01/04/2013
Giulio SanmartiniAntes de começar, quero deixar claro algumas coisas. Primeiro, tenho duas certeza na vida: uma é a morte , a outra é que o ser humano só pode ser feliz se tiver quatro liberdades essenciais: intelectual, política, econômica e religiosa.
Para dar uma idéia, caso estivesse na Rússia em 24 de outubro de 1917, estaria com os bolchevistas contra o absolutismo do czar, ou em Cuba no ano de 1959 estaria m Sierra Maestra contra a ditadura de Fulgencio Batista.
Como todos sabem, ambas deram em água de batatas, mas o espírito inicial era o de liberdade.
Depois disso vamos ao que interessa.
Andei lendo que o ministério da Defesa proibiu qualquer comemoração ao 31 de março de 1964, nada melhor pode-se esperar do ministro Celso Amorim.
É exatamente sobre esse movimento que quero contar alguns fatos, estes não me foram contados e nem os li, eu os presenciei porque estava lá, me refiro ao Palácio Guanabara no Rio de Janeiro.
Na semana anterior os sargentos e cabos da Marinha, que estavam em revolta no Sindicato do Metalúrgicos, em São Cristóvão (RJ), foram anistiados por ordem expressa da presidência da República, este foi o estopim.
Na segunda feira 30/3, começou o movimento liderado pelo governador do Estado da Guanabara, Calos Lacerda. Foi exatamente nesse dia que fui para lá acompanhando um dos responsáveis pela segurança do Palácio, O general Araken Torres.
Estávamos lá e os cigarros acabara, assim fui até um bar na rua Pinheiro Machado para comprar, quando voltei, o sentinela me mandou ir para o gabinete, lá estava o governador, o general Salvador Mandin e o Araken, discutiam que precisavam o apoio do I Exército comandado pelo general Castelo Branco.
- Temos que falar com o Castelo, vamos telefonar – disse Lacerda.
- Quem vai falar – perguntou Mandin e acrescentou – Fala você Araken, que é mais amigo dele.
Demorou muito tempo para conseguir a ligação, mas finalmente os dois falaram. Lembro perfeitamente do Araken dizer: “Mas general, se ficarmos parados quem vai tomar o poder é o Brizola”. Castelo ficou de informar sua decisão através de mensageiro. A única coisa a fazer era esperar e o dia passou.
A manhã seguinte, 1° de abril, estava chuvosa e fria, a indefinição estava deixando todo mundo nervoso. Na segunda metade da tarde, chegou a mensagem de Castelo Branco: ele daria apoio ao pessoal do Palácio Guanabara e 3 carros de combate já estavam a caminho para garantir a segurança. Houve um explosão de euforia, mas era necessário desfazer os pontos de defesa, que estavam sobre o túnel Santa Bárbara, o viaduto de acesso e o corte da rua Farani. Este pessoal deveria ser avisado que os tanques que chegavam, estavam a nosso favor. Arakem me deu um megafone, mandou que eu montasse num jipe dirigido por um PM e avisasse aqueles que estavam no alto das montanhas do corte, eles apareceram logo e começaram a festejar.
Os moradores das redondezas que haviam permanecido dia trancados em suas casas, começaram a sair, primeiro discretamente e depois numa avalanche. Lembro-me de uma senhora, que correu para mim de braços abertos, me abraçou e deu dois beijos.
Quando tudo terminou estava na hora do jantar, nos foi servido risoto de camarão. Findo, fui para a sala de segurança, sentei no sofá e lembrei que há dois dias não dormia.
Fui acordado pelo Araken: “Como é moleque (ele sempre me chamou assim), vai ficar ai o dia inteiro?”.
Fui embora, já era o dia 2/4. Na frente do Palácio estavam hasteando a bandeira do Brasil. Lacerda e outros cantavam os últimos acordes do hino nacional.
Cheguei em casa e encontrei minha mãe agitadíssima, queria saber tudo, enquanto eu contava ela me preparou um prato de espaguetes com molhe de tomate e manjericão. Comi e voltei a dormir.
Quando acordei, ela se preparava para ir à Marcha da Família com Deus Pela Liberdade. Disseram os jornais da época que o evento juntou um milhão de pessoas, não sei, não fui, preferi ver minha namorada no bairro do Leblon.
O fato é que o movimento chamado de 31 de março, na realidade aconteceu no dia 1° de abril.
PS: O artigo é um digesto do prólogo que escrevi para o livro de Moacir Japiassu, “Quando alegre partiste”, Editora Francis 2004.
(1) Foto: 1° de abril em frente ao Palácio Guanabara, os carros de combate que aderiram.
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