quinta-feira, 26 de julho de 2012

Inadimplência e spread bancário, por Murillo de Aragão



Atualmente, existe um grande debate sobre inadimplência no Brasil. E com toda razão. Afinal, de acordo com a Serasa Experian, o nível de inadimplência do consumidor encerrou o primeiro semestre de 2012 com crescimento de 19% em relação ao mesmo período de 2011.
Para a Associação Comercial de São Paulo, o calote nos pagamentos cresceu 18,5% na primeira quinzena de julho em relação ao mesmo período do ano passado. Imediatamente, alguns poucos defensores dos elevados spreads bancários passaram a justificar a necessidade de se aumentar o custo do dinheiro.
Alegam que o risco de emprestar aumenta e que, portanto, a existência de margem de segurança justifica cobrar mais caro. É uma explicação cínica. Até mesmo pelo fato de o custo absurdo do dinheiro no país ser razão determinante para a inadimplência. Em uma sociedade que é deslumbrada com o consumo, tal situação é crítica.
Considerando o Brasil de hoje, a justificativa é inacreditavelmente tendenciosa e sua finalidade é tão somente manter o custo do dinheiro nas alturas. Mesmo com a dramática redução da taxas de juros, o spread bancário no país é um dos mais altos do mundo. E visa, obviamente, manter a lucratividade do setor acima da média mundial.
Em maio, o Ministério da Fazenda apresentou um estudo em que o Brasil aparecia com um spread bancário acima de países com economias combalidas e em precária situação fiscal, como Portugal. No México, Rússia, China, Uruguai, Canadá e Coreia do Sul o spread está entre 4% e pouco mais de 1%. No Brasil estava, em maio, acima dos 28%!
Como se sabe, o spread é cobrado a partir de uma fórmula que envolve custos administrativos, depósito compulsório e carga tributária. Mesmo considerando o “custo Brasil”, que é maior do que o de outros países, não há justificativa plausível para se aumentar o spread bancário. Tampouco mantê-lo no atual patamar.
Nem devemos acreditar que a inadimplência justifique tamanha margem. A questão da inadimplência se relaciona com a oferta de crédito. Temos uma oferta de crédito próxima dos 50% do PIB. A inadimplência também se relaciona com o custo do crédito.
Ora, com spreads estratosféricos, é natural que o custo do dinheiro seja abusivo e provoque inadimplência. Por fim, a questão também dialoga com a qualidade do crédito. Caso esta não seja boa, existe uma boa opção para não penalizar todo o sistema: não oferecer o crédito.
Há muito as cláusulas leoninas podem ser revistas por conta do direito. No Brasil de hoje, quem se aventurar a questionar judicialmente um contrato bancário cai em uma lista negra e fica praticamente banido do meio.
O fato de o Brasil ter vivido tanto tempo como pedinte junto ao mercado financeiro nacional e internacional gerou uma espécie de complacência nefasta com o absurdo dos juros e do spread bancário.
Aos poucos, o Brasil acorda dessa letargia. A partir dos ataques de Dilma e Mantega, o sistema financeiro foi constrangido a se enquadrar. No entanto, existe muito a ser feito para colocar o spread bancário brasileiro no nível daquele praticado no México, por exemplo.
O governo não deve parar de pressionar o sistema financeiro privado nacional a se adequar à nova realidade do Brasil. Nenhum dos grandes bancos vai quebrar. A margem de manobra deles é imensa.

Murillo de Aragão é cientista político

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