domingo, 6 de julho de 2014

O DINHEIRO É SEU, MAS É DELES


Coluna do Carlos Brickmann

Carlos Brickmann
Carlos Brickmann

Ninguém precisa explicar, a gente sabe. Os bancos e seguradoras são excelentes anunciantes, logo não há muito incentivo para que os meios de comunicação mostrem como é que funcionam no mundo real. Acontece que os anúncios nos meios de comunicação existem, na maioria esmagadora dos casos, para atingir aos consumidores de informação e convencê-los de sua excelência e solidez. Se o leitor, ouvinte, telespectador ou internauta não for buscar informações nos meios de comunicação, por que é que os anunciantes irão botar lá seu dinheiro?

Equilíbrio, pois. Não é questão ideológica, como a tratada por Proudhon em A propriedade é um roubo; é questão pura e simples de prestação de maus serviços, sempre em prejuízo do cliente – que, por sinal, é também o consumidor de informações, e que vem sendo privado delas em benefício dos anunciantes.

Compre um celular, desses bem caros, e coloque-o no seguro. O pagamento da conta é imediato. Se o aparelho for roubado – bem, depois que o caro colega apresentar toda uma série de documentos, a seguradora se reserva o prazo de dez dias úteis para analisá-los. E, concluída a análise, o pagamento é prometido para daí a 15 dias úteis. Ou seja, durante mais de um mês o segurado é privado de sua propriedade, embora tenha pago caro por ela, embora tenha feito o seu seguro (e, no caminho, sempre surgem outros obstáculos, dúvidas, quedas do sistema, que fazem com que o prazo do pagamento seja ainda maior). Reclamar à supervisão da seguradora? Perfeito – mas a análise feita por eles demora mais que o tartarugal procedimento para pagar o que devem. Susep, Superintendência dos Seguros Privados? Sim, claro: deve-se procurar diretamente o Saci-Pererê.

Um leitor desta coluna tem conta num grande banco estatal, aberta já há algum tempo. Mudou-se para uma cidade a 3.200 km de distância da anterior. E perdeu o cartão da conta. Que fazer? Simples: tem o direito de sacar R$ 100,00 por dia com cheque avulso, com limite de seis saques por semestre. O novo cartão, já solicitado, leva os famosos 15 dias úteis – se não houver problemas. Abrir uma nova conta no novo domicílio e pedir transferência da conta? Quando tudo estiver pronto, a transferência do seu dinheiro demora de 10 a 15 dias úteis.

Por que? Na era da Internet, da computação, da nuvem, que é que explica a velocidade de diligência dos serviços que lidam com seu dinheiro? Simples: a gerente da agência onde o nosso leitor quer abrir a conta (agência do mesmo banco) diz que não tem como saber se ele é ele mesmo, embora apresente seus documentos. Afinal, o documento pode ser falsificado, sabe como é. E, na era da digitalização, da comunicação imediata on-line, diz a gerente que não há comunicação entre as agências. Por que ele não viaja 3.200 km para tratar desse assunto na agência anterior?

Dizem que os bancos estatais são mais lentos; mas, na verdade, são tão lentos quanto os privados. Tente resgatar um investimento. O dinheiro cairá na sua conta uns cinco dias (úteis) mais tarde. Dia útil? Computador tem folga? Pois é.
Na verdade, é óbvio: estão usando seu dinheiro para ganhar mais algumas quireras, à sua custa. O dinheiro não fica parado: é aplicado. Mas na conta deles, jamais na sua.
Para os meios de comunicação, é complicado brigar com anunciante. Mas será uma boa opção deixar de fazer a matéria e abandonar seus clientes mais fiéis, aqueles que buscam o veículo para obter informação e opinião?

São as normas

Outro leitor desta coluna, que tem problemas crônicos e irreversíveis de saúde, recebeu uma mensagem absolutamente surreal: de acordo com ofício da Secretaria da Fazenda de seu Estado, ele se livrou do imposto de renda e teve isenção parcial de contribuição previdenciária, “com vigência definitiva, tendo em vista tratar-se de doença de caráter permanente”.

Certo? Mais ou menos. Segue-se a seguinte e notável frase: “Em caso de continuidade da patologia que originou a referida isenção, é necessário o requerimento de nova perícia com antecedência de 60 dias do término de vigência do laudo atual”.

Se a doença é, como diz o ofício, “de caráter permanente”, que história é essa de “em caso de continuidade da patologia”, etc., etc.? E quando é que termina a vigência do tal laudo, se em nenhum trecho se faz referência a qualquer prazo que não seja permanente?

Complicado? Pois é. Mas deve haver muita gente que vive de criar essas complicações e administrá-las. Houve época em que jornais e emissoras de rádio cobriam bem essas loucuras burocráticas – numa época em que não havia Internet nem patrocínios maciços de governos aos meios de comunicação. Seria muita maldade imaginar que as compras oficiais, os patrocínios, as gordas verbas publicitárias estatais têm algo a ver com esse esquecimento dos procedimentos que servem apenas para aborrecer os contribuintes (que são, a propósito, os principais clientes dos veículos de comunicação)?

O pior é que nós pagamos – pagamos serviços malfeitos, atendimento pífio. E pagamos também as montanhas de publicidade sobre as virtudes oficiais, montanhas essas que, em nossa cabeça malvada, imaginamos que tenham a propriedade de tapar a visão jornalística dos problemas impostos aos contribuintes.

Colabore! 

Este colunista está reunindo material a respeito do pouco conhecido universo dos planos de saúde, convênios, etc. Há de tudo: anúncios da Agência Nacional da Saúde Suplementar dizendo que é proibido rejeitar clientes por causa da idade (e depoimentos de clientes que foram rejeitados por causa da idade), a farra dos descredenciamentos (que uma nova lei, aprovada há poucos dias, tenta resolver), a luta de seguradoras para não pagar aquilo que deveria ser pago, o estranho fato de empresas do setor passarem incólumes pelos meios de comunicação embora estejam entre as mais citadas nos organismos de defesa do consumidor.

Por que é tão difícil, hoje, fazer um seguro-saúde individual? Por que empresas evidentemente lucrativas, cujos proprietários oferecem grandes recepções a autoridades, ficam tão mal nas listas de atendimento precário e de baixa qualidade? Mandem seus casos para esta coluna (carlos@brickmann.com.br)- casos de mau atendimento, casos de erros, casos de acertos.

E análises (para evitar que só este colunista dê palpite sobre uma área tão complexa) que demonstrem por que os meios de comunicação praticamente ignoram uma área tão importante para seus clientes. Ou comprovem que, apesar da opinião deste colunista, o setor tem ampla e minuciosa cobertura jornalística.

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