sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Cartas de Nova Iorque: Quando a gente vota fora do país

Blog do Noblat

E assim, com a expectativa de participar das eleições este ano, eu aproveitei a renovação do passaporte em 2012 e também troquei de zona eleitoral.
Depois de muitos anos, chegou a hora de votar como expatriada. Em momentos pré-eleição, quando gringos ainda me perguntava por aqui com quem Marina Silva se parecia, se Lula voltaria a se candidatar, como pronunciar o nome de Dilma e quem era o adversário candidato da oposição, eu só me animava para exercer novamente o “dever cívico”. Desconversei com os amigos sobre os candidatos e ensinei todas as regras. Contei como votamos aos 16 anos, como é obrigatório, como sabemos quem ganhou no mesmo dia da eleição - os americanos arregalam os olhos. No Brasil, não tem Flórida nem Ohio. A urna eletrônica conta os votos “right away”.
Encontrar minha sessão, ver a cara dos mesários, escutar a confirmação da urna eletrônica de novo. Muita gente não gosta de ir votar, da lei seca, da sujeira da boca de urna. Mas quando o voto da gente não conta mais, confesso, faz muita falta. Principalmente quando se vive num lugar onde mesmo pagando todos impostos, imigrantes não podem participar nas urnas. Ficar longe do Brasil não quer dizer que as preocupações com o país e o desejo de um lugar melhor desaparecem. Todo expatriado tem uma casa para voltar.
E assim, com a expectativa de participar das eleições este ano, eu aproveitei a renovação do passaporte em 2012 e também troquei de zona eleitoral. O título de eleitor, que eu só encontrei no último dia 5 de outubro, agora diz Nova Iorque… ou Nova York.
Outubro e uma animação chegou não sei de onde, lembranças de quando o meu pai me levava para dentro da cabine com uma cédula - naqueles tempos de urna pré-eletrônica. Lembra da canetinha que ficava amarrada na mesa? Hoje levar crianças é ilegal, atitude condenada nas redes sociais. Tá certo, não se deve levar outra pessoa para presenciar um voto secreto, mas sim, devemos todos ensinar as crianças a votar.
O humor pela eleição entre os brasileiros aqui era mais leve, um pouco menos contaminado pelos ataques, o desrespeito pela opinião alheia. Na maioria das vezes a internet não aguenta passar o debate ao vivo, horário político só se procurar pelos candidatos nas redes sociais para assistir.
E aí o dia chegou. Friosinho para lembrar que não é o Brasil, uma fila grande que dobrava quarteirão, muitas pessoas no telefone reclamando do transito para chegar ao local, perguntando quais eram os documentos necessários (somente identificação), como se registrar, se poderiam vir votar ou não, se o CPF estava cancelado, como justificar... Uma mulher se orgulhava de não ter “mais nada, nem conta no banco no país”. Ela foi lembrada da família, amigos e parentes que ficaram pelo homem que a acompanhava. Gente de verde e amarelo! Complexo de Copa ou orgulho mesmo? Mas tanta reclamação! Brasil: sempre bonito, mas cheio de contradições.
A fila andou rápido e apesar de encontrar seguranças na porta do prédio que só falavam inglês e pareciam mais perdidos do que a senhorinha da fila que me disse que ainda não sabia em quem ia votar, o local inteiro estava extremamente organizado. Chequei a sessão pela internet, fui direto, votei em 3 segundos. Aqui fora não tem “cola”, não tem legislativo, não tem panfleto nem cartaz. Dois números se confirmam, você assina o cambito, pega o título novo para guardar com os outros documentos brasileiros, e espera o segundo turno chegar.
Brasileiros votam em Nova York (Foto: Fernanda Godoy / O Globo)Brasileiros votam em Nova York (Imagem: Fernanda Godoy / O Globo)






Luisa LemeÉ jornalista e produtora de documentários. Passou pela TV Cultura e TV Globo em São Paulo, e pelas Nações Unidas em Nova York. Mora nos Estados Unidos há oito anos e escreve aqui sempre às quintas-feiras. Sempre no twitter: @luisaleme

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