quinta-feira, 10 de abril de 2014

O nazista que fingiu ser judeu




O  nazista que fingiu ser judeu
Judeus em Treblinka

A vida do oficial da SS que passou quarenta anos como ser fosse uma de suas vítimas.

A saga de Hans-Georg Wagner pouco difere da de tantos judeus-alemães que sobreviveram às atrocidades nazistas na II Guerra. Após a derrocada do Reich e a divisão da Alemanha, esse engenheiro nascido em Dresden estabeleceu-se em território da Alemanha Oriental. Em 1957, fugiu para a Alemanha Ocidental e mudou-se no final dos anos 60 para Israel. 

Lá, casou-se com uma judia e foram tentar a vida na Venezuela. Morreu em 1988, aos 70 anos, como membro influente da comunidade judaica de Caracas. A história só não é banal porque Hans-Georg Wagner se chamava na verdade Günter Reinemer, não era judeu e sim um oficial das SS, a tropa de choque do Partido Nazista. Ameaçado de ser levado a julgamento por sua atuação no campo de extermínio de Treblinka, na Polônia, no qual morreram 800.000 judeus, Reinemer disfarçou-se de judeu para escapar à Justiça.

A impressionante história desse criminoso de guerra tornou-se pública na semana passada, quando sua confissão, gravada em vídeo, foi exibida em um documentário da TV alemã. No fim da guerra, conta Reinemer, ele foi recrutado pela CIA, o serviço secreto dos Estados Unidos, num campo de prisioneiros na França. 

A idéia de disfarçá-lo de judeu foi dos agentes americanos, que providenciaram documentos falsos e até mesmo a circuncisão. Ele primeiro ajudou a identificar nazistas foragidos. Depois foi enviado como espião à Alemanha Oriental. Por fim, viveu quarenta anos na pele do judeu Hans-Georg Wagner.


Reprodução do livro Deportacion


Treblinka: mulheres a caminho da execução

Sua verdadeira identidade só foi descoberta por acaso, pouco antes de sua morte. Em 1988, ele foi contratado como consultor pela Venergia, uma indústria venezuelana de baterias para submarinos. Suspeitando que Wagner estava vendendo segredos da empresa, os donos da Venergia (aliás, judeus) chamaram um especialista alemão em segurança industrial, Klaus- Dieter Matschke. 

Ele vasculhou a vida de Wagner sem nada encontrar. Numa manhã, irritado, convocou o engenheiro e, assim que ele entrou na sala, gritou, em voz de comando: "Nome, patente e local da última missão militar". Acreditando que seu passado finalmente havia sido desvendado, Wagner se entregou: "Reinemer, Divisão de Morte da SS, Treblinka".

Desmascarado, Reinemer, que abandonou a mulher e dois filhos ao se transformar no judeu Wagner, contou sem emoção sua história, incluindo as atrocidades em Treblinka. Em agosto de 1943, os prisioneiros selecionados para o trabalho escravo – e que portanto viveriam um pouco mais – revoltaram-se ao saber que suas mulheres e filhos estavam sendo mortos nas câmaras de gás. 

Quando tomou conhecimento do motim, o comandante do campo foi claro: "Restabeleçam a ordem, sem se importarem com as conseqüências", disse a seus soldados. Depois de controlada a rebelião, 630 sobreviventes foram levados para um bosque próximo e fuzilados. Reinemer ajudou a selecionar e comandou a execução de 110 deles. Ele chegou a ser preso e torturado pela polícia venezuelana, mas morreu na cama, de ataque cardíaco. 

Sua viúva, uma judia de origem polonesa, não o perdoa por tê-la enganado. 

"Se soubesse de seu passado, talvez eu mesma o tivesse matado", ela diz no documentário. E acrescenta: "Talvez".

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