sexta-feira, 6 de novembro de 2015

O predomínio da imoralidade - EDITORIAL ESTADÃO

    Estadão - Editorial
Tem razão o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, quando declara que não será “nada anormal” se o Congresso aprovar as contas do governo de Dilma Rousseff. O normal, hoje no País, é o predomínio da imoralidade no trato da coisa pública, razão pela qual será surpreendente se os parlamentares tomarem uma decisão justa, em vez de articularem mais um vergonhoso conchavo, quando forem analisar os crimes cometidos pela presidente na área fiscal – de resto sobejamente comprovados pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Órgão auxiliar do Legislativo, o TCU aprovou por unanimidade, em outubro, um parecer recomendando que o Congresso rejeitasse as contas de Dilma. Os ministros daquele tribunal consideraram que o balanço apresentado pelo governo, relativo ao ano passado, continha manobras fiscais que violavam a Lei Orçamentária e a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Na ocasião, o TCU deixou claro que os procedimentos do governo para maquiar suas contas “afrontam de forma significativa” vários itens daquela legislação. O relatório, de mais de 1.400 páginas, não deixa dúvidas sobre os delitos de Dilma – que, em países respeitadores da lei, seriam mais que suficientes para embasar um processo de impeachment.
Não bastassem as evidências recolhidas pelos técnicos do TCU, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, entregou à Comissão Mista de Orçamento do Congresso a confissão de que o rombo causado pelas “pedaladas fiscais” chega a inacreditáveis R$ 57 bilhões, fazendo saltar o déficit primário do governo para quase R$ 120 bilhões, ou 2,08% do PIB. Se isso não é irresponsabilidade fiscal, devidamente prevista como crime na legislação, então nada mais é.
Mas o Brasil “normal”, conforme querem os petistas e seus sócios na campanha de conquista do Estado, é aquele em que se faz a equivalência moral de situações incomparáveis, com o objetivo de causar confusão e, assim, tentar livrar a cara dos culpados pelo arrombamento das contas públicas. Para se defender, Dilma diz que o governo de Fernando Henrique Cardoso também “pedalou”, isto é, também atrasou repasses do Tesouro aos bancos públicos; logo, se todos cometeram o tal crime, hoje e no passado, crime não há.
É com esse argumento malandro que os petistas pretendem induzir o Congresso a ignorar o TCU e aprovar as contas de Dilma, sugerindo que a Lei de Responsabilidade Fiscal foi mal aplicada pelo tribunal. “Todo julgamento é uma interpretação”, disse Jaques Wagner. “Você tem, à luz da Lei de Responsabilidade Fiscal, uma interpretação que foi dada pelo TCU. Nós vamos debater aqui no Congresso, à luz da mesma Lei de Responsabilidade Fiscal, e vamos dar outra interpretação.” Por “outra interpretação” se entenda concluir que o governo é inocente porque teria repetido prática de seus antecessores.
No entanto, o que o TCU demonstrou, acima de qualquer dúvida razoável, é que os crimes cometidos pelo governo petista, tanto em volume de dinheiro quanto em extensão de tempo, não têm paralelo na história do País.
O objetivo das pedaladas, já está claro, era esconder a terrível situação financeira causada pelo populismo desatinado do lulopetismo. A conta desse truque contábil finalmente chegou – mas o governo, como se estivesse a negociar a compra de um fogão numa loja popular, quer parcelar a dívida em 60 suaves prestações.
A aposta do governo petista, contudo, passa muito longe do tal debate legalista sugerido por Wagner. No Congresso, qualquer decisão que venha a ignorar o parecer do TCU, plenamente embasado em fatos irrefutáveis, não será uma decisão técnica, e sim política. E a política está de tal modo abastardada, reflexo de um governo licencioso e de um Congresso dominado por desqualificados do baixo clero, que talvez seja fácil para Dilma cabalar votos para aprovar suas criminosas cambaias.
Será um desfecho ignominioso, mas muito característico do momento em que vivemos.

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