segunda-feira, 1 de abril de 2013

A peça, por Téta Barbosa



Ele era simpático e sorridente. Chegou falante e puxando a menina de 6 anos pelas mãos. Parece-me que é inteligente e tem muito a dizer sobre o mundo, a economia e a sociologia.
Quando eu digo “parece” é porque, apesar de ele falar sem parar, eu não consegui prestar atenção a uma só palavra do que ele dizia. Meu pensamento e, principalmente meus olhos, só focavam num único lugar: o cabelo.
Eu sei que as mulheres, de uma maneira geral, genérica e equivocada, são consideradas fúteis. Principalmente as que prestam mais atenção ao cabelo do que na conversa. Em minha defesa explico que esse cabelo era diferente. Tinha uma ponta estranha que parecia não pertencer ao resto e uma parte mais grisalha que outra.
Talvez seja o corte, imaginei. Não, não. Já sei, ele pinta o cabelo. Mas se ele pinta, por que só pinta uma parte?
O dia foi passando entre chops, conversa, petiscos e piscina enquanto meu cérebro, provavelmente sequelado pelo excesso de sol, não conseguia juntar as peças daquele quebra-cabeças capilar. Quando, eureca, a luz do entendimento cabelístico (palavra evidentemente inventada) caiu sobre mim junto com o pôr do sol: é peruca!
Peruca. Quer dizer, não era bem uma peruca, era uma peça. A diferença é que a peça é só na parte superior da cabeça, ou da careca, mais exatamente. Não consegui imaginar nenhuma razão para um cidadão tão jovem, não tinha nem 40 anos, usar uma peruca no Recife em 2013.


Avôs usam peruca, apresentadores de televisão com mais de 70 anos usam peruca, chefes da máfia usam peruca, mas um advogado pernambucano num domingo de sol não deveria ser obrigado, pela pressão social que burramente enaltece a beleza física no lugar dos atributos intelectuais, a usar uma peruca.
Passei o resto do domingo tentando avisar a Rodrigo, razão do meu afeto, minha descoberta. Inútil, homens definitivamente não prestam atenção a cabelos. Quando finalmente chegamos em casa e eu perguntei “ por que será que Valério usa peruca?”, ele quase morreu do coração.
- Peruca?
- Sim, Rodrigo, ele usa peruca.
Rodrigo ligou para Chico, que perguntou a Guga, que conversou com Marcão, que soube por Bianca que Valério usa peruca e a culpa é da esposa. Segundo apuração dos fatos, a esposa de Valério disse: ou a careca ou eu!
Valério escolheu a esposa e comprou a peruca. Ou melhor, a peça.
Moral da história – já não se fazem mais esposas como antigamente!

Téta Barbosa é jornalista, publicitária, mora no Recife e vive antenada com tudo o que se passa ali e fora dali. Escreve aqui sempre às segundas-feiras sobre modismos, modernidades e curiosidades. Ela também tem um blog - Batida Salve Todos

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