sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Em seu primeiro discurso como presidente, Renan frauda a história ao exaltar Sarney



O senador Renan Calheiros (PMDB-AL), novo presidente do Senado, prometeu que a Casa será autônoma na relação com o Executivo — a autonomia do peemedebismo tem a moralidade um taxímetro. Disse ainda que vai criar uma comissão da transparência, ou qualquer coisa desse gênero.
No discurso de posse, dirigiu um agradecimento especial a José Sarney 9PMDB-MA), o presidente que sai:
“ Foi ele (Sarney) que nos conduziu da escuridão da ditadura para a liberdade democrática”.
Uau!
Renan entende de história o que entende de ética. Vejam que coisa! Sarney, o homem que presidia o PDS, que comandou o partido na derrota da emenda das diretas; que assinou um artigo na Folha de S. Paulo, então, defendendo entusiasticamente o direito que sua legenda teria conquistado nas urnas de eleger o presidente no Colégio Eleitoral, este homem se tornou, na versão de Renan, o Diógenes do regime democrático, a iluminar a escuridão com a sua lamparina perscrutadora!
Ora, vá plantar batatas, senador Renan Calheiros!
Na Presidência da República, relevo, Sarney não foi especialmente intolerante. Aliás, sua atuação como senador, tudo considerado, foi mais deletéria do que como chefe do Executivo. Mas daí a ter sido aquele que nos conduziu à democracia…
Estou entre aqueles, e já escrevi a respeito, que reconhecem a importância que teve a formação, então, da Frente Liberal — os dissidentes do PDS que se juntaram a Tancredo Neves —, depois “Partido da Frente Liberal” (PFL), na transição democrática. O PFL viria a ser fundamental, mais tarde, também para a transição do Brasil do estatismo xucro para o do estatismo semi-xucro. Reconhecer o papel objetivo que partidos e personalidades tiveram na história, premidos, muitas vezes, por circunstâncias que não escolheram, não deve se confundir com mistificação.
Sarney foi, quando muito, passageiro de um comboio. E só assumiu o papel de protagonista num determinado período porque beneficiado pelo acidental. Foi um caso típico, para assombrar a teoria, de Fortuna descasada da virtù.
Os que nos conduziram à democracia foram aqueles que, pacientemente, construíram e alimentaram a resistência pacífica à ditadura. Sarney foi usuário do regime ditatorial e, porque é Sarney e soube trair os seus na hora certa, acabou como um dos principais beneficiários da democratização.
Por Reinaldo Azevedo

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