Percival Puggina
O Brasil está à beira da anomia. Em relação aos poderes de Estado, o povo perdeu a fé, a esperança, e a caridade. Isso é anomia, ou seja, desintegração das normas que regem as condutas e garantem a ordem social. O povo chegou ao ponto de saturação e simplesmente não suporta mais tanta improbidade, corrupção, indignidade e incoerência. Já o Estado, diante do que vê nas ruas, dá mostras de completa desorientação. Seria tão simples - não é mesmo? - reger com probidade, dignidade e coerência! Não haveria mensalão, nem mensalinho, nem emendas parlamentares como moedas de troca no balcão do poder, nem jatinhos, nem jatões para assistir missa em Roma, nem Renan presidiria o Senado (quanta desfaçatez!), nem tantos ministérios, nem companheiros nos tribunais, nem tanto abuso de direitos, nem tamanha distância entre o modo de vida dos frequentadores do salões do poder e o modo de vida do povo, nem tanta incoerência entre o piso que se prometeu ao magistério e os vencimentos que a ele se paga. Asseguro-lhes, sob condições singelas, o povo não estaria nas ruas.
O governo Dilma é um morto-vivo que respira por aparelhos. Aparelhos políticos, tutelados pelo poder. E por uma enxurrada de anúncios bilionários proclamados, para auditórios nervosos, em aparições ectoplasmáticas. Aparições que soam fúnebres, do tipo - "reúne a família que a hora está próxima". São eventos cujas imagens me trazem à lembrança a famosa foto de Tancredo Neves entre seus médicos no Hospital de Base de Brasília. O dinheiro não compra tudo, presidente.
Não se vislumbram saídas. A desatenção às leis da Economia está cobrando sua conta, que, como de hábito, chega mais rápido a quem pode menos. O maldito modelo institucional brasileiro, mal costurado, ficha-suja, nos deixa sem opção por essa via. Quantas vezes votamos, em vão, no mal menor? De fato, o pêndulo que, nos países com boa organização, oscila, periodicamente, segundo as leis da Física e da Política, da direita para a esquerda e da esquerda para a direita, desaprumou no Brasil. E balança, bisonho e sem tino, entre a esquerda e mais à esquerda.
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Mudando de assunto, sem mudar. A bruma dos séculos envolve fatos e lendas a respeito de Santo Antônio. Conta-se, por exemplo, que certa vez, quando seu pai estava sendo julgado em Portugal, acusado de um assassinato, padre Antônio celebrava missa em Pádua, na Itália. De repente, o santo teria se quedado imóvel perante os fieis e aparecido em Lisboa, onde, não bastasse o prodígio da bilocação, ainda teria ressuscitado o morto para que testemunhasse a inocência do acusado.
Extraordinário, não? Pois eu conheço um sujeito nada santo que realiza portento bem maior. Ele, com frequência, consegue não estar em lugar algum. Desaparece. Some aos olhos humanos. Falo de Lula. Sempre tão presente nas horas boas, toma chá de sumiço quando a coisa encrenca. Evanesce. E não me digam que é lenda. Não. É milagre mesmo. Milagre sem interferência divina. Coisas que ele faz por conta de não sei quem. Ou melhor, sei. Mas não digo. O homem que dá as cartas e joga de mão na política brasileira, há dez anos, sumiu de novo, como se nada tivesse a ver com o que está acontecendo no país.
ZERO HORA, 14 de julho de 2013
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