segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Preço e Valor, por Elton Simões


Transcrito do Blog do Noblat

Provavelmente a lembrança já se perdeu em algum canto escondido da memória. Mas o fato é que houve uma época em que comprar um café era simples. Bastava decidir preto e com leite; e com e sem açúcar. Só isso.
Neste dia e época, comprar um café é escolher entre dezenas de variáveis e centenas de combinações. É escolher entre preto, cappuccino, expresso, latte, americano, ou mocha; com ou sem cafeína; com açúcar, sem açúcar, ou com adoçante; gelado ou quente; e com leite de vaca ou de soja. Café, gosto e gente ficaram mais complexos. O número de variáveis aumentou. As opções multiplicaram. E para cada opção, corresponde um preço. Como convém às regras da economia.
Segundo a teoria econômica, são os preços que tornam possível a escolha e comparação de opções diferentes. O ser humano seria uma espécie de supercomputador capaz de reduzir a um único preço variáveis ou complexas combinações de variáveis. Reduzir tudo a preços comparáveis tem a vantagem de tornar possíveis as transações humanas e tornar simples e objetivas as comparações.
Em teoria, os preços contêm e refletem tudo. O preço impresso em um pacote de cigarros conteria o prazer do alívio do vício. Consideraria os minutos de vida perdida a cada cigarro, tragada por tragada. Atribuiria um valor a cada tossida futura.
O preço de um litro de gasolina refletiria o prazer e a utilidade do transporte que ela propicia. E consideraria a fumaça que apaga as estrelas e polui o ar.
Economia parece ser o ramo do conhecimento humano capaz de calcular o preço de qualquer coisa. Tudo poderia ser reduzido a seu equivalente monetário. Uma vez calculado o preço, tudo poderia ser comercializado, vendido, ou trocado.
O diabo é que calcular preços com precisão pressupõe conhecer todas as variáveis. Assume a capacidade de analisar todos os dados, projetar todas as opções e calcular precisamente o impacto de cada uma delas.
Conhecer tudo, entretanto, é tarefa impossível diante das limitações inerentes à condição humana. É possível que existam coisas que não tenham mesmo preço ou cujo preço seja desconhecido, impreciso ou impossível de ser calculado.
Talvez a existência e a condição humana não caibam nos limites estreitos da teoria econômica. Talvez as coisas externas ao sistema de preços sejam, ou possam estar se tornando, importantes demais para serem simplesmente consideradasexternalidades. Talvez aquilo que ignoramos seja mais importante do que o que sabemos.
Talvez se saiba o preço de tudo, mas não se conheça o valor de nada.

Elton Simoes mora no Canada há 2 anos. Formado em Direito (PUC); Administração de Empresas (FGV); MBA (INSEAD), com Mestrado em Resolução de Conflitos (University of Victoria). Emailesimoes@uvic.caEscreve aqui às segundas-feiras.

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