sábado, 20 de outubro de 2012

Te cuida, Ford. A Renault já é a quinta montadora do país


Nos últimos anos, a Renault deixou para trás a Peugeot e a Honda e virou a quinta maior montadora do país. Os franceses têm gás para entrar no grupinho das líderes

Michele Loureiro, de 
Fabiano Accorsi/EXAME.com
Concessionária da Renault
Concessionária da Renault: o Brasil virou o segundo maior mercado da empresa
São Paulo - Na última década, o mercado automotivo brasileiro mudou para continuar exatamente do mesmo jeito. O número de montadoras no país passou de 15 para 43 com a entrada de companhias coreanas, japonesas e chinesas. Mas, em meio a essa transformação toda, as líderes de mercado permaneceram as mesmas.
Nada muda no topo: desde 2001, Fiat, Volkswagen, General Motors e Ford ocupam as quatro primeiras posições do ranking, exatamente nessa ordem. Mas esse clubinho está, finalmente, ameaçado — e não por uma faminta montadora asiática, mas pela francesaRenault.
A empresa aumentou suas vendas em 210% desde 2007 e mais que dobrou sua participação de mercado, para 6,7%. Ninguém cresceu tanto. No caminho, deixou para trás sua conterrânea Peugeot e a japonesa Honda para assumir o quinto lugar. Agora, os franceses se aproximam de seu novo alvo: a Ford.
A disputa mais intensa da indústria automotiva brasileira, portanto, não é pelo primeiro, pelo segundo ou pelo terceiro lugar. É na briga pela quarta posição que o bicho está pegando. A diferença chegou a 0,8 ponto percentual em agosto, mas voltou a crescer para 1,7 ponto percentual em setembro.
Cada ponto representa 50 000 unidades vendidas num ano. Há apenas dois anos, a diferença entre as empresas era de 4,2 pontos percentuais. Os franceses já ultrapassaram a Ford em três estados — Rio de Janeiro, Paraná e Roraima — e no Distrito Federal. O objetivo declarado da empresa é alcançar 8% de participação de mercado até 2015.
Virando o jogo
O crescimento recente se torna impressionante quando contrastado com a situação vivida pela Renault no país há sete anos. Após anos de prejuízo, a matriz cogitou fechar as portas da fábrica, instalada no Paraná, e deixar o Brasil. Com uma linha de produtos pequena e modelos que não emplacaram, a linha de produção ficava ociosa — a empresa perdeu dinheiro no país até 2008.
Mas, entre abandonar o país e redobrar a aposta, a matriz decidiu pela segunda opção. Com modelos adaptados ao mercado brasileiro e ancorada pelo volume do popular Sandero, a Renault voltou a dar lucro em 2009 (o montante não é revelado) e, sobretudo, a crescer. Dez anos atrás, a subsidiária brasileira era a décima maior da Renault no mundo. Hoje, é a segunda, atrás apenas da França.
O curioso é que, para crescer tanto a ponto de encostar na Ford, a Renault lançou produtos que atingiram a montadora americana como um míssil teleguiado. Primeiro, no segmento popular. Até 2007, a Ford era uma das líderes nesse mercado com o Ka e o Fiesta, que vendiam 98 000 unidades por ano.
A Renault, que só tinha o popular Clio, lançou em 2007 o Sandero, uma rara novidade num segmento dominado por marcas antigas, como Gol e Mille. O modelo foi um sucesso. Em 2011, a Renault vendeu 148 000 carros populares, ante 121 000 da Ford. No fim do ano passado, a montadora desferiu seu ataque mais direto à montadora americana com a chegada do utilitário esportivo Duster.
Desde seu lançamento, em 2003, o EcoSport, da Ford, vendeu mais de 700 000 unidades e liderou com folga o segmento. Com o Duster, isso mudou. Em apenas dois meses, a Renault roubou a liderança da Ford. Desde então, a disputa é carro a carro. Em seu contragolpe, a Ford antecipou para agosto o lançamento da nova versão do EcoSport, programado inicialmente para o Salão do Automóvel de São Paulo, no final de outubro.
A Ford garante que, desde 18 de setembro, o EcoSport voltou a vender mais que o Duster. Naquele dia, o placar foi 165 a 163 a favor dos americanos — a celeridade com que a Ford divulga esse tipo de informação é uma evidência poderosa do incômodo causado pela ascensão da Renault. Procurada, a Ford não quis dar entrevista.
Com o acirramento da crise na Europa, continuar a crescer no Brasil virou uma prioridade global para a Renault. A venda de carros na Europa está devagar, quase parando. De acordo com a consultoria Alix Partners, o mercado europeu só deve voltar ao patamar pré-crise no longínquo 2020.
Em 2006, foram emplacados 16,8 milhões de automóveis no continente. Para 2013, a expectativa é que sejam vendidos apenas 13 milhões. Durante o Salão de Paris, no final de setembro, o presidente mundial da Renault, o brasileiro Carlos Ghosn, discutiu publicamente a possibilidade de fechar fábricas na região.
No Brasil, o plano de investir 1,5 bilhão de reais entre 2010 e 2015 continua de pé. A verba de marketing foi engordada em 30% desde 2010. A Renault sabe, sobretudo, que terá de aumentar sua gama de produtos para continuar crescendo.
Segundo ­EXAME apurou, a empresa estuda sua entrada em outros segmentos no país — entre eles, picapes (nicho em que a Strada, da Fiat, é líder), utilitários esportivos de luxo (como o Tucson, da Hyundai) e hatchs médios (como o Focus, da Ford).  
Mas, se chegarem, os novos modelos não terão vida fácil. A concorrência não para de crescer. A Ford, evidentemente, não está parada e planeja investir 4,5 bilhões de reais no Brasil até 2015 (incluindo sua unidade de caminhões). Uma série de outros lançamentos pode atrapalhar os planos dos franceses.
Duas­ novidades apresentadas em setembro competem diretamente com o Sandero: os populares Etios, da Toyota, e o HB 20, da Hyundai. A General Motors planeja lançar no Salão do Automóvel o Tracker para competir com o Duster e o EcoSport. A chinesa JAC retomou seus planos de investir 900 milhões de reais em uma fábrica na Bahia.
O risco também é interno. Em dezembro, a Renault vai paralisar por dois meses sua fábrica de São José dos Pinhais, no Paraná. Nesse período, a unidade terá a capacidade ampliada em 30%, para 380 000 veículos por ano.
“O motivo da parada é nobre, mas ela vai atrapalhar nossas vendas em 2013”, diz o francês Olivier Murguet, que há um ano assumiu o comando da subsidiária brasileira. O risco da parada é calculado. Mas, pelo menos durante 2013, vai ajudar a manter o clubinho das líderes exatamente como está.

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