu perplexo e um tanto depressivo com o que viu, dizendo a seguinte afirmação: “acho que o “tombamento de Brasília” está acontecendo. Não o famoso tombamento como patrimônio da humanidade, mas o tombamento consequente do descaso pela coisa pública, e da falta de sensibilidade pela segurança e melhor qualidade de vida aos habitantes.”
Carlos de Almeida Vieira - psicanalista e psiquiatra.
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