Carlos Chagas
Apesar de passar o dia em Pernambuco, ontem, a presidente Dilma manteve-se atenta, cobrando de diversos ministros, pelo telefone, providências para o imediato resultado das investigações sobre os responsáveis pela boataria que tomou conta do país no fim de semana, sobre a interrupção e até a extinção do bolsa-família. O ministro da Justiça ficou o tempo todo ligado com a presidente, dando conta do trabalho da Polícia Federal, abrangendo os doze estados onde foi maior a exasperação popular. Desde sábado à noite que Dilma passou a exigir a apuração da despropositada notícia.
O governo não admite a hipótese da combustão espontânea. Algum pérfido objetivo, de mais pérfidos personagens, deu início à difusão da mentira, que as redes sociais absorveram celeremente.
A pergunta que se fazia em Brasília, por exigência da presidente da República, era “a quem interessou o crime?”
Não se pode mais acusar os comunistas, como no passado. Eles já ganharam a estratosfera. Também fica difícil acusar os tucanos, mesmo tendo eles se reunido em convenção, na capital federal, quando contundentes pronunciamentos foram feitos contra o governo. Afinal, eles reivindicam a paternidade do bolsa-família e não se cansam de repetir que manterão o programa, quando chegarem ao poder.
Identificar a trama na imprensa sempre crítica à administração do PT também não dá. Nenhum jornalão ou rede de televisão abriu espaço para divulgar o boato, passando todos a registrar apenas seus efeitos em grande número de cidades, onde agencias bancárias foram invadidas. No caso, prevalece a máxima de que a imprensa aumenta, mas não inventa.
Teria sido aquela parcela do empresariado sempre de má vontade com o governo? Jamais nos fins de semana, onde seus expoentes espalham-se entre o mar e a montanha. Dos sindicatos não há que falar, muito menos da Igreja, empenhada em celebrar o Pentecostes.
Aliados descontentes com falta de favores e benesses? Não depois da votação da medida provisória dos Portos, aprovada às custas de montes de promessas do palácio do Planalto de que agora serão atendidos em seus pleitos. Os sabotadores do PT que ainda sonham com a substituição de Dilma pelo Lula, como candidato presidencial no ano que vem? Seria mais do que um tiro no pé, pois na cabeça, se chegassem a tanto.
Fica então o mistério, dentro de um enigma, envolto por uma charada: que forças desencadearam a crise, em dado momento levando o governo à exasperação? Vale repetir, as redes sociais podem ter servido de instrumento para inocular o medo e a indignação nas camadas beneficiadas pelo bolsa-família, mas não foram a sua causa. Na hipótese de malograrem as investigações da Polícia Federal, será suficiente alegar a combustão espontânea das massas? Melhor convocar Sherlock Holmes, monsieur Poirot e o comissário Maigret, porque esse bando de novos detetives surgidos de medíocres autores policiais não darão para a tarefa investigativa…
ATENÇÃO NO SUPREMO
É provável que esta semana o plenário do Supremo Tribunal Federal venha pronunciar-se sobre a validade ou não dos embargos apresentados pelos advogados dos condenados no processo do mensalão. O presidente Joaquim Barbosa já se definiu contra a hipótese de iniciar-se um segundo julgamento dos mensaleiros, mas precisará abrir a questão aos demais ministros. Caso não o faça, eles farão, dada a existência de uma corrente que discorda das concepções do presidente. A previsão é para debates acres e veementes a respeito da possibilidade de revisão de certas penas. Jamais a absolvição, mas a diminuição de algumas condenações. Resta saber se quebrarão as muralhas de Joaquim Barbosa.
AQUELE MALDITO CAFEZINHO
Aparício Torelli, o Barão de Itararé, foi preso diversas vezes pela ditadura do Estado Novo. Numa delas, já permanecia há dois meses no presídio da rua Frei Caneca, no Rio, sem ter prestado depoimento nem ter sido ouvido. O ministro Castro Nunes, do Supremo Tribunal Federal, ao investigar as arbitrariedades da polícia de Filinto Muller, conseguiu avistar-se com o bravo jornalista e começou perguntando porque ele estava preso. O Barão pensou um pouco e respondeu: “Excelência, só pode ter sido aquele maldito cafezinho.”
O ministro espantou-se, ia ficando bravo, quando ouviu a explicação: “Eu estava no meu escritório escrevendo um artigo quando me deu vontade de tomar um cafezinho. Desci ao botequim, fiz o pedido e quando ia levando a xícara à boca apareceu um investigador de polícia, segurou meu braço e disse que eu estava preso. Só pode ter sido por causa do cafezinho…”
Mesmo assim, o Barão foi parar no presídio da Ilha Grande.
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