quinta-feira, 11 de setembro de 2014

POEMA DA NOITE Horizonte de eventos, por Sérgio Cohn


saudade pertence ao
antigo léxico
Jorge Mautner
era um ser sem saudade
o que significa o máximo exílio,
desterro.
não tinha saudade porque vivia
num mundo de instantâneos
simulacros.
a presença constante
de tudo que desejasse.
saudade, já em si,
é um simulacro
ao avesso.
ausência preenchendo espaço.
saudade é quando a coisa
pertence ao espaço
e não ao tempo do encontro.
quando permanece mesmo partida.
não sei se era um ser feliz.
não tinha noção de morte,
a nostalgia de um tempo que não vivemos.
era um ser sem questões.
o fato é que foi se tornando pedra,
uma imensa rocha cravada à beira do mar.
o rosto voltado para cima
eternamente
se deliciando com a mutação das nuvens.
Passeio
Esta é uma cidade
inabitada
em suas ruas, pela
madrugada,
todo passeio é possível:
saltar parque lage adentro
ou caminhar
à sombra
dos próprios pensamentos
no muro lá fora
um mendigo rabiscou
mandalas:
é possível encontrar
as mesmas em quase
toda cidade
construindo uma geografia
outra, íntima
uma aventura talvez
para o olhar
assim também
seu corpo para
mim:
o que se abre,
o que se reflete,
em sorriso
nenhum crime, nenhum castigo

Sérgio Cohn (São Paulo, 16 de abril de 1974) - Além de poeta é editor da Azougue Editorial. Publicou: Lábio dos Afogados (São Paulo: Nankin Editorial, 1999); Horizonte de Eventos (Rio de Janeiro, Azougue Editorial, 2002); O Sonhador Insone (Rio de Janeiro, Azougue Editorial, 2006). Como editor, organizou livros de Celso Luiz Paulini, Jorge Mautner, Vinicius de Moraes, entre outros. Além de ter realizado livros como 'Nuvem Cigana - Poesia e Delírio no Rio na Década de 1970' e Poesia.Br - Poesia Brasileira das Origens ao Século XXI.

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