quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Uma breve história da mentira na política - FERNANDO MARTINS


GAZETA DO POVO - PR - 10/09


A palavra em latim diabolus significa “caluniador”, aquele que faz acusações falsas. Deu origem ao termo “diabo” – também chamado, na tradição cristã, de pai da mentira. Faz tempo, porém, que mentir perdeu o peso moral da religião. A prática tem sido relativizada, sobretudo na política. E talvez não haja período mais profuso em manipulações e dissimulações que as campanhas eleitorais. Na busca por votos, muitos candidatos adotam sem pudores a inverdade como estratégia. Classificar essa conduta de diabólica pode soar antiquado, mas a história política da mentira permite tachá-la de maquiavélica e até mesmo de nazifascista.

Quem primeiro demonstrou que a mentira é útil na arte de conquistar e manter o poder foi o pensador italiano Nicolau Maquiavel (1469-1527) – principalmente na obra clássica O Príncipe. Até hoje há controvérsia se ele defendia o que escreveu ou se apenas constatava um fato. Mas o fato é que “maquiavélico” virou sinônimo de ardiloso, oportunista. De qualquer modo, Maquiavel representou uma mudança na forma de encarar a política – antes vista como uma extensão pública da ética ou da religião (nada mais estranho ao mundo contemporâneo).

Foram necessários 500 anos para a mentira mudar de patamar como arma política. E isso foi obra do totalitarismo germânico. Todos costumam se lembrar da famosa máxima do ministro da Propaganda da Alemanha nazista, Joseph Goebbels: “Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”. A lógica é apostar que a população passará a duvidar da falsidade da mentira pela insistência e, numa segunda etapa, vai considerá-la verdadeira.

Menos conhecida, mas igualmente pérfida, é uma declaração de Adolf Hitler: “As massas acreditam muito mais facilmente numa grande mentira do que numa pequena”. Nesse caso, a estratégia é tornar a farsa tão inacreditável que, paradoxalmente, poucas pessoas poderiam supor que alguém seria capaz de expô-la em público sem constrangimentos. Como a mentira é apresentada como verdadeira pelas autoridades, é porque não pode ser falsa. Só um louco seria capaz de mentir de forma tão grandiloquente. Foi assim que o nazismo conseguiu se manter no poder.

Nenhum político em sã consciência defende hoje o totalitarismo. Mas não é difícil identificar traços do DNA de Goebbels no discurso político contemporâneo. Não se trata, portanto, de algo sem consequências. A mentira na política é a perigosa semente de uma erva daninha que pode enfraquecer a democracia. Afinal, mentir é ocultar, não dar transparência – algo incompatível com os princípios democráticos.

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