Adriana Nicacio
CONTRAMÃO
Empresas beneficiadas com a redução do IPI
ameaçam fechar fábricas e demitir funcionários
Para tentar manter a economia em crescimento na contramão da crise internacional, o governo Dilma Rousseff brindou a indústria com cortes de tributos. Agradou importantes setores da economia, mas perdeu o controle dos efeitos das benesses. A fórmula, que vinha dando certo desde 2008, começou a revelar sinais de exaustão. Neste ano, a renúncia fiscal ficará próxima de R$ 200 bilhões, praticamente dois PACs, mas não tem a contrapartida do setor produtivo em termos de geração de emprego. Indústrias beneficiadas com a redução do IPI, como a General Motors, ameaçam fechar fábricas e demitir funcionários num cenário que remete ao passado. É um ciclo conhecido: o governo abre mão de receita, o empresariado reduz os pagamentos de impostos em troca de promessas de investimentos e manutenção de empregos. Porém, na prática, as empresas preservam lucros, remetem dividendos para o exterior e a sociedade paga a conta.
As medidas de estímulo para o setor automobilístico somam R$ 26 bilhões desde 2010. No entanto, o Banco Central mostra que valores praticamente idênticos às desonerações foram transferidos para suas matrizes fora do Brasil. Se neste ano a Fazenda reduziu o IPI dos automóveis com um impacto de R$ 1,2 bilhão, a indústria enviou quase US$ 5 bilhões para Ásia, Estados Unidos e Europa. Mesmo assim, depois de uma reunião com o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, e o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Cledorvino Belini, ficou acertado que a redução do IPI será prorrogada até outubro. O governo ainda desconversa, mas o anúncio será dado no final deste mês em conjunto com a promessa de investimentos no País de R$ 22 bilhões até 2015.
As desonerações tributárias são bem-vindas num país onde a carga tributária é de 36% do PIB, mas o ministro do Tribunal de Contas da União, José Múcio Monteiro, chama a atenção para um ponto importante. “É preciso ter controle e transparência nas renúncias fiscais. A palavra imposto é ruim, mas vira luz, estrada e saúde. O governo não pode perder arrecadação sem saber o que isso representa”, disse Múcio à ISTOÉ ao lembrar que os incentivos fiscais superam os gastos com educação, saúde e assistência social. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, diz que o programa de estímulo à indústria automotiva é muito bem-sucedido e, apesar de problemas com a GM, em julho foram criados 1,9 mil novos postos de trabalho. “Verificamos o aumento na geração de empregos. Portanto, o saldo é positivo”, garante o ministro. Num cálculo raso, se a desoneração do IPI de R$ 1,2 bilhão criou 1,9 mil empregos, cada emprego saiu para o governo por R$ 631.578.
O certo é que novos benefícios fiscais virão. O Ministério da Fazenda promete incluir ainda este mês, pelo menos, mais seis setores de serviços na lista de beneficiados pela desoneração da folha de pagamento por meio de uma medida provisória. Atualmente, 19 setores recolhem 1,5% sobre seu faturamento. Mas, nesse caso, fontes do Palácio garantem que haverá um acompanhamento com lupa. “Tem um grupo específico para calcular o retorno para o PIB e o mercado de trabalho. O governo não está de olhos fechados”, diz um importante assessor do Palácio do Planalto.
Mas é preciso acompanhar todos os setores. A desoneração na linha branca que terá um custo de R$ 684 milhões para os cofres públicos foi prorrogada sob as mesmas exigências de preservação de empregos. A Whirpool, por exemplo, dona das marcas Brastemp e Cônsul e de mais de 40% do mercado de eletrodomésticos, garantiu que preservará seus empregos nas fábricas de Rio Claro, em São Paulo, e Joinville, em Santa Catarina, e não cogita dar férias coletivas. Mesmo assim não há um boom de investimentos nem de postos de trabalho, como se viu em 2008, quando as renúncias fiscais ganharam peso na política econômica. Mantega justifica dizendo que o varejo está com dificuldades de encontrar trabalhadores no mercado.
Mas os resultados são de fato desconhecidos. A Fazenda zerou a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) na gasolina e no diesel, para evitar aumento de preços ao consumidor final. Mesmo assim, apesar da renúncia de R$ 4,7 bilhões, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) investiga 77 casos de formação de cartel para manter o preço dos combustíveis nas alturas. Numa outra frente, auditoria do TCU no Ministério da Cultura apontou diversas falhas na fiscalização de oito mil projetos culturais, financiados com renúncia fiscal pela Lei Rouanet. Nenhum deles precisou prestar contas do dinheiro que não foi pago ao Tesouro Nacional.
Sócio-diretor da Pactum Consultoria Empresarial, Vinícius Piazzeta avalia que, ao privilegiar com desonerações determinados setores da economia, a Fazenda obtém resultados imediatos na elevação de vendas para alimentar o conjunto de boas notícias sobre a economia brasileira. Mas, no longo prazo, há efeitos nocivos, que só serão corrigidos com uma ampla reforma tributária. “A renúncia fiscal só terá um efeito duradouro se for distribuída por todos os setores produtivos”, diz.
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