sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Ladrões e Ladrões, por Mara Bergamaschi


O número de presos no Brasil chegou em 2012 a 515 mil, um recorde histórico, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgado esta semana.
Além de evidenciar a contínua escalada da violência e o colapso da Justiça no país, o Anuário mostra, no capítulo sobre a população carcerária, os tipos de delitos que levaram ao encarceramento e o perfil de seus autores. Ou pelo menos quais crimes e criminosos o sistema conseguiu autuar e punir.
Vejamos, então: no ano passado, foram contabilizados 267 mil crimes contra o patrimônio. Simplesmente a metade das ocorrências é roubo e furto. Em segundo lugar, estão os crimes contra a pessoa, que somaram 64 mil ou 12%. Em seguida, os que atentam contra os costumes e a paz pública (bando ou quadrilha).
E quem ficou na lanterninha? Os crimes contra a administração pública, com quase invisíveis 0,3%. Apenas 1.479 casos de peculato, concussão e corrupção passiva constam das planilhas do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça. Com esse desempenho deveríamos estar próximos à Dinamarca no ranking dos países menos corruptos do mundo.


O registro do Depen para este tipo de crime nos Estados é irrisório, não passando de poucas dezenas. Em Sergipe, por exemplo, foi traço. Em Roraima, apenas um. No Rio de Janeiro, Piauí, Rio Grande do Norte, Tocantins e Mato Grosso do Sul foram três. No Distrito Federal, Amapá e Amazonas, seis. A exceção foi o Ceará, com 813, e São Paulo com 164.
A discrepância entre esses números e os propinodutos que se exibem todos os dias, desde sempre, no noticiário é, na realidade, a medida da impunidade que ainda beneficia os chamados crimes do colarinho branco. Como se vê, persiste a divisão entre ladrões comuns, que lotam as prisões, e os especiais, que estão bem longe delas.
Mas quem são os presos? Segundo o Anuário de Segurança Pública de 2013, 94% deles são homens e 74% têm entre 18 e 34 anos. Quase a metade deles cumpre pena de quatro a oito anos de prisão e 23% de oito a 15 anos.
O documento identifica uma “opção pela política de encarceramento” e afirma que o número de prisões nas regiões Norte e Centro-Oeste elevou-se acima da média, talvez em decorrência do combate às drogas.
Revela ainda que as cadeias, onde se disseminam doenças, ilegalidades e se organizam as violentas facções criminosas, estão lotadas não só de condenados (61%), mas também de presos provisórios (38%). E no período de apenas um ano, entre 2011 e 2012, o déficit de vagas no sistema prisional cresceu assustadores 20% - de 175 mil para 211 mil.

Mara Bergamaschi é jornalista e escritora. Foi repórter de política do Estadão e da Folha em Brasília. Hoje trabalha no Rio, onde publicou pela 7Letras “Acabamento” (contos,2009) e “O Primeiro Dia da Segunda Morte” (romance,2012). É co-autora de “Brasília aos 50 anos, que cidade é essa?” (ensaios,Tema Editorial,2010)

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