segunda-feira, 15 de setembro de 2014

POEMA DA NOITE Nefelibata ou Águas de março reloaded, por Domingos Guimaraens


“- Trate de tomar sua sopa, seu maluco, mercador de nuvens.”
Charles Baudelaire
chove há tanto tempo
chove há tantos dias
chove há tantas eras
que parece que o certo
é mesmo o mundo assim
chovendo
mesmo que chovendo no molhado
olhando as nuvens
na contraluz elétrica da cidade
vai dando um medo
medo de que o mundo esteja mesmo é nas nuvens
que os prédios se condensem
e que caiam gotas de apartamentos
para o céu

Domingos Guimaraens nasceu no Rio de Janeiro em 1979 - É poeta e artista plástico. Pertence ao coletivo poético Os Sete Novos, ao lado de Augusto de Guimaraens Cavalcanti e Mariano Marovatto e, juntos, publicaram o livro Amoramérica. Domingos ajudou na organização do CEP 20000 (Centro de Experimentação Poética) por alguns anos. Como artista plástico, pertence ao grupo Opavivará.

Chuck Berry - Johnny B-Goode

CARLOS BRICKMANN: Se pesquisas nunca errassem, não precisaria haver eleições


Pesquisas deram com tanta certeza a vitória de FHC que o candidato até sentou na cadeira de prefeito, apenas para vê-la ser desinfetada pelo vencedor, o ex-presidente Jânio Quadros (Foto: Acervo Estadão)
Pesquisas deram com tanta certeza a vitória de FHC em 1985 que o candidato até se sentou na cadeira de prefeito, apenas para vê-la ser desinfetada pelo vencedor, o ex-presidente Jânio Quadros (Foto: Acervo Estadão)

Jaques Wagner, candidato petista ao governo baiano em 2006, estava arriscado a não ir ao segundo turno: de acordo com as pesquisas, perdia por 48 a 31. Ganhou no primeiro turno. O presidente americano Harry Truman, em 1948, perdia longe nas pesquisas para seu adversário Thomas Dewey, governador de Nova York. Ganhou – e festejou a reeleição com uma foto clássica, mostrando a manchete do Chicago Daily TribuneDewey derrota Truman.
Em 1985, Fernando Henrique estava tão vitorioso nas eleições de São Paulo que até posou para fotos sentado na cadeira de prefeito. Perdeu para Jânio Quadros, que tinha vencido eleições pela última vez havia 25 anos. Até as garrafas de vinho Chateau Petrus de sua adega sabiam que Paulo Maluf se elegeria prefeito de São Paulo em 1988, seguido, diziam as pesquisas, pelo peemedebista João Leiva, ficando em terceiro, bem perto do segundo, a petista Luiza Erundina. Erundina ganhou.
Mas o mundo não é só política. Nos anos 50, a Ford Motor Company decidiu retomar a posição de maior indústria automobilística do mundo, que tinha perdido para a GM uns 30 anos antes. Fez uma pesquisa caríssima, cobrindo todo o mercado americano; e nela teve tal confiança que o carro que daí resultou recebeu o nome de Edsel, o filho único – e falecido – de Henry Ford. Foi um dos maiores fracassos da história da empresa americana.
E daí? Daí, nada. Pesquisas também registram longo histórico de acertos. Mas é bom lembrar que, se pesquisa nunca errasse, nem precisaria haver eleições.
Questão de data
A última pesquisa, do Ibope, mostrou leve crescimento de Dilma e leve queda de Marina, comparadas à pesquisa anterior, do Datafolha. Ou não, como diria Caetano: a pesquisa Ibope foi divulgada por último, no dia 12, mas com base em entrevistas obtidas entre os dias 5 e 8. A pesquisa Datafolha foi divulgada antes, com base em entrevistas obtidas nos dias 8 e 9. É, portanto, mais recente.
Se for para comparar pesquisas de institutos diferentes (o que não é correto), Dilma caiu um pouquinho, Marina subiu um pouquinho, mas mantendo trajetória de alta.
Vergonha 1
Caro leitor, sempre que lhe contarem algo feio demais para ser verdade, acredite: deve ser verdade. Juízes e desembargadores do Rio reivindicam um extrinha para ajudá-los a pagar a educação de filhos e dependentes entre 8 e 24 anos. Sabe aquilo que você paga ou paga? Pois é: quem mandou não escolher um serviço em que possa transferir a conta?
O extrinha pode ir a R$ 7.250,00 por mês.
Vergonha 2
Enquanto as tropas do sultão turco Maomé 2º se aproximavam, a elite do Império Bizantino discutia, em Constantinopla, quantos anjos poderiam dançar na ponta de uma agulha; discutia-se também qual o sexo dos anjos. Hoje, no Brasil, há gente que deveria pensar em política e prefere discutir dogmas de fé – afinal, se Deus criou o mundo em sete dias ou se o Universo nasceu numa grande explosão, há uns 13 bilhões de anos, em que isso afeta a situação de quem não aguenta mais o aumento diário de preços?
Enquanto a elite política brasileira discute Adão, Eva e Darwin, ocorre em São Paulo o Encontro Nacional Evoliano, entre os dias 10 e 12: em palavras mais simples, uma reunião internacional nazista, homofóbica e racista. “Evoliano” é referente a Julius Evola, falecido líder neofascista; entre os participantes estão Alain Soral e Aleksandr Dugin, inspiradores das leis discriminatórias contra homossexuais vigentes na Rússia.
De acordo com o delegado aposentado da Polícia Federal Marcelo Itagiba, vários participantes não poderiam, conforme a lei brasileira, ter recebido autorização de entrada no país.

A enorme burrice de chamar de “delator” quem coopera com investigações na Justiça. Em países sérios, não se procura denegrir nem demonizar quem passa para o lado certo e ajuda a desvendar crimes e a colocar bandidos e ladrões na cadeia

Coluna do 

Ricardo Setti


Nenhum país sério usa termo depreciativo para designar quem coopera com a Polícia e a Justiça no desmantelamento de organizações criminosas. Já no Brasil... (Ilustração: partidoxlalibertad.com)
Nenhum país sério usa termo depreciativo e maldito para designar quem coopera com a Polícia e a Justiça no desmantelamento de organizações criminosas. Já no Brasil… (Ilustração: partidoxlalibertad.com)
O ex-diretor de Abastecimento e Refino da Petrobras está, como se sabe, fazendo chacoalhar as vigas mestras do governo com suas explosivas declarações sobre um enorme esquema de corrupção dentro da estatal fundado em propinas pagas por empreiteiros cujo resultado irrigava os bolsos de políticos da base de sustentação do lulopetismo.
O objetivo de Costa, naturalmente, é obter vantagens (LEGAIS!) perante a Justiça — no caso, tentar diminuir o tempo que passará na cadeia por ser o operador do esquema além de, eventualmente, conseguir que parentes –  como filhas e genros — sejam exonerados do processo a que ele responde. Mas ninguém duvida de que, com seu depoimento, do qual VEJA desta semana adianta importantes pontos, o ex-diretor está prestando um grande serviço ao país e aos bons costumes públicos.
E aí chegamos ao ponto deste post: cooperar com a Polícia, o Ministério Público e a Justiça para obter redução da pena — e fazer com que bandidos sanguinários chefes de quadrilhas, por exemplo, ou, como no caso, ladravazes de dinheiro público sigam para a penitenciária — recebeu, no Brasil, o pavoroso nome de “delação premiada”.
Não sei, não, se essa denominação não foi proposital, espalhada, nos primeiros anos em que o instituto começou a vigorar, com o objetivo de desmoralizá-lo. “Delação” é coisa feia, horrorosa. “Delator” — que é como TODO MUNDO está chamando Paulo Roberto Costa — é qualificativo enormemente depreciativo, é maldito, é razão generalizada, quase universal, de desprezo por quem assume esse papel.
É uma rematada burrice, na melhor das hipóteses, qualificar como “delator” criminosos que resolverm colaborar para que seja feita justiça. Esse qualificativo ATRAPALHA a Justiça, INIBE possíveis integrantes do crime organizado, por exemplo, que desejam mudar de lado e, em troca de penas mais leves, ajudem a desmantelar quadrilhas e colocar seus chefões atrás das grades.
Em outros países, os legisladores evitaram cuidadosamente tratar com esse qualificativo desmoralizante os colaboradores.
O principal exemplo foi a Itália, que aprovou legislação específica para fazer frente à brutal onda de terrorismo de extrema esquerda e de extrema direita desencadeado nos anos 70 — os chamados “Anos de Chumbo” — e que prosseguiria ainda por parte dos 80, até sua eliminação pelo Estado democrático.
Também no combate à Máfia e similares a República Italiana fez o mesmo, e para ambos os casos surgiu a figura dos pentiti, os “arrependidos” — pessoas que pertenceram a quadrilhas ou grupos terroristas e que, depois de presas, resolveram “arrepender-se” e colaborar com as investigações. O sistema legal os chama decollaboratori di Giustizia, ou seja, colaboradores da Justiça.
A Colômbia, país imerso em virtual guerra civil há mais de meio século — e cujas forças da ordem, felizmente, vêm esmagando aos poucos os narcoguerrilheiros das chamadas “Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia” (Farc) — seguiu pelo mesmo caminho, obtendo grande êxito e desencadeando operações extremamente bem sucedidas graças a ex-terroristas que mudaram de lado e passaram a municiar o governo com informações.
Lá, por lei, isso não é chamado de “delação”, mas de colaboración eficaz con la Justicia. O “eficaz ” é exigência presente não apenas na lei colombiana, mas em diversas legislações, por razões óbvias: a cooperação precisa dar resultados para que o preso obter benefícios legais.
Uma rara foto dos principais comandantes da narcoguerrilha das Farc: Alfonso Cano (de barba), foi morto em novembro de 2011 com o auxílio de réus colaboradores, o mesmo ocorrendo com "Mono Jojoy" (de boina), em setembro de 2010. No meio deles, o fundador das Farc, Manuel Marulanda, que teve morte natural em 2008 e foi sucedido por Cano (Foto: El Tiempo)
Uma rara foto dos principais comandantes da narcoguerrilha das Farc: Alfonso Cano (de barba), foi morto em novembro de 2011 com o auxílio de réus colaboradores, o mesmo ocorrendo com “Mono Jojoy” (de boina preta, em primeiro plano), em setembro de 2010. À direita, o fundador das Farc, Manuel Marulanda, que teve morte natural em 2008 e foi sucedido por Cano (Foto: El Tiempo)
No caso da Colômbia, ao lado de um serviço de inteligência militar elogiado pelos Estados Unidos, foi essencial a colaboração de ex-terroristas que mudaram de lado nas operações mais exitosas das Forças Armadas contra o terror das Farc — entre outras, a localização e morte, em seu superprotegido bunker na Amazônia colombiana, de um dos mais carismáticos e também mais sanguinários, corruptos e cruéis dirigentes terroristas, Victor Julio Suárez Rojas, o “Mono Jojoy”, em setembro de 2010, e o golpe duríssimo que foi a morte pelas Forças Armadas do líder supremo Alfonso Cano, pouco mais de um ano depois, em outra operação militar na selva. 
A burrice brasileira com a “delação” praticamente não existe em país algum que mantenha instituto semelhante. Até em países menos desenvolvidos como a Guatemala foi criada, por lei de 2006, a figura docolaborador eficaz.
Para não falar, é claro, nos Estados Unidos, onde os acordos entre criminosos e os promotores de Justiça são conhecidos em toda parte, graças, sobretudo, ao cinema e às séries de TV. O instituto da substantial assistance in the investigation or prosecution (ajuda substancial na investigação ou no processo) beneficia réus ou presos já condenados que cooperem com o governo — por meio do promotor — prestando informações sobre co-réus, cúmplices ou outras pessoas alvo da mesma investigação.
Curiosamente, no Brasil, o Código Penal, mãe de todas as leis criminais, não confere nenhuma denominação pejorativa a quem coopera com as investigações, como se pode ver no parágrafo único do artigo 159, que trata do crime de extorsão mediante sequestro:
“§ 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.”
A Lei de Proteção a Vítimas e Testemunhas (lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999) tampouco menciona “delação” ou delator, utilizando expressão muito mais adequada ao referir-se, em seu capítulo II, a “reús colaboradores”.
O mesmo se dá com a Lei dos Crimes Hediondos (lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990), que prevê, no parágrafo único de seu artigo 8º, que“o participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços”.
E por aí vai. A legislação, por meio de seus principais diplomas legais que trataram do tema, NÃO denomina “delator” quem coopera, nem “delação premiada” a cooperação com a Justiça em troca de minorar a pena do réu.
Quem passou a usar a expressão horrenda, depreciativa e que NÃO ESTIMULA PESSOAS A MUDAREM PARA O LADO CERTO foram, portanto, juristas, advogados, autoridades da própria Polícia e, claro, como sempre ocorre, a imprensa.
Em poucas palavras, todos eles estão prestando um grande desserviço ao país e à causa da Justiça.

"Você é trouxa". Por Juliana Doretto

Na 'Visita' de hoje, Juliana enfrenta em São Paulo jovens de boa família e péssima educação

14/09/2014 09h52 - Atualizado em 14/09/2014 15h05


O bumbo da discórdia (Foto: Freeimages.com)

Domingo, 6h50. Da manhã. Eu dormia meu justo sono do fim de semana quando batidas de bumbo e outros mais me acordaram em sobressalto. Estava em São Paulo.
Olho pela janela: na praça, em frente ao meu prédio, um grupo de jovens, com gravatas afrouxadas, camisas desabotoadas e vestidos justos, é responsável pela balbúrdia.
Saíram de alguma festa de formatura e acharam por bem acordar os moradores da rua perto de sua grande universidade privada. Barulho ali é comum de madrugada, mas antes das 7 da manhã de um domingo pareceu-me um pouco demais.
Enfurecida, visto um roupão sobre o pijama e saio de casa, com chinelo de quarto e cara amassada. O porteiro me olha assustado. Atravesso a rua, e chamo a atenção, muito educadamente, dos jovens rebeldes sem causa. “Minha gente, não são nem sete da manhã. Eu trabalhei ontem, estou cansada...”
Eles estavam revoltados porque algum vizinho enfurecido como eu resolveu jogar ovos nos moços barulhentos. Acharam que tinha sido eu. Não, meus queridos: eu seria muito idiota se tivesse lançado ovos primeiro e conversado depois...
Tudo ia razoavelmente bem até que um dos fulanos pede, dentro de sua embriaguez matinal, para falar comigo: “Você quer mudar o sistema? Chama a polícia”. Ao que respondo: “Eu já cansei de chamar a polícia para conter a bagunça dessa universidade”.
(Parêntesis: há casos absurdos, em que os estudantes ocupam a rua -- uma via que dá acesso a um importante hospital --, e não deixam mais nenhum carro passar. Um PM já me disse que eles "não mexem com os estudantes, porque ali tem muito filho de juiz e advogado”)
Pois bem: estávamos na parte em que disse que já tinha tentado a polícia inúmeras vezes. E ele então me diz: “Você é trouxa”.
Sabe, caro leitor, paciência tem limite. Mas, em vez de falar “trouxa é você”, ainda me dispus a falar: “Trouxa é quem acha que o sistema não pode ser mudado”.
E a coisa esquentou. O menino quis dizer que ele podia fazer barulho, porque estudava “naquela faculdade grande ali, ó” e que fazia “pós- graduação”.
Quando respondi que tinha cursado uma universidade maior que a dele, e pública (o que pouca diferença fazia, porque ninguém é melhor que ninguém por ter estudado aqui ou ali, mas na hora foi o que saiu...), choveram vaias e gritos de “Vai casar, seu problema é falta de homem”.
Nenhum respeito pelo espaço público e pelo direito do outro. Zero bom senso. Arrogância. Machismo. E, convenhamos, certo anacronismo, porque “vai casar” foi um pouco demais.
Pela camiseta que alguns traziam por cima das camisas sociais, via-se que eles serão engenheiros civis. Que projetos farão esses profissionais? Pensarão nos danos que causarão quando arquitetarem um shopping center? Tratarão com respeito mulheres que forem suas colegas de trabalho? Tratarão com respeito os operários, que, ao contrário deles, não estudaram naquela universidade e não têm pós-graduação?
Pode-se pensar que eles ainda são crianças, imaturos, que com o tempo entenderão. Posso ser trouxa, mas acho que milagres não acontecem – pelo menos não assim. Acho que eles continuarão a achar que os outros – os que querem retidão, os que pedem consideração, os que acolhem o bom senso -- são os trouxas. E não eles mesmos. Mas, enfim, o que uma trouxa como eu pode saber, não é?

perfil Juliana Doretto - blog da Ruth (Foto: ÉPOCA)






Soneto da Educação


Um diagnóstico da nossa educação em uma conversa com o primeiro ministro da área na era Lula

RUTH DE AQUINO
12/09/2014 20h58


De repente, não mais que de repente, fez-se de inteligente o ignorante, fez-se de próximo o distante, fez-se da educação uma aventura edificante. De repente, todos os candidatos à Presidência só falam naquilo: educação. O primeiro ministro da Educação da era petista, Cristovam Buarque, pressionou Lula a fazer a revolução que, hoje, todos prometem. Caiu por isso. A seguir, uma conversa com ele, hoje senador. Para quem tem memória curta.
ÉPOCA – Educação virou “prioridade” no horário eleitoral. Por que a súbita obsessão retórica?
Cristovam Buarque – 
A realidade mostrou que educação é fundamental não só para cada indivíduo, mas para o desenvolvimento científico e tecnológico do país. Sem isso, a economia fica para trás, produzindo bens primários e importando bens de alta tecnologia.
ÉPOCA – O que deu certo e errado nos 12 anos de governo do PT?
Cristovam –
 Deu certo o lento avanço na universalização, não deu certo o salto necessário para a qualidade. A escola, ampliada, ficou para trás. Três brechas se aprofundam: entre a educação no Brasil e noutros países, entre a educação dos ricos e dos pobres, entre as necessidades de educação e o que a escola oferece.
ÉPOCA – Por que o senhor saiu do governo?
Cristovam – 
O presidente Lula cansou de algumas falas minhas. No último encontro, eu lhe disse que não fazíamos o dever de casa para mudar a economia. O desinteresse político de Lula pelo longo prazo o levou a gestos imediatos no ensino superior, sem dar atenção à educação de base. O resultado foi aumento no ensino superior, com qualidade desastrosa. Lula temia minha reação à mudança da Bolsa Escola para Bolsa Família, que perderia a conotação educacional, ao sair do MEC para o Ministério do Desenvolvimento Social. Lula usa espertamente a ideia de que é possível saltar para a universidade, sem passar pela educação de base. E esse discurso, mesmo que demagógico, dá votos, como se comprova.
ÉPOCA – Quais foram suas maiores frustrações como ministro?
Cristovam –
 Primeiro, a suspensão do programa para a erradicação do analfabetismo, logo depois que saí. Também a paralisação do programa Escola Ideal, embrião da Federalização da Educação de Base. E os projetos que ficaram na gaveta da Casa Civil, entre eles o Programa de Apoio ao Estudante, que depois virou Prouni.

ÉPOCA – Que nota daria ao PT, com base em nossos indicadores educacionais?
Cristovam – 
É fácil: a mesma nota do Ideb. Menos de 5: reprovado. Se tivéssemos levado adiante a proposta de adotar as escolas de cidades pelo governo federal, hoje já teríamos 3 mil cidades com educação de alta qualidade.
ÉPOCA – O que acha da aprovação automática?
Cristovam –
 Uma medida errada. É como dar alta ao doente, porque ele ficou um tempo determinado no hospital, sem ao menos tomar a pressão dele. Serve apenas para mostrar diminuição no número de doentes.
ÉPOCA – O que acha das cotas raciais?
Cristovam –
 Sou a favor, como medida paliativa, necessária para mudar a cor da cara da elite brasileira, enquanto se faz o certo e definitivo: negros e brancos, pobres e ricos em escolas com a mesma qualidade.
ÉPOCA – Algum modelo estrangeiro é inspiração para uma revolução na educação?
Cristovam –
 Os melhores exemplos de países que partiram de níveis parecidos são Coreia do Sul e Irlanda. Para acabar com a vergonha em todas as escolas de uma cidade, bastam poucos anos. Para fazer a mudança em todas, mais de 20.
ÉPOCA – Que metas devem ser perseguidas?
Cristovam – 
O governo federal deveria escolher e adotar escolas de cidades e implantar um novo sistema para substituir o atual. As escolas federais, melhoradas, podem ser um padrão a espalhar. Uma revolução na educação de base custaria 6,4% do PIB. Um grande programa para a população adulta, entre 9% e 10%. Espero um presidente que diga: “Só descansarei quando nenhuma família precisar de Bolsa Escola”.
ÉPOCA – O senhor diz que a violência na escola é produto da desvalorização do magistério. Como valorizar o professor?
Cristovam – 
Criando uma Carreira Nacional dos Professores, com salário capaz de atrair para o magistério os jovens mais brilhantes do ensino superior. Para isso, precisamos pagar R$ 9.500 por mês. Escolher esses professores de maneira rigorosa, exigir dedicação exclusiva e submetê-los a avaliações para substituir quem não tiver o desempenho desejado. Fazer escolas bonitas e confortáveis, equipadas com a mais moderna tecnologia. Todas em horário integral.

Cartas de Londres: Código de conduta policial para revistar cidadãos


Beatriz Portugal
Chegou à estação e foi parado por um policial que lhe perguntou nome, endereço, de onde vinha, para onde ia e o que carregava na mochila. Respondeu tudo, mas o policial pediu para revistar sua mochila. Sem saber quais eram seus direitos naquela hora, ele permitiu que a mochila fosse aberta.
Não encontrando nada ameaçador, o policial pediu desculpas e entregou-lhe um recibo daquele pequeno interrogatório, com nome, data e horário.
Passou pela catraca e lia surpreso o que estava escrito no papel – “investigações relacionadas com terrorismo” – quando foi parado por outro policial na plataforma do metrô, que lhe fez as mesmas perguntas. Ele explicou que já tinha sido interrogado pelo outro policial logo ali na entrada da estação e mostrou o recibo. O policial agradeceu e o deixou para esperar o metrô sob os olhares curiosos dos outros passageiros.
Ele sentiu-se desconfortável com a obviedade de que havia sido o único a ser parado nos 10 minutos em que esteve ali. Ao redor, eram todos brancos com cara de europeu. Ele, apesar de branco, ostentava uma bela barba e o nariz – digamos, avantajado – já havia mais de uma vez feito as pessoas perguntarem se era árabe.
O episódio, acontecido com meu marido há uns anos, me veio à memória esses dias após o governo anunciar que todas as forças policiais da Inglaterra e do País de Gales concordaram em adotar um código de conduta mais rigoroso relativo aos poderes de interrogar e revistar cidadãos comuns.
A mudança entra em vigor depois que governo admitiu que “alguns abusos” desse poder danificaram as relações entre policiais e cidadãos. Segundo um estudo feito pela própria polícia, 27% das buscas realizadas no ano passado não satisfizeram a exigência de “motivos razoáveis ​​para suspeitar” de alguém, ou seja, podem ter sido ilegais.
Entre as mudanças está a de que um policial precisa pedir autorização superior antes de parar qualquer pessoa para uma busca, algo que não acontecia anteriormente, quando bastava o policial achar que existiam os tais bons motivos para suspeitar de alguém.
Isso quer dizer que de alguma maneira meu marido agia de modo suspeito quando chegou à estação de metrô ou então foi vítima de discriminação.
O mais interessante foi a reação dos seus colegas de trabalho. Sua chefe, uma advogada, disse que a experiência pela qual ele tinha passado era absurda, que tinha certeza que era porque os policiais tivessem acreditado que ele fosse árabe. Disse que ele deveria reclamar e pedir uma cópia do prontuário policial. Outros colegas concordaram e disseram que nunca haviam sido parados daquela maneira e até chegaram a se desculpar pelo tratamento dado a um estrangeiro.
Quem sabe o novo código a ser seguido pelas forças policiais evite constrangimentos semelhantes para qualquer outro cidadão, estrangeiro ou não.

Beatriz Portugal é jornalista. Depois de viver em Brasília, São Paulo e Washington, fez um mestrado em literatura na Universidade de Londres e resolveu ficar

A urgência de ir fundo contra os fundos de pensão



Edição do Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Jorge Serrão - serrao@alertatotal.net

A liderança da base aliada do governo fará de tudo para que os diretores de fundos de pensão não sejam convocados a depor na pizzaiola CPMI da Petrobras. Qualquer bebê de colo sabe que abrir as caixas-pretas dos fundos de previdência dos empregados de empresas de economia mista significa escancarar o sistema petralha de aparelhamento financeiro do Estado.

A intenção governista de blindar os fundos será praticamente impossível por causa da delação premiada de Paulo Roberto Costa e por causa das revelações da contadora Meire Poza – que trabalhava para o doleiro Alberto Yousseff. Meire denunciou que houve interferência política do presidente do Senado, Renan Calheiros, e do deputado André Vargas (ex-PT-PR) para fazer negócios com os fundos Postalis (dos Correios) e Funcef (da Caixa). O Globo revelou que as negociações, que renderiam R$ 50 milhões a Youssef, não foram adiante porque o doleiro acabou preso em março durante a Operação Lava-Jato.

Investidores da Petrobras já cansaram de denunciar o esquema dos fundos de pensão Previ e Petros, junto com o Funcef, para eleger governistas disfarçados de “representantes dos acionistas minoritários” nas eleições dos conselhos de Administração e Fiscal da Petrobras. O caso já é alvo de processos sancionadores na Comissão de Valores Mobiliários. Além da CVM, a situação tende a virar caso de Justiça, com processos movidos por investidores.

Se forem fundo nas relações entre os fundos de pensão, os esquemas políticos e as falcatruas identificadas pela Operação Lava Jato, a República Sindicalista do Brasil sofrerá seu grande baque.

Cuecagem




© Jorge Serrão. Edição do Blog Alerta Total de 13 de Setembro de 2014.