segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Os esquecidos do mensalão



BMG, Daniel Dantas, Fernando Pimentel, Romero Jucá... Eles aparecem no valerioduto – mas não estão (ainda) em julgamento

O EXCLUÍDO
Sede do BMG em Belo Horizonte, Minas Gerais. Segundo a PF, o banco participou do mensalão. Depois, obteve negócios no governo (Foto: Beto Novaes)

O mensalão, o mais grave esquema de corrupção da história recente do Brasil, funcionou por dois anos. Demorou mais sete anos para ir a julgamento. Há três semanas, o Supremo Tribunal Federal (STF) está mobilizado para julgar 38 acusados de fazer funcionar um mecanismo criminoso de compra de apoio político no Congresso. Isso significa que, ao final, o mensalão terá sido esclarecido? Infelizmente, não. Participantes fundamentais estão fora da ação examinada pelo Supremo. O banco BMG, que abasteceu o mensalão com empréstimos, não foi incluído. O banqueiro Daniel Dantas, que, segundo o inquérito da Polícia Federal (PF), forneceu recursos, não está lá. O papel do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi deixado de lado. Com eles, seria outro julgamento. ...

(Foto: Adriana Spaca/Folhapress,Sérgio Castro/Ag. Estado, Tomás Arthuzzi/Ed. Globo e Sergio Lima/Folhapress)
O BMG é a ausência mais significativa no julgamento. A PF queria investigá-lo antes que a denúncia fosse oferecida ao Supremo. O Ministério Público tinha pressa. Resultado: embora a PF tenha avançado nas investigações, o BMG está fora do julgamento. Hoje, o banco é investigado pela Justiça Federal em Minas Gerais.

O relacionamento PT-BMG começou logo no início de 2003. Em depoimento à PF, o presidente do banco BMG, Ricardo Guimarães, disse que, no início daquele ano, Marcos Valério o procurara para tratar de um empréstimo para o PT. Logo depois, o banco emprestou R$ 2,4 milhões ao partido. No mesmo período, Valério conseguiu duas audiências com o então ministro José Dirceu. Numa delas, Ricardo Guimarães levou o pai, Flávio Guimarães, presidente do grupo BMG. No final de 2003, a pedido de Valério, o BMG contratou Ângela Saragoça, ex-mulher de Dirceu. Se as investigações sobre o BMG estivessem nos autos, a situação de muitos réus se complicaria. Um deles seria Dirceu.

Em agosto de 2004, um decreto presidencial abriu o mercado de crédito consignado para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Em apenas oito dias, o BMG conseguiu autorização para oferecer empréstimos com desconto no contracheque para os segurados. Outros dez bancos esperaram pelo menos dois meses pela autorização. Numa auditoria, o Tribunal de Contas da União afirma que “não se encontram razões para a prioridade dada ao pedido do BMG”. O governo enviou 10,6 milhões de cartas aos segurados do INSS para informá-los sobre a possibilidade de obtenção de empréstimos. A Procuradoria da República no Distrito Federal denunciou o ex-presidente Lula por isso. Apenas três meses de operação em condições tão favoráveis foram suficientes para o BMG vender sua carteira de empréstimos para a Caixa Econômica Federal por R$ 1 bilhão.

Um relatório da Polícia Federal afirma que o BMG ajudou a lavar dinheiro para o mensalão. Uma das agências de publicidade de Valério recebeu R$ 10 milhões da Visanet, empresa da qual o Banco do Brasil é um dos sócios. Esses R$ 10 milhões foram enviados ao BMG. De acordo com a polícia, após uma operação de disfarce, um dos sócios de Marcos Valério, Rogério Tolentino, enviou cerca de R$ 6,6 milhões à corretora Bônus Banval, que distribuiu os recursos a parlamentares do PP. Num documento produzido para rebater as acusações, o BMG afirma que jamais “concorreu de forma voluntária” para o repasse de recursos ao PT ou a políticos aliados.

A ausência do BMG no STF foi lembrada, na semana passada, pelo advogado Luiz Francisco Corrêa Barbosa, defensor do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB). Depois de rememorar a ação judicial que Lula sofre por causa da ajuda ao BMG, Barbosa acusou o ex-presidente de envolvimento no mensalão. “Não só ele sabia, digo eu aqui, como ordenou o desencadeamento de tudo isso que essa ação penal está discutindo”, disse Barbosa. A oratória é inócua. Em 2005, Jefferson afirmou que Lula não sabia do mensalão. O Ministério Público Federal optou por não investigar Lula. Em 2009, o STF rejeitou o pedido de Barbosa para incluir Lula como réu.

No ano passado, o delegado Luís Flávio Zampronha, da PF, entregou seu segundo relatório sobre o caminho do dinheiro no valerioduto. No documento, aponta a participação do banqueiro Daniel Dantas no esquema do mensalão. As empresas de Dantas contrataram agências de Marcos Valério e pagaram R$ 3,6 milhões. O relatório revelou ainda novos beneficiários do valerioduto, como o atual ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, e o senador Romero Jucá (PMDB-RR). Para não atrasar a ação que corria no STF, o Ministério Público decidiu desmembrar a ação. Assim, eles escaparam dos holofotes no maior julgamento dos últimos anos.

Por Marcelo Rocha e Leandro Loyola
 
Resposta do BMG à revista ÉPOCA

Neste domingo, o banco BMG publicou a seguinte nota, relativa à reportagem 'Os esquecidos do mensalão', publicada na edição 744 de ÉPOCA

"Embora o BMG venha encaminhando à Revista Época de forma sistemática esclarecimentos sobre a sua atuação no crédito consignado, de maneira surpreendente, mentirosa, falsa e dolosa, a recente edição de n° 744 faz acusações ao BMG e aos seus dirigentes.

Considerando que a Revista ignorou completamente o que fora informado e para que a verdade dos fatos seja restabelecida, o BMG esclarece:

(I) Ao contrário do que maldosamente afirma a Revista, o BMG atua no crédito consignado desde 1998 e não em 2004, como informa a reportagem. A atuação de sucesso do BMG nesse segmento já o tornava líder desde 2000. Logo, com a expertise adquirida, encontrava-se apto a se conveniar com qualquer órgão ou entidade;

(II) Ao apreciar o convênio do BMG com o INSS, o Tribunal de Contas da União – TCU, através de seus Ministros, decidiu que “os vícios nos termos de convênio foram tempestivamente identificados pela Procuradoria, não havendo notícias de quaisquer efeitos danosos à instituição tampouco aos beneficiários da Previdência Social, consoante a propósito concluído pela própria Corregedoria da entidade”. “Ademais, não estou convencido de que a celeridade na condução do processo do BMG foi responsável, como aduz a unidade técnica, pelos lucros auferidos no banco nas operações objeto do convênio”. “Nesse sentido, observo que o BMG não atuou sem concorrência, já que a Caixa Econômica exercia a atividade de empréstimos em consignação há algum tempo, com a vantagem de ser uma instituição sólida, de alta credibilidade e pagadora de benefício”.

“Outrossim, evidencia-se da tabela de fls. 51/54 do volume principal que a taxa de juros praticada pelo BMG era bem competitiva, o que justificaria a alavancagem significativa desse negócio. Tal particularidade, não mencionada nos pareceres, é de suma importância, já que o tomador de empréstimo sempre vai buscar a condição que lhe é mais favorável. Cabe assinalar, por oportuno, que os resultados do banco continuaram a ser expressivos mesmo depois da entrada de outras instituições financeiras nesse mercado, consoante observado na tabela de fls.04/06 do vol.7.”;

(III) Em sentido totalmente oposto do noticiado na matéria, o Tribunal de Contas da União também examinou as cessões de crédito feitas pelo BMG à Caixa Econômica Federal, tendo concluído que “a operação tinha amparo legal, foi financeiramente vantajosa para a CEF”, não vislumbrando “qualquer indício de violação ao princípio da moralidade” (Acórdão n. 930/2006-TCU ). Assim, leviano sugerir que o BMG tenha sido beneficiado nesta ou em qualquer outra contratação com o Governo Federal e suas autarquias;

(IV) Em relação às operações firmadas com o PT e com as empresas ligadas ao Sr. Marcos Valério em data bem anterior ao convênio firmado com o INSS, o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) reconhece os empréstimos como reais e verdadeiros, pois foram concedidos pelo banco com “efetiva observância da legislação e princípios de boa técnica bancária”. Por fim, o acórdão entende que os empréstimos foram concedidos “mediante garantias, reais e pessoais, suficientes, no momento de constituição, a efetivamente segurar o risco da operação”.

A falsidade das informações desqualifica a matéria e desacredita a Revista.

Esta nota não impede as medidas judiciais devidas em face da repugnante e mentirosa matéria."
Fonte: Época.com - 20/08/2012

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